domingo, 31 de julho de 2011

Tempo de Prorrogação


Edmar Oliveira
.
Chega um tempo, na vida dos humanos que tiveram sorte de envelhecer, em que temos de gastar um bom tempo com atividades destinadas a prorrogar nossa vidas. Quer dizer, temos que perder tempo com visitas médicas e, principalmente, sermos submetidos a procedimentos diagnósticos inventados na modernidade. Já não são somente os exames de sangue em jejum, os antigos exames de fezes e urina, e nem existem mais aqueles aparelhos de raios-X simples. Os velhos ficam familiarizados, logo, logo, com as máquinas modernas de tomografia, densiometria óssea, ultra-sonográfos, endoscopias e colonoscopias, que nos viram ao avesso. Aquele velho exame corporal do médico clínico perdeu o sentido para as modernas máquinas de exames.

            Os que se aposentam, para terem uma vida dedicada ao ócio sagrado, passam a gastar o seu tempo em exposição às essas geringonças e, se não tomar cuidado, encontram nessa atividade um assunto inconveniente para as salas de espera dos consultórios e dos procedimentos diagnósticos: assustar os marinheiros de primeira viagem. “O tomógrafo é uma nave espacial que causa claustrofobia”. “O preparo para uma colonoscopia é que é terrível, você já fez?”

            Os que envelhecem sem poderem aposentar levam esses assuntos aos colegas de trabalho, no happy hour, com o mesmo entusiasmo de quando falava de mulheres e futebol.

            Mas o certo é que, cedo ou tarde, temos que gastar um tempo com o tempo de prorrogação da vida. E como é um assunto de velhos, uma doença puxa outra para emendar as expectativas de vida. O velho saudável toma remédios para pressão, diabetes, colesterol, triglicérides, osteoporose, gastrite, úlcera, varizes, constipação, insônia, esquecimento, tireóide, próstata, bronquite, artrite, e algumas doencinhas mais, coisas comuns da idade. Sorte de quem é um velho saudável. Os que têm apenas essas doenças comuns da idade e que têm nas drogas modernas a chave para morrer com saúde. Essas pequenas enfermidades são as de morrer saudável. As graves, não se pode falar sem bater na madeira, são as que tiram os velhos das ruas. E tem também a doença do Alemão que pode nos deixar no mundo da lua. Eu já me esqueci até do que estava falando... 
____________________________
desenho do Gervásio Castro

embuste



Graça Vilhena

sei dos espelhos gastos em sombras tristes
por isso não me engana este sorriso
puro decalque no teu céu sombrio


mas é preciso que acreditem
que a distância e o tempo
rasparam das pedras tua dor
e não suspeitem jamais
de que apenas resistes
sonhando cactos impossíveis
que crescem nos telhados


______________________
foto de Pedro Gaspar para Cidadeverde.com: telhado de São Raimundo Nonato.

a enchente e o rio


Geraldo Borges           

            O rio pleno parou para dormir
            Naqueles dias de trovão de tempestade
            E suas águas continuaram a subir
            Mas não eram suas águas de verdade. 
.
            Eram as águas do céu do vilarejo
            Que estavam insones caindo atormentadas
            Cheio de afogados e bichos apodrecidos 
.
            Quando as águas do rio e dos temporais
            Desceram das pontes e dos telhados
            E embarcaram  em navios de nuvens
            O rio tratou de esfregar os olhos e se acordar. 
.
            Se espreguiçando  nas curvas e reinaugurando
            A cidade aluvião com um fluvial bocejo
            No meio da paisagem atropelada de destroços.
           

Levaram, outra vez

Edmar Oliveira

A Coca-Cola anuncia um novo refrigerante endereçado ao sertão do Cariri cearense: Crush, sabor Cajuína. Do Crush, velho refrigerante que a Coca-Cola incorporou ao seu capital borbulhante, como tanto outros, tínhamos sua lembrança numa obra de arte de Guto Lacaz de 1978. O artista plástico ganhou o primeiro prêmio da Primeira Mostra do Móvel e do Objeto Inusitado, em São Paulo. A obra era apenas uma garrafa do, na época, popular Crush fixo numa moldura de gesso. Certamente o nome da obra lhe valeu o prêmio e foi a grande sacada do artista: Crushfixo! Reproduzimos abaixo:



Outra sacada artística com o velho refrigerante opera a multinacional Coca-Cola: Crush, sabor cajuína. E na propaganda de lançamento cajus e figuras nordestinas de pura xilogravura conhecida (foram pagos os direitos autorais?)



