quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O Motorista Gregório

Geraldo Borges


Eu não estou nem um pingo arrependido de ter matado aquele sujeito. Veja o que ele fez. Era motorista de um padre, não sei se isto teve alguma coisa a ver com o seu futuro, depois de morto. Tudo começou em uma cidade do interior. O motorista ia passando correndo em frente da minha casa. Dirigia um carro velho sem freios. De repente meu filho sai desembestado de dentro de casa, atravessa a rua. Coisa de menino. O certo é que a gente tem de tomar cuidado. Foi uma coisa que ninguém esperava, principalmente no interior.

Aí aconteceu o desastre.. O motorista tentou desviar a direção. Já estava em cima da criança. O menino foi atropelado. Ficou correndo risco de vida. Eu fiquei com uma raiva danada do motorista. Teria que correr depressa para a capital em busca de socorro. Vocês nem imaginam a angústia apertando o meu peito. A criança gemendo olhando para mim com os olhos de cachorro ferido.

E certo que cometi arbitrariedades. Estava cego de raiva. Mas nem por isso estou arrependido. Disse para mim mesmo que se meu filho escapasse, se Deus fizesse um milagre, melhor para o motorista, se meu filho morresse Gregório não escaparia. Eu sabia que o desgraçado também estava sofrendo. Mas pai é pai e filho é filho.

A viagem por mais rápida que fosse parecia muito demorada. A viatura sacudia muito na estrada esburacada e machucava ainda mais o corpo franzino da criança, debilitado pelo acidente. A esperança parece que ia se acabando. Meu filho chegou sem vida na cidade. Meu rosto nublou-se de tristeza que vinha de dentro do meu coração.

O carro ficou estacionado na beira do rio Poty. Atravessamos em uma canoa conduzida por um barqueiro para o lado de Teresina. Do lado de cá amarrei o Gregório no tronco de uma gameleira Eu era a lei, tenente delegado. O povinho descalço, esfarrapado, viu tudo, de boca aberta e queixo caído. Só Deus sabe o terror pelo qual eles também passaram. Não moveram uma palha. Gregório, quase um menino. Não tinha mais futuro na vida.

E como eu disse no começo. Não me arrependi de ter dado cabo de sua vida. Primeiro deixei que ele sofresse bastante. Passasse fome, ardesse a garganta de sede, vendo as águas do rio rolar em sua frente, Disparei um tiro em sua cabeça a queima roupa. O disparo assustou um gavião que estava por perto, no galho de uma árvore. A ave deu um grito que chegou a me impressionar. Só isso. Mas foi rápido. Passou logo. Eu tinha tomado uma decisão e estava comprida. Aí meu peito se abriu e fiquei aliviado.

Daí por diante ele passou a ser um mártir, e virou santo.

Os jornais, principalmente os da oposição anunciaram que eu tinha cometido um crime monstruoso. Fui preso. Mas por pouco tempo. Não demorou muito cruzei os portões do presídio montado num jegue. Todo mundo viu. Ninguém disse nada. Meu processo foi esquecido.



Quanto ao meu filho ninguém sabe sequer o nome dele. O meu, poucas pessoas se lembram, a não ser alguns pesquisadores que se preocupam em estudar os fenômenos religiosos no seio do povo. Este sim o finado Gregório é quem está vivo, bem vivo. Acabei prestando um serviço à comunidade. E além do mais o santo motorista já fez milagres até para pessoas da minha família. Queira a Deus que ele me favoreça com mais alguns anos de vida. Acho até mesmo que no que depender dele eu estou completamente perdoado.

4 comentários:

Netto de Deus disse...

A EXECUÇÃO DO JOVEM PARAIBANO GREGÓRIO PEREIRA DOS SANTOS
• A criança se jogou na frente do semi-novo, "Ford de bigode";
• Os freios demoraram a atender;
• O Juiz e várias pessoas de Barras presenciaram o acidente;
O Tenente e delegado Florentino Cardos, pai da crianaça, não procurou ajuda médica em Teresina porque o filho Manoel Cardoso de Vasconcelos já estava morto;
• Houve uma fuga, antecedida de sequestro, em desobediência à ordem de soltura feita pelo Juiz José de Arimathéa Tito;
• O fato mais intrigante nessa história está também revelado no livro PARABÉLUM do economista, jornalista e escritor, Eneas Barros. Claro que não revelarei.
Quanto aos milagres, onde houver uma tragédia ou a presença cruel da tirania, sempre haverá uma "fábrica de santos", assim diz meu pai, contrapondo a "fé" da minha carismática e "mariólatra", mãe.
João de Deus Netto

Nettocampomaior disse...

A POLÍTICA NA VIDA DO "MILAGREIRO" GREGÓRIO

"O prefeito Manin Rego vai levar de Teresina os restos mortais do motorista Gregório para Barras, terra natal do motorista que foi torturado à beira do rio Poti na década de 20 e onde hoje é venerado.
Em Barras há parentes vivos, do motorista Gregório".

Portal AZ - 03/05/2006

O jovem Gregório Pereira dos Santos nasceu e viveu em Campina Grande (PB)até os 19 ou 20 anos, e foi pra Teresina/Barras como acessório (motorista) do carro Ford-T, ano 1929 comprado naquela cidade pelo mesmo comerciante de cortes de costuras (Jaime) que levou também um pistoleiro (Severão) capanga do que viria a ser o seu algoz(Florentino), para se esconder nos matagais próximo das Barras, terra, aí sim, do Sr. Manin Rego, que não tinha nem projeto de vir ao mundo.
Leiam o livro Parabélum, tem dezenas de revelações que na direção do diretor Lima Barreto teria se transformado no filme brasileiro mais premiado daqueles vizinhos anos. Nada contra o excelente "O Cangaçeiro", do injustiçado e esquecido cineasta paulista.

Nettocampomaior disse...

Esse A POLÍTICA NA VIDA DO MILAGREIRO é de autoria do João de Deus Netto. No momento de escolher uma identidade no Blogger, caiu no "joão", o blogueiro do[PICINEZ], o mesmo do primeiro comentário.

Anônimo disse...

DEVERIAM TER DADO OUTRO FIM A ESTA HISTORIA, MASSACRADO ESSE DICÍPULO DO MAL Tenente e delegado Florentino, ESQUARTEJADO EM PRACA PULBLICA PRA ELE SENTIR O DRAMA, JUNTAMENTE COM TODOS OS ENVOLVIDOS. CAMBADA DE GENTE DIABÓLICA E COVARDE, E O MAIS FODA DE TUDO É O QUANTO NÓS CIDADÃO QUE NOS JULGAMOS DE BEM, NOS ACORVARDAMOS PERANTE COISAS ASSIM.