domingo, 26 de setembro de 2010

Domingo que vem é dia de meter o dedo na urna




Edmar Oliveira


Não queria falar desse assunto. Mas estamos na semana da eleição. E o 1000TON tem provocado aqui com a sua coluna política de quase sempre. Pois então me aguentem.


Confesso não estar entusiasmado muito com essas eleições. Eu, que como muito de nós esperamos ansiosamente pela democracia quando éramos oprimidos pela ditadura. Edgar Alan Poe afirma que “É uma forma de felicidade, o imaginar; uma forma de felicidade, o sonho”. A realidade, às vezes, esmaece essa felicidade sonhada.


E na política, quando estamos participando e vivendo o momento, a paixão dificulta o entendimento. Quando entendemos, o momento já passou e não podemos interferir. Portanto, aproveitando que não estou apaixonado nem participando, me afasto um pouco para tentar entender e dividir com vocês.


O nosso presidente parece ter se transfigurado no pai dos pobres que foi Getúlio, assim como num conto do Poe. E repetiu o gesto de unir o PTB, braço da esquerda trabalhista, com o PSD, para que as oligarquias permitissem o avanço das conquistas reais para a população excluída. No momento tiramos o B do PTB e colocamos o PMDB no lugar do PSD para entendermos a real revolução na melhoria das condições de vida dos excluídos e da inclusão de um número significativo da classe E na classe média D. Este fato, e a expectativa de maior inclusão, explica a popularidade do Lula e do acontecimento inédito na história: um governante transferir mais votos para o seu sucessor do que o número de votos que ele mesmo teve. Entretanto o custo foi deixar o Sarney, o Collor, o Barbalho, o Renan e tantos outros crápulas com seus poderes de elite e nos deixando com nó nas tripas. Portanto, o Cara repetiu Getúlio com mais competência, sem precisar dar um tiro no peito pra entrar na história. Bastou carregar um isopor de cerveja na cabeça, como um legítimo farofeiro, para se identificar com o povo.


Na oposição temos a UDN golpista, que tanto aporrinhou Getúlio, agora em desespero. E o Corvo de hoje não tem um milímetro do talento do Lacerda e faz o triste papel do coveiro dos golpistas do DEMônio, ex-PFL, ex-PSD ex-ARENA, esteio da ditadura do passado. O problema aqui é que o Getúlio melhorou e o Lacerda tucano caga mais do que esguicha. A oposição competente é a grande imprensa, do Rio e São Paulo, que assiste os interesses dos poderosos fabricar um fraco candidato de oposição que não consegue lugar para colocar os antigos donos do poder de volta. A elite paulista está ensandecida e até com inveja dos corruptos que se aliaram ao Lula e antes eram seus aliados.


A Marina com sua religiosidade exuberante é contra o aborto, pesquisa de células troncos e muitos dos avanços de hoje. Além de, na sua raiva, preferir ao Serra. Modernizou o discurso de esquerda, como fez o Lula, mas é uma ecocapitalista na definição do Plínio (se ela morrer seríamos governado pela Natura!). E o Plínio tem a vantagem de ser muito bem humorado, mas é um candidato de ontem com ideias de antes de ontem, como já foi dito.


Mesmo sem vontade e saudosista da felicidade do sonho do passado, vou às urnas enfiar o dedo na mãe do PAC, apesar de detestar esse maternalismo da “mulher do Lula” (e torcendo para o seu câncer ter estancado, senão terei votado no Michel Temer, meu Deus do céu!). Tem outro jeito? Afinal é um reconhecimento de que Lula melhorou muito o país, mesmo escrevendo por linhas tortas. Não por ser Deus, mas por dificuldade de escrever. E uma facilidade enorme de dizer o que se quer ouvir...


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O diabo é que essas linhas tortas sangram os cofres do país e não me deixam votar no Rio de Janeiro. E a distorção de um pensamento político faz alguns esquerdistas votarem no Crivella, por recomendação do Lula, para barrar o César Maia. A esses acho melhor largarem a políticas e irem rezar...