Joca Oeiras puxa um coro de reclamantes piauienses protestando contra a surrupiação da nossa Cajuína pelos cearenses (agora tendo a poderosa Coca-Cola na guerra), justamente os vizinhos que primeiro engarrafaram a Cajuína, legítima bebida piauiense.



De muito tempo a cajuína encontrada na feira de São Cristóvão é cearense. Só recentemente uma Lili apareceu por aqui e bem mais cara. Nossa indústria nascente peca na concorrência. E não é só na cajuína. Quando os goianos começaram a fazer compotas de pequi levei uma ao Piauí para que se pudesse conservar o nosso pequi para a venda. Divulguei aos conhecidos, dizendo que, já, já, teríamos fábricas de pequi em conserva. Naquela época, eu, fanático por pequi, tirava a polpa e congelava. Quando minha mãe era viva fazia isso por mim e eu tinha pequi congelado por um ano no Rio. Nem precisava mais. Na Feira de São Cristóvão tem várias marcas de compotas do cerrado goiano. É como no futebol. Quem não faz, leva!  

cajuina

PATRIMÔNIO CULTURAL

Cajuína cristalina do cariri?
A cajuína cristalina é de Teresina, Piauí
Tem coisa que não rima
Tem coisa que não rola
 A cajuína da coca não cola.

(Climério Ferreira)

O Gato e o Farol


Luis Horácio

O farol. A razão, o sentido, a utilidade da solidão.Meu avô me deu isso. Nunca esqueci. Hoje, finalmente, me trouxeram ao farol. Insisto desde meu aniversário de oito anos, um ano implorando. Sei que dentro do farol vive um homem.Um homem triste, ele me chama.A tristeza não suporta a solidão. A solidão faz com que ele tenha um gato.Um gato como companhia. Ele fala com o gato? Sei que os gatos costumam conversar com o vento, não gosto de gato. Será que ele consegue ser  feliz? Não, não me interessa a felicidade. E se for feliz, o que importa? Feliz e  solitário. O que é um feliz solitário? Sou criança e criança não deve se preocupar com felicidade. Meu avô também me deu isso.

-Você.

Um grito vindo das minhas costas, um grito com vento.

-Você mesmo, garoto. O que você está fazendo aqui?

-Vim com minha mãe e o meu avô.

-Fazer o quê, o quê…o quê neste fim de mundo?

-Seu gato está comendo um bicho, acho que é um passarinho.

-Não se meta.Onde está sua mãe?

-Lá embaixo, com meu avô.

-Por que vieram?

-Eu pedi.

-Pra quê?

-Seu gato está comendo outro bicho, você não dá comida a ele?

-O gato não é meu. Daqui a pouco vai escurecer.

-Quero ver, de noite o farol vira farol de verdade.

-Vem cá. Senta. Vou contar uma história que se deu comigo. Eu tinha sua idade, uns dez anos mais ou menos, acertei? pois é. Naquele dia eu estava brincando com um carrinho quando a ambulância veio e levou meu pai.Pra nunca mais, não quis olhar quando o arrastavam e ele gritava.Não olhei, mas os gritos traziam as imagens. Ele tinha uma doença, não reconhecia ninguém, só chorava, chorava e gritava alto, muito alto. A doença, garoto, como é seu nome?, ah Luíz, pois a doença Luíz é pior, muito pior que a morte. Pior que não ter pai é ter um pai que não está vivo tampouco está morto. Eu tinha a sua idade. Às vezes acho que ainda tenho aquela idade, a idade de quanto fiquei sem pai. Seu pai, por que não veio?

-Não tenho pai.

-Morreu?

-Não, foi embora.

-Sente saudade?

-Curiosidade. É a mesma coisa?

-Pode ser.

-Ele foi embora antes de eu nascer.

-Você sabe por quê?

-Tinha modo que eu nascesse aleijado.

-Por que não esperou?

-Não me pergunte.

-Vamos procurá-lo?

-Como?

-Com o farol.

-Não, não quero. Ele sabe onde eu vivo e nunca me procurou.Ele não quer ser pai. Você vive sozinho aqui,não casou?

-Sou velho, velho tem que viver só.

-Mas antes você era novo.

-Você se engana, garoto, sempre fui velho. Você, você nunca envelhecerá. Como é o nome de seu pai? Talvez eu conheça. Mas como sua mãe botou em você o nome do cara que não quis ver o filho? Vamos trocar seu nome. De agora em diante vou chamá-lo de Gabriel.

-Não, isso é nome de anjo e anjo não serve pra nada. Anjo é só decoração. Também foi presente de meu avô.

-Vamos ver…vamos ver…. Wagner, você gosta de música? Sua mãe é pianista, veja só.Está escurecendo.

-Você não respondeu minha pergunta. Nunca casou.

-Casei, não deu certo. Vamos mudar de assunto? O que você mais quer, o que o faria feliz nesse momento, aqui, agora?

-Aqui, agora? eu queria chorar.

-Por que não chora?

-Como é seu nome?

-Luíz, se escreve que nem o seu. Sua mãe seu avô estão vindo. Tenho que entrar. Você voltará?

-Me convida, eu volto. Posso levar o gato?

-Não é meu.

-Antes de eu ir, diga  o que você mais quer, o que o faria feliz nesse momento, aqui, agora?

-O que mais quero...o que mais quero...tempo!

            Regressamos, apenas meu avô falava durante o trajeto. O gato continuava comendo um bicho, um passarinho. De onde ele tira tanto passarinho?




convite

Os piauiseiros do Distrito Federal estão obrigados a participar deste evento

haikai da solitude


No céu, uma lua cheia
exibe-se sem cobrar nada,
e a plateia, alheia,alheia...

(Cineas Santos)

Procissão de Sanfonas

meu amigo Sergival mandou e eu divulgo. Parece que o cabra sergibano acompanha as boas coisas do Piauí...

Manel Bandeira e Tom Jobim

domingo, 17 de julho de 2011

Meia Noite em Paris

Edmar Oliveira

O Xexéo e uma amiga de Caetano disseram que “Meia Noite em Paris” é uma refilmagem da idéia de “A Rosa Púrpura do Cairo”. E Caetano, discordando dos dois, fez comentários elogiosos a esse Woody Allen em cartaz. E eu, respeitando os três, mesmo não sabendo quem é a amiga do Caetano, só meto minha colher aqui porque já tinha decidido não ver mais Allen ou Almodóvar, não pela repetição, mas por enjôo mesmo. O Woody Allen pela verborragia de um deslumbrado analisando que faz da psicanálise a explicação das banalidades ou das leis que movem o universo. O Almodóvar pelo cansaço de mostrar tipos esquisitos como o significado dessa palavra em espanhol. Mas é só uma mania de velho que se cansa das repetições que fazem a vida ensimesmar. Nada contra o entusiasmo de quem chegou mais tarde no planeta. E os dois são competentes diretores de cinema, dos melhores em produção atual.

Como falaram tanto da Paris de meia noite, deixei a má vontade em casa e fui ao cinema. Esperando até que a velhice de Woody Allen melhorasse o conteúdo do seu cinema e novamente viesse a me animar, como no início de sua carreira. O filme é excepcionalmente bom. O velho diretor aprimorou a câmera e a direção dos atores é fenomenal. A Paris dos anos vinte está saudosista, como imaginamos, e Hemingway convence tanto que parece pedir um filme só para ele. Dali e Buñuel produzem momentos de fina ironia e hilaridade com o que produziriam no futuro. Mas, de fato, o filme seria melhor se ele não tivesse feito “A Rosa Púrpura”. O conteúdo dos dois celulóides parece se entrelaçar quando mostram a mensagem de que nunca estamos conformados com a realidade, e a ficção ou o passado podem ser um refúgio alentador.

Mas, espere aí: se a crítica é esta porque o Woody Allen vai transformar o Owen Wilson nele mesmo no passado? As calças frouxas, as camisas folgadas, o modo de andar, a verborragia do Woody na tela não é uma tentativa de filmar a si no passado? Não é como se o Woody Allen entrasse na tela, como a Mia Farrow de “Rosa Púrpura”, para viver a sua ficção, numa tentativa “narcísica” de ser eternizado pela celulóide no passado?

Sei que haverá críticos que achem em bricolagem genial. Como não sou crítico de cinema, acho apenas meio já visto, com o enjôo que tinha antes de entrar no cinema. Mas posso tomar um “engov” para ver o próximo filme genial do Almodóvar.            

Amparo



Teresina
num fim de tarde
as luzes da cidade
e as torres do amparo
(edmar)


BRIC. Países Emergentes


Geraldo Borges


         Brasil, Índia, Rússia e China. Bric. Algum economista novidadeiro inventou essa sigla para rotular esses países como emergentes.

Antigamente o Brasil era um país simplesmente explorado, no tempo em que a bolsa família era o leite pau de índio doado pela aliança para o progresso, depois inventaram uma palavra nova para a sua situação econômica, país subdesenvolvido.  Mais tarde criou-se um novo eufemismo, um país em desenvolvimento. Hoje. É um país emergente, já foi subversivo. E estes tais de subversivo estão conduzindo o barco. Emergindo.

         E a Índia? A Índia é Milenar. Sempre viveu de suas virtudes budistas e de seus deuses coloridos, nos deu de herança o nome de nossos silvícolas. Convive com seus magos, faquires, encantadores de serpentes, vacas sagradas, carmas e reencarnações.

 Foi colônia britânica. E graças à luta persistente de Gandhi junto ao seu povo tornou-se independente do Império Britânico que soube muito bem tirar proveito das grandes navegações com seus piratas oficiosos. A índia sempre foi reconhecida no mundo pela sua cultura exuberante, seus mistérios, sua teosofia. Antes mesmo de o Brasil dizer viva Cabral, a Índia já estava comerciando com Portugal. Eles por lá não estão nem se importando se são emergentes ou penitentes, com tanto que o seu rio Ganges seja sagrado e eles possam sepultar suas santas cinzas no seu leito, e recitar seus mantras.

E a Rússia? Que já foi santa Rússia, com seus mujiques, almas mortas, popes, judeus, tão antiga quanto a Índia e mais asiática do que européia. O que é que ela era no século passado, no tempo da Guerra Fria e no jogo a bipolaridade entre União Soviética e EUA. Não era uma potencia? Foi quem primeiro mandou um astronauta para o espaço. Era o quê? Parece que era subversiva, pelo menos no conceito dos democratas.  Hoje é emergente, segundo o conceito dos economistas de plantão. A Rússia tem um legado literário de fazer inveja à Europa, figuras como Gogol, Tolstoi, Tchecov, Dostoiévski. Mais contemporaneamente Pasternak. Premio Nobel. E tem uma linha de trem só comparada a dos EUA e da China. Sem estradas de ferro país nenhum se moderniza. Aproveito para citar o poeta Ariano Suassuna que diz (...) e lembro-me do papel decisivo dos trens na formação dos dois maiores países modernos, os Estados Unidos e a Rússia. E eu pergunto onde estão as ferrovias brasileiras?

         Sim. A China. Que ficou por muito tempo agachada dentro de suas muralhas, até sair para ocupar um lugar decisivo na UNU, e fazer parte do clube atômico, e imprimir a famosa bandeira de que o imperialismo é um tigre de papel, hoje é temida pelo mundo inteiro, e já colocou a Europa no chinelo, desbancando a Alemanha que era  segunda economia do mundo. Por isso mesmo não entendo como é que a China é um país emergente. Na verdade a China é um planeta, está em outro plano de realidade e visão nas relações mundiais

Como é que a China pode ser emergente ao lado do Brasil se hoje é a segunda potencia econômica do planeta? Inventora da pólvora, do macarrão e dos dragões. Não entendo os critérios de avaliação dos economistas de plantão, estes magos dos números e dos gráficos baseados em estatísticas fantásticas.

Lembro-me que antigamente só se falava nos tigres asiáticos: Hong Kong, Coréia do Sul, Singapura, Taiwan. Sua economia foi “desenvolvida” através do modelo exportador, mercado interno fraco, mão de obra barata, governo forte, entrou em crise. Ninguém fala mais em tigres Asiáticos. Viraram tigres de papel mal desenhados pelo Imperialismo americano e japonês. Coisa do século passado. Talvez o Brasil seja uma onça pintada com porteiras na dentadura, e que pode até rosnar, mas não faz medo.

O Brasil não passa de um menino levado, Macunaíma, que ainda não sabe o que é serio. E de repente é colocado no meio de povos milenares, Dono de uma vasta cultura, muito além dos nossos mitos  e como premio de consolação ganha a primeira letra da sigla. Bric, quando na verdade devia ser a última. Crib. Detalhes. Os detalhes ajudam muitas vezes a confirmar hipóteses. Nelson Rodrigues disse que temos o complexo de vira lata. Será? Acho que não. Pois sempre queremos sentar nos primeiros lugares. Quer tenhamos mérito ou não.

tempo perdido


Graça Vilhena

o esquecimento se fez
ao lado dos navios
que encalharam um dia
e apodreceram os cascos
na paciência do mar.

nada mais resta
nem o pó das horas
da mentira nem a
necessidade do perdão
a vida agora ensina
um novo ritmo
na mobilidade dos dias

e se  de vez em quando
bate um arrependimento
não é por ter te amado
sem a febre do contágio
mais por ter perdido
tanto tempo
muito mais em ti
do que em mim.

TRAGÉDIA GREGA


A Grécia está passando por momentos dramáticos, os bancos e os grandes investidores estão querendo “o seu” de volta, com juros e correção monetária.
      A Itália, palco da civilização romana, vê seu império ruir, pedra sobre pedra. A César não sobrará nem aquele dólar furado (um dolaro bucato),  western spaghetti de Giorgio Ferrati.  
     Portugal vem junto e já preparam, ao invés de caldo verde, um caldeirão fervente de poção amarga a ser derramada goela adentro do povo português.
     Espanha está se borrando de medo, parece que deglutiu uma paella estragada, aguardando na fila até momento de subir ao cadafalso.
     Os irlandeses estão enchendo a cara de uísque e “pindurando” a conta. Quando chegar a quebradeira final, pelo menos resta o consolo de não  ter que pagar a dívida ao dono do bar...
      O Governo Papandreu, em que pese as grandes manifestações nas praças e nas ruas de Atenas, de revolta e indignação da população grega, aprovou todo um pacote de medidas, que vão infernizar a vida do seus conterrâneos.
     No Coliseu lotado, os magnatas apontam seus polegares para baixo. É chegada a hora do sacrifício.
     Sabem qual é a grande diferença do que agora está acontecendo com a Grécia e os 8 anos de governo FHC, cujos festejos de 80 anos estão sendo badalados pelos sabujos de plantão?
     Absolutamente nenhuma.
     Aquela herança maldita cruelmente se repete, sugando impiedosamente  o sangue da população revoltada e atônita. Sentados em volta da mesa, serão servidos, com fartura para todos, recessão e pobreza.
     E tome privatizações, e tome redução de salários, e tome redução drástica em gastos sociais, e tome falências, cortes nas aposentadorias, demissões em massa, aumento de impostos... e tome... e tome...
     O sociólogo de Higienópolis reelegeu-se, pegando uma bagatela, um emprestimozinho mixuruca de 40 bi de dólares só para botar as contas em dia, uma simples operação de fluxo de caixa, para acalmar os executivozinhos formados em Berkeley.  Seu maior triunfo foi quebrar o Brasil 3 vezes!...  
    A grande farsa do neoliberalismo, e encontram um eco poderosíssimo na imprensa marrom, é dizer que o Estado é sempre o culpado das desgraças econômicas do país.
     Ora, vão tomar no olho do furacão !!! Toda a especulação desenfreada promovida pelos donos do capital, e disso o mundo levou uma porrada violenta agorinha mesmo na crise de 2008, nunca, jamais em toda a história, foi controlada pelo Deus Mercado. E nem poderia, a especulação é a alma do negócio.
      Na auditagem da dívida externa ninguém quer mexer, são juros sobre juros comendo soltos, cadê os documentos, cadê as informações? Chegam mais empréstimos sobre empréstimos, para pagar a dívida anterior, e a anterior a essa dívida e aquela outra dívida mais antiga...
    As agências de classificação de riscos deitam e “rolam” (com trocadilho), empurrando os países europeus a pedirem uma “ajuda” ao FMI e à União Européia. As mesmas agência que avalizavam a robustez financeira do Lehman Brothers...
      Agora, quando explode a boca do balão, aí sim, precisam do Estado para “socorrer” o setor privado, incorporado na, que palavras bonitas,  “livre iniciativa” .  E aí meu camarada o tal déficit público e a dívida pública vão para o espaço mesmo...
      Os atores do período clássico usavam máscaras, denominadas personas para formar os personagens. De acordo com o papel a ser interpretado era escolhida uma persona.
     Em cima do palco os atores do grande capital usam máscaras, não para interpretar, mas para fingir,  para ludibriar, para extorquir os incautos.
      O grande público, assistindo a tudo passivamente na platéia, ainda não consegue enxergar a grande farsa que os levará para o inexorável abismo. Quando o mundo acordar aí será muito, mas muito tarde...
     E ainda tem gente que acha que não mais existe nem direita, nem esquerda, que o normal é sempre privatizar o lucro e “distribuir renda” para eles mesmos, os donos do capital e, lógico, socializando os prejuízos para a grande maioria:
     Aquele pessoal que dá um duro desgraçado, trabalhando para comer o seu angu e levar o leite das crianças para casa, tendo que matar um leão por dia na arena da vida.  
                                                                                                                            
                                                                                                             1000TON



Veredito

Ana Cecília Sales


Como posso não ouvir
Que não me amas...

O teu silêncio,
Grita comigo.

Nego Itamar em Documentário


Aderval Borges

A matéria abaixo mais reduz que reluz. Pelas declarações do diretor, o documentário deve ser tal qual. Entre os parceiros do compositor não cita Arnaldo Anthunes, Naná Vasconcellos (com quem fez disco), Tom Zé e Macalé (para quem produziu/dirigiu um disco gravado cá em Sampa). Nos últimos anos, Macau foi muito próximo de Itamar e inclusive ensaiava no estúdio doméstico deste. Itamar tá entre os cabras de alto repertório da MPB. Tinham um pé na tradição (vide a releitura de Ataulfo) e outro na vanguarda, qual Macalé (vide releituras de Morangueira, Lupicínio, Geraldo Pereira, Ismael e outros). Itamar não era só focado em música. Flanava, qual nosotros, por artes plásticas, cinema e outros bichos. Fez músicas pra ballet e teatro - como Arrigo (que atualmente compõe mais pra dança). Sua formação se deu em Londrina (PR) - embora paulista de Tietê - onde estudou música em conservatório com os irmãos Barnabé (Arrigo e Paulinho), com os quais era mais afinado (Paulinho tocou bateria pra ele e pra Arrigo). Conceitualmente, sua música é muito parecida com a de Arrigo, baseada no modo de compor modal de Bártok. Seus arranjos têm leitura para cada instrumento, de modo que parecem competir uns com os outros - Arrigo tb faz isso. Outro aspecto em comum dos dois é o uso quase percussivo de todos os instrumentos - isso também vem de Bártok -, o que dá um caráter sincopado aos seus arranjos. Acho que Arrigo/Itamar é o que há de mais fino - no viés de alto repertório - da MPB pós bossa nova e tropicalismo. Mas o tropicalismo só manteve o alto repertório no início - quando Duprat tava no comando dos arranjos e quando Macalé/Lanny assumiram a batuta. Dos ex-tropicalistas o que mantém mais um pé na vanguarda é Tom Zé. Os demais debandaram pro coloquial após as gravações comandadas por Macalé/Lanny, se nivelando aos demais compositores da geração festivais.
  




Retrato à altura de Itamar
Estado de S.Paulo

O documentário Daquele Instante em Diante, que estreia hoje, tem o "caráter vulcânico" da personalidade do homenageado: Itamar Assumpção (1949-2003). Quem afirma é diretor Rogério Velloso, que teve acesso a tanto material com "grande apoio da família" (a viúva Elizena e as filhas Anelis e Serena), que daria para realizar mais do que um filme, mas uma série. "Foi uma oportunidade única para se fazer um trabalho à altura do cara", diz.
Velloso mergulhou fundo na obra e na vida pessoal do genial artista para mostrar os "vários Itamares": o compositor, o poeta, o performer, o amante das plantas (especialmente as orquídeas), o homem caseiro, o gênio incompreendido, o controlador irredutível de tudo o que envolvia sua criação, o parceiro de tantos outros talentosos contemporâneos, como Luiz Tatit, Alice Ruiz, Arrigo Barnabé, Suzana Salles, Paulo Lepetit, Alzira Espíndola, Tata Fernandes, Luiz Waack, Luiz Chagas, entre outros que dão sua visão do amigo. "Ele se mostrou de alguma forma nesses fragmentos", diz Velloso. "Você pode vê-lo no filme por um monte de prismas, porque cada um conheceu um Itamar diferente."
Isso tudo além do próprio Itamar, que aparece em número generoso de entrevistas, ensaios e shows - precioso material de arquivo, que revela ao público que não teve a oportunidade de conhecê-lo o quanto ele era maior no palco do que em gravações. "A ideia foi fazer um filme para quem não conhecia o Itamar pudesse ter acesso, então decifrar não só o jeito tão peculiar que ele desenvolvia a própria música, trabalhando com as linhas de baixo. Ao mesmo tempo em que o filme tem a linearidade, em que você vê a evolução da musicalidade e do pensamento, ele tem uma espiralidade também", diz Velloso.
Tatit observa como, apesar de quase sempre continuar relacionado ao Nego Dito/Beleléu, ao longo da carreira ele foi deixando o personagem em segundo plano e sofisticando sua música. Um dos pontos altos foi o trabalho voltado para a obra de Ataulfo Alves (1909-1969), em que expõe toda sua elegância negra, em comum com o homenageado.
O diretor evitou todos rótulos dos quais Itamar foi vítima - em nenhuma situação é usada pelos entrevistados a palavra "vanguarda", por exemplo. Como lembra Suzana, aquilo que marcou a música de São Paulo na década de 1980 "não foi um movimento, mas um momento". Sucesso Itamar fazia a seu modo, com shows lotados e longas temporadas em teatros de São Paulo.
O filme, que abre a Série Iconoclássicos, do Itaú Cultural, vai ficar um mês em cartaz em sessões com entrada franca nas salas do Unibanco Pompeia, Augusta e Frei Caneca, além de Curitiba, Fortaleza, Rio, Salvador, Santos e Porto Alegre, com sessões grátis em horário nobre.

verso lívido


QUEM É DE LÁ

Não tivesse eu nascido
Em Angical do Piauí
Eu nem teria existido
Eu não estaria aqui

É que nascer por ali
É aventura e viagem
Pois quem é do Piauí
Já faz parte da paisagem

(Climério Ferreira)

Céline: Viagem ao Fim da Noite

Luis Horácio
.
O ministro da Cultura, da França, atendeu o pedido da Associaçào de flilhos e filhas de judeus deportados e retirou o nome do escritor Louis-Ferdinand Céline das Celebrações nacionais 2011.A razão para tanto: anti-semitismo virulento. Não há como negar essa faceta de Céline, seus panfletos ignóbeis são indesculpáveis.

Por outro lado, Henri Godard,professor emérito da Sorbonne e um dos maiores especialistas da obra de Céline classificou a decisão do ministro Frédéric Mitterrand como uma forma de censura. Mais uma vez a polêmica embala um episódio celineano.

Louis-Ferdindand Céline, médico de formação apresenta em sua obra o homem próximo a uma besta sofredora. Em Viagem ao fim da noite, Ferndinand Bardamu, o narrador também médico; também padece da aflição do desejo. A guerra também tem suas variantes e uma delas é a guerra entre os corpos, os sadios e os doentes. Um romance dotado de uma organicidade fora do comum. Golpe de mestre/

Percebo, sei que contrariando a maioria dos teóricos e estudiosos do tema, em Viagem ao fim da noite, um exemplo de autoficção. Um gênero também controverso.Cabe a autoficção explicitar as relações, nem sempre puras, entre a arte e  a vida. A obra, a literária, como decorrência da vida do escritor. Segundo Thierry Laurent "a autoficção não seria nem uma narrativa compretida com o real tampouco exclusivamente romanesca mas  uma livre retranscrição de suas lembranças e experiências, um pouco a maneira celineana."

 A arte permitindo uma nova identidade. A arte, a memória, o tempo…a imaginação. Imaginar….imaginar…a capacidade de imaginar, de criar,  fazendo parte da  realidade. A arte, qualquer forma de arte, é o apogeu da imaginação, da criatividade; é estranheza pronta a subverter padrões. A arte não deve se submeter à regras.

Conforme Bardamu, o narrador de Viagem ao fim da noite:



                                                                                                                                                                                         Quando não se tem imaginação, morrer não é nada; quando se tem, morrer é demais. É essa minha opnião. Nunca eu compreendera tantas coisas ao mesmo tempo. Ele, o coronel, jamais teve imaginação. Toda a desgraça desse homem veio daí, sobretudo a nossa. Era eu portanto o único a ter  a imaginação da morte naquele regimento?  (CÉLINE,2009, p.26)



-Viagem ao fim da noite tem o mesmo peso de Ulisses, um trabalho magistral de linguagem. Um livro que denuncia os horrores da guerra, do colonialismo, do capitalismo, da pobreza, da fragilidade da condição humana.

Celine não era um crápula, longe disso. Também não se deve negar que foi um colaboracionista.Ao ler Viagem ao fim da noite, o leitor descobrirá Celine. Ele  classificava o Viagem ao fim da noite como o mais cruel de seus livros. Caso as razões para tanta crueldade não fiquem bem claras  passe  ao segundo romance, Morte a Crédito, que, como diz o autor, coloca os verdadeiros pingos nos is. Celine era médico, como Ferdinand Bardamu, o protagonista de Viagem ao fim da noite, dava consultas no subúrbio de Paris e não cobrava de seus pacientes.
E tem mais, em Viagem...ele combina a linguagem do povo com a norma culta, a serviço de uma literatura visceral,corrosiva, perigosíssima às condições da época.

-Viagem ao fim da noite tem o mesmo peso de Ulisses, um trabalho magistral de linguagem aliado a uma temática carnavalesca em seu imenso absurdo. O exemplo é o exercício de milicianos, falsos soldados treinando com fardas e armas imaginárias. O nonsense desmascarando nosso mundo absurdo.

Não sou defensor das barbaridades perpetradas por Céine, mas vale lembrar que ele nunca esteve só. Tem companheiros no cenário da literatura espalhados mundo afora.  A grande maioria condena  Céline, eu prefiro acusar  Borges. Além de tudo, sua obra é enigmática demais, a maioria que leu não entendeu nada, mas sai por aí cantando elogios. Ainda não entendi a ausência de estátua dele aqui em Porto Alegre, não entendi “tamanha falha.”

Você, atento e nada subserviente leitor , já deve ter reparado o quanto Borges amava essa América Latina que tanto o idolatrava e ainda o idolatra?  "Desprezo os escritores latino-americanos. Eles não existem. Não existe nada na América Latina. O continente inteiro é um romance mal escrito" . Não está convecido? Leia FARIA, Alvaro Alves de. Borges, o mesmo e o outro. São Paulo: Escrituras, 2001. Está em, tempo.

Viagem do fim da noite está entre os dez melhores livros já escritos.Obra prima. Traduzida inclusive em hebraico .

hai-kai


Cinéas Santos

Há beleza em toda parte:
basta olhar pra perceber
que a vida imita a arte...

ARRENTE FALA ASSIM


Gisleno Feitosa

Primeiro aviso ao Doutor
Que não sou um humorista.
Meio metido a escritor,
Sou um ginecologista.

O que eu quero é dizer
Deste modo singular
Pra você compreender
Nosso jeito de falar.

Forte, é o cabra da peste
Que come pirão-de-parida.
Que nasce aqui no Nordeste
E não reclama da vida!

Ser macho que só preá
Ou que tenha o cunhão roxo,
É o nome que se dá
Àquele que não é frouxo.

O que não usa a rola,
Tem brinquinho e “ôi de briba”
É qualira ou baitola
Ou comedor de mirindiba.

“Home” que mexe as cadeiras
Rebolando sem parar,
Pode ser só brincadeira,
Mas se não deu, “inda” dá.

Banco Central, não é BC?
Aqui, é Bete Cuscuz;
Casa que deixa você
Sem o que a outra produz ($).

Pernilongo é muriçoca.
Chicote se chama açoite.
Farofa aqui é paçoca.
Tardinha é boca da noite.

Cheiro ruim é catinga.
Carta coringa é melé.
“Mangueira” é nome de pinga
E comprimido é caché.

AVC é congestão.
Desistir é defecar.
O impotente é capão.
Dar à luz é descansar.

Tem bolo doce e salgado.
Tem tapioca e pudim.
Maria Izabel e assado.
Tem matrinxã e surubim.

Cambica de buriti,
Mão-de-vaca e panelada,
Tem doce de bacuri
Peta, chouriço e cocada.

Baião de dois, já provou?
Nossos capote e lingüiça?
Bolo frito e corredor,
Faz padre perder a missa.

Terminando, a saideira,
Eu te confesso, Parente:
Esta trova é brincadeira
Com quem faz pouco “darrente”!

______________________________

Só explicando: mirindiba é um arbusto do cerrado que dá uma fruta apreciada pelo comedor da foto acima. Bete Cuscus, quem é do piauí sabe onde e o que é. Vou explicar mais não!