Não escreví manifesto, apenas impressões. Portanto não respondo aos lulistas ou aos anti-lulistas. Concordando com o Macaco Simão: eu não gosto do Lula. Mas gosto menos ainda de quem não gosta do Lula.

as aparências enganam

por Gervásio Castro



Quando eu era garoto me divertia com uma seção da revista O CRUZEIRO intitulada: as aparências enganam. Foi pensando nisso que bolei a brincadeirinha mais ou menos assim:







Numa noite de lua cheia, dois desumanos torturadores aplicam choque elétricos e marteladas numa pobre e indefesa vítima?





Não. Apenas isso:

Três dos melhores blogueiros do país, os piauienses Elmar carvalho, Edmar Oliveira e João de Deus Netto comemoram o sucesso de mais uma postagem:





Fronteira Literária: Piauí - Maranhão

Geraldo Borges



O Piauí e o Maranhão compõem – se geograficamente do Meio Norte, região, pré amazônica. Os dois estados possuem uma fronteira que se interpenetram e por isso mesmo trocam bastante influencia, econômica e cultural, principalmente em suas literaturas. De modo que falar de literatura piauiense sem levar em conta o seu forte vínculo com o estado de Gonçalves Dias é querer tampar o sol com a peneira. Até mesmo por que o rio Parnaíba corta os dois estados, melhor dizendo, ume. E é através deste grande corrente fluvial que começa a literatura piauiense, com a mudança de capital para a sua margem. Sem o rio Parnaíba não existiria o Cabeça de Cuia, e sem esse mito a nossa literatura seria mais fraca. Pois a lenda alimenta a literatura.



Teresina ficou conhecida, durante o seu período mais provinciano, como Cidade Verde, devido aos seus quintais e pomares, este titulo lhe foi agraciado por Coelho Neto quando de um passeio a capital do Piauí lá pela década de trinta. O titulo foi orgulho da municipalidade por muito tempo. Hoje a cidade verde está cinza. Mas fica ai anotado a influencia da literatura maranhense. Quem dá nome cria.



Ferreira Gullar quando garoto esteve em Teresina por várias vezes na companhia de seu pai Newton Ferreira que era comerciante. Vinha de trem. Seu pai vendia mercadorias maranhense no Piauí e vice versa. No seu Poema Sujo Ferreira Gullar canta esta experiência de menino. É um poema que liga São Luiz a Teresina. Vejamos o final do poema.



E como era grande o mundo



Há horas que o trem corria



sem nunca chegar ao fim



de tanto céu tanta terra



de tantos campos e serra



sem contar o Piauí





Já passamos por Rosário



Por Vale – Quem – Tem, Queluz.



Passamos por Pirapemas



e por Itapicuru:



mundo de bois, siriemas,



jaçanã, pato e nhanbu.





Este poesia pode ser assinada pelos melhores poetas piauienses, H Dobal, por exemplo. O trem foi um grande elo cultural entre o Piauí e o Maranhão. Atravessando a ponte sobre o rio Parnaíba.



Humberto de Campos é outra figura muita familiar em nosso meio. Um dos maiores cronistas brasileiros. Em seu livro de memórias fala que morou na cidade de Parnaíba, onde passou a infância, Tinha parentesco com a família Véras. O seu texto o Cajueiro é antológico, e esta bem plantado dentro da paisagem piauiense, no quintal de sua casa em Parnaíba. Coisa rara de se ver.



Um dos fundadores da Academia de Letras Piauiense, Higino Cícero da Cunha, nasceu em São Luis das Cajazeiras, atual Timon. Tornou-se famoso pelo folclore que criaram em torno de seu nome. Não só por isso. Uma vez ofereceu cachaça a um caboclo. O caboclo disse. Eu não bebo arco. Ele, então retrucou. Pois do jeito que eu estou aqui eu bebo até frecha.



Eurípedes Clementino de Aguiar nasceu em Matões. Maranhão. Seguiu a carreira política. Mas também era poeta. Cid Texeira de Abreu, poeta, nasceu em Caxias. Maranhão. Felix Aires nasceu em Buriti Bravo, Maranhão. Salgado Maranhão nasceu em Caxias, e foi integrado pela critica contemporânea piauiense como um dos seus melhores poetas, hoje mora no rio de Janeiro. O poeta Rubervan du Nascimento também achou melhor atravessar o velho monge e tornar-se um poeta piauiense, e cidadão teresinense por conta própria.



O. G. Rego de Carvalho privilegia a paisagem maranhense quando coloca em um de seus romances - Rio Subterrâneo, uma chácara em Timon, como parte de seu cenário. O escritor e cineasta Odylo Costa, filho, no seu romance a Faca e o Rio, que foi filmado, tem como cenário a cidade de Parnarama e Campo Maior.



Corre uma lenda, ás vezes a lenda vira história e a história vira lenda, que o poeta da Costa e Silva é catalogado na biblioteca publica do Maranhão, como genuíno, poeta maranhense. Ninguém ganha ninguém perde. Quem canta o rio Parnaíba como ele cantou só pode ser piauiense ou maranhense. Mas a sua biografia relata que ele nasceu na cidade de Amarante, cidade que ele cantou com todo o lirismo de poeta simbolista redesenhando – a envolta na neblina. E se ele fala. E, ao longe, O mugido dos bois de minha terra... Pode também estar falando do Maranhão.



A literatura de Assis Brasil, pelo menos a tetralogia, que se pode considerar piauiense, tem como cenário o rio Parnaíba. È uma história que diz respeito às margens do rio, por que se refere a navegação.



O Piauí historicamente pertenceu ao Estado do Maranhão Grão Para do qual o Piauí também estava anexado. No período colonial o Piauí teve a sua capitania submetida a do Maranhão, por algum tempo. As pequenas cidades e fazendas do Maranhão sempre despejaram imigrantes para a capital do Piauí, que era um centro administrativo em vias de desenvolvimento e ficava mais perto do que a distante São Luis. Geograficamente o rio Parnaíba separa o Piauí do Maranhão. Mas isto é apenas uma linha no mapa, os dois estados estão unidos pelo velho monge fonte de toda a cultura e sobrevivência do povo que habita a sua bacia hidrográfica. E quem canta o rio Parnaíba canta o Piauí e o Maranhão. O rio Parnaíba com seus afluentes, tanto de um lado como de outro alimentam a mesma cultura.

De quem..



Ana Cecília Salis

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O que não me deixa em paz
Com a minha solidão,
É a presença incansável
De uma saudade anônima...

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foto de Luiza Baldan

Nelsinho Live in New-York



Meu amigo Nelsinho faz Nova Iorque parar para ouvir o som de Minas. Não é duca? Ele merece o sucesso!

UM ZÉ NINGUÉM



1000TON




Avenida Paulista, 23 horas e 47 minutos de domingo. A reunião de emergência está comendo solta no terraço envidraçado, e blindado, do último andar.



O careca anda pra lá e pra cá no amplo salão. O calmante injetado diretamente na veia parece não estar fazendo o efeito desejado até o momento, só efeitos colaterais se manifestam, o tremor das mãos é bem visível, e isso não é nada bom...



Quer dizer que aquela desclassificada pode mesmo ganhar no primeiro turno, é? Heim? Quero saber! Respondam!



E ninguém teve a coragem de responder... silêncio sepulcral no recinto. Virou-se para o secretário, um almofadinha com cabelo escorrendo de gel. _Preciso saber da verdade, mesmo que doa! (e doeu muito, ah! como doeu) O homenzinho balbuciou entre dentes alguma coisa inaudível e foi o que bastou. _Você está demitido!_Mas governador, o senhor já me demitiu ontem, e ontem mesmo me readmitiu, lembra? Aqui já não tem mais ninguém pra ficar de plantão, pra atender o telefone, pra ficar no computador, pra varrer o chão, pra limpar a..._Chega, chega! Está bem, está bem! Eu te readmito novamente.



_ E a campanha no Rio como está? _Bem, governador, as notícias não são tão más... _ Sim, sim, eu agora estou subindo, não é? Finalmente! Vamos lá, quanto? _Calma governador, o que houve foi uma mudança de tendência... O senhor parou foi de despencar, digo, de c-cair... Não deixa de ser um bom sinal, não é?... Não é, governador? Governador, Governador! Eu estou falando com o Senhor...



Passa das 2 e meia da madrugada de segunda; momento insólito: ambos perceberam que só havia, ali, os dois na tal reunião. Súbito os olhares se cruzaram num misto de desespero e solidão.



_Liga pro Fernando Henrique! Bradou o careca apoplético.



_Mas governador, ele já se mandou pro Caribe o mês passado, saiu de fininho e não deixou vestígio, nenhum contato...



_Liga ,então, pro Aécio! M-mas a gente já tentou tantas vezes e não consegue. Sabemos que ele está lá no Rio, como sempre, comendo umas menininhas, e o seu secretário diz sempre que ele está em reunião, lá em Minas. Não temos como falar com ele... _ Como não? Liga pra casa da Andréa, ele deve estar lá! Governador , calma Governador, o senhor está cansado de saber que a Andréa seria a última a saber onde ele está, o caso dele com ela é só pra manter as aparências e... _ Liga pro Serjão Mota, vai!... Ah! Desculpe, eu estou meio confuso, eu acho, desculpe, desculpe...



São mais de 4 horas da madrugada. Novo silêncio sepulcral. O secretário abaixou a cabeça (latejava muito) e pensou desesperadamente numa forma de quebrar aquele vazio insuportável, aquele tormento... eu não agüento mais ouvir esse barulho nojento...lá foi ele vomitar no banheiro, de novo...



O careca se aproxima cambaleante, enxugando o rosto com uma toalha, já toda encardida, os olhos vermelhos, o paletó com grossos respingos pegajosos, senta, ou melhor, despenca na cadeira, quase caindo para o lado. _Governador, anime-se Governador (segurando com as duas mãos a cabeça suarenta e fria do careca), eu tenho uma notícia boa aqui, fresquinha, para o senhor, olha pra mim, presta atenção. Como o senhor sabe, eu estou pessoalmente empenhado em descobrir um podre da Maldita, que acabe de vez com ela e reverta a situação, na qual o senhor se encontra. Eu lhe asseguro, que se a gente soltar essa bomba, a campanha dela vai pro brejo, ah, se vai!



Me diga, me diga logo, por favor! A voz saiu, pela boca murcha e babada da calva lívida criatura, quase como um gemido de dor, trêmula e gutural, uma súplica...O secretário, alvoroçado, marcando bem as palavras, se empertiga todo e proclama: _Eu descobri, governador, que um vizinho de um amigo do primo dela roubou, Governador, roubou a figurinha carimbada do Raí do álbum “Craques da Bola” em 1990 e...

Meduna

Climério Ferreira


Pode parecer um absurdo
Esta minha opinião:
Louco é quem perdeu tudo
Só lhe restou a razão

Luiza Baldan


"Essas velharias que parecem dormir, casas desfiguradas, fábricas desativadas, cacos de histórias naufragadas, elas ainda hoje formam as ruínas de uma cidade desconhecida, estranha."Michel de Certeau. A invenção do cotidiano 2: morar, cozinhar. Petrópolis : Vozes, 1997. P.190.



Nós & Elis



Tudo que aconteceu no "Nós & Elis", bar de Teresina que marcou uma geração, agora documentado pelos participantes. Para os piauiseuros uma obra primordial. Organização do Anjo Andarilho Joca Oeiras.

poemicro

AVISO AOS NAVEGANTES

*

Qualquer dia eu me arreto

E salto direto pra vida real

*

(Climério Ferreira)


Escritor piauiense Marcos Freitas lança Urdidura de sonhos e assombros



Existem pessoas que nascem em um berço tão sólido que seria improvável não vê-las atuando em alguma linguagem artística. O engenheiro piauiense Marcos Freitas é uma delas. Oriundo de uma família dedicada aos movimentos culturais, ele gosta de destacar que, além de seu pai, seus tios e seus avós terem sido escritores, a família foi a grande responsável pela fundação da Academia Piauiense de Letras, que contou com familiares como Lucídio, Clodoaldo e Alcides Freitas. “Minha parente Amélia de Freitas Beviláqua foi a primeira mulher a tentar integrar a Academia Brasileira de Letras, antes mesmo da Rachel de Queiroz”, completa.


URDIDURA DE SONHOS E ASSOMBROS De Marcos Freitas. Preço médio: R$ 30. Editora Câmara Brasileira de Jovens Escritores (CBJE)


Seguindo os passos, Marcos também tornou-se escritor e poeta. Hoje, ele soma 12 livros publicados. Entre eles estão três obras técnicas sobre engenharia e outras nove, todas de poesia. “Primeiro fui estudar para me tornar engenheiro. Só depois passei a me dedicar mais à literatura, já que infelizmente ainda não dá para viver de poesia”, explica.


A última obra, Urdidura de sonhos e assombros, lançada pela editora Câmara Brasileira de Jovens Escritores (CBJE), é uma antologia que traz cerca de 250 poemas escritos entre os anos de 2003 e 2007, todos retirados das seis primeiras publicações do autor. “Urdidura junta textos produzidos em solo brasiliense, já que moro aqui desde 2001”, atualiza o engenheiro civil, que se mudou para a cidade por conta de sua posição na Agência Nacional de Águas (Ana).


Por escrever desde os 10 anos, o autor declara ter material acumulado, até dois romances que nunca foram impressos, mas que pretende lançar na praça em breve. Com 47 anos, além de ser letrista, músico amador e de possuir participações em diversas atividades, cargos de chefia e cursos voltados para a engenharia, Marcos se destacou em sua carreira literária por fazer parte do Coletivo de Poetas do Distrito Federal e por suas prosas contemplarem diversas antologias, como a Contos e crônicas livre pensador, da editora Scortecci; a Antologia de poetas brasileiros contemporâneos nº 4 e As 100 melhores poesias de 2004, ambas da mesma CBJE, que distribui seu último lançamento.


Marcos também possui uma obra chamada Staub und schotter (poeira e cascalho, em tradução literal para português), na qual uniu suas poesias feitas em línguas estrangeiras, como inglês, português, espanhol, italiano, francês e alemão; e já participou do projeto Poesia 10-10-10, ao lado do reconhecido poeta Nicolas Behr.


Trecho


Aflorações
fuga de corrente?
quem sabe
meu coração
não tem voltímetro
súbito?
quem sabe
meu trapézio
não tem lona
chuva de maio?
quem sabe
meu querer
não tem ensaio
desvario?
quem sabe
minha calçada
não tem meio-fio

Fonte: Correio Braziliense - 17/09/2010

Preciosa Pontaria

Paulo José Cunha


*


Semeado no passeio,


o sorriso de plástico


implora um voto,


um olhar, uma atenção.


Semente desconhecida,


tanto pode dar bom fruto


como dar erva daninha.


*


Por isso, o pedestre desconfiado


e o motorista apressado


passam sem dar consideração.


*


Súbito,


o vento derruba o painel,


e o sorriso, deitado,


fica de boca pro céu.


*


Uma pomba transeunte


resolve adubar


aquela estranha semente.


Com preciosa pontaria,


acerta bem na boca do sorriso


e segue o voo, sorridente,


por ter ganhado seu dia.


Céu de Setembro



Paulo Tabatinga

Bel-Ami

Luíz Horácio




Uma trama sem heróis, sem vilões, uma história sobre a capacidade humana de lograr seus intentos, custe o que custar. O juízo moral é mero coadjuvante nessa história de sedução e pessimismo, um quadro em cores cruas retratando a Paris da belle époque pintado por Guy de Maupassant.É o que se pode chamar de grande literatura naturalista, onde a sensualidade tem papel importantíssimo e percebe-se o indivíduo determinado pelo meio.



Texto seco,objetivo, como de resto as personagens da trama. Os escrúpulos estão ausentes, os fins justificam os meios e o meio que predomina é o leito. Protagonista; Georges Duroy é o talentoso conquistador, belo, frio e calculista, O Bel-Ami, que sabe fazer uso de suas principais habilidade, a sedução e a ausência de escrúpulos, e as coloca a serviço de seus propósitos de alpinista social. Coadjuvantes, mulheres nada inocentes,tão ambiciosas quanto Duroy, Madeleine, inclusive utiliza as mesmas armas em sua meta de também chegar ao cume da sociedade parisiense..



Mas quem é Georges Duroy? Apresenta semelhanças com Lucien de Rubempré, de Ilusões perdidas-Balzac, ambos chegados do interior elegem o jornalismo como meio de ascensão social. Antes de continuar com Duroy um parêntese, tanto na obra de Balzac como na de Maupassant a imprensa é apresentada de forma um tanto pejorativa, cenário ou instrumento de promoção a qualquer custo. O jogo de interesses sempre em primeiro plano, em Ilusões perdidas um jornalista aconselha o jovem Lucien a escrever três criticas, uma negativa, uma positiva e uma neutra. Qual chegaria às paginas? Os interesses decidiriam.Como diz um trecho do livro, " …nós somos negociantes de frases e vivemos de nosso comércio." Em Bel-Ami… O La Vie Française era, antes de tudo, um jornal forte financeiramente, pois o patrão era um homem de recursos, a quem a imprensa e o cargo de deputado tinham servido como trampolins.



Lucien alcança seu objetivo, mas cai, Georges se mantém firme e projeta voos mais longos. Pessimistas, Balzac e Guy de Maupassant, conferem ao jornalismo os vícios de uma sociedade onde o tráfico de influências determina destinos.



Mas permita-lhe apresentar, de forma bastante simplificada, o enredo de Bel-Ami.



Georges Duroy, um suboficial, retoma sua vida civil, ganha seu pão trabalhando na estrada de ferro, mas ambiciona mais, muito mais. Certa ocasião encontra um antigo colega de exército que o recomenda ao jornal La Vie Française, onde trabalha. George acaba contratado. Logo conhece a sociedade parisiense, seu sonho de ascensão ganha cores intensas. Inescrupuloso envolve-se com mulheres capazes de colaboração com seu plano. Certo dia, sentindo-se ofendido pelo colega que o recomendara ao jornal não se constrange em urdir um plano para seduzir a esposa deste como forma de vingança. Ela, Madame Forrestier, era quem o ajudava a escrever seus artigos. Demora um pouco, mas o sedutor acaba alcançando seu objetivo. Com a morte do marido, George casa com Madeleine Forrestier. Sua lista de seduzidas é vasta, inclui a esposa do diretor do jornal.



E George chega ao topo, mesmo que para isso precise ludibriar a própria esposa, fato que o torna milionário. Consegue um título de nobreza, Barão, a carreira política será o próximo degrau.



Mas o que faz de Bel-Ami uma preciosidade literária? Vários aspectos, dentre eles a fidelidade com que o potencial maléfico do ser humano é apresentado, não há heróis, não se percebe um traço de inocência ou das melhores intenções nos personagens. Sobra-lhes maniqueísmos, os escrúpulos estão distantes daqueles que podem ascender, numa cena da trama, fica nítida que a honra era um tema defasado naquela sociedade. O importante era tirar proveito de toda e qualquer situação. Constrangedora ou não, pouco importava. Foi o que se deu quando Georges escreveu um artigo em La Vie Française e outro jornalista de um pequeno jornal, por sentir-se ofendido respondeu na mesma moeda. Instado pelo dono do jornal onde trabalhava, Georges, contra vontade, o desafia a um duelo. Atiram um contra o outro, erram, mas a repercussão é capitalizada por ambos.



A atmosfera ao longo das 368 páginas de Bel-Ami é desalentadora, "A quem se apegar? Para quem endereçar gritos de desespero? Em que podemos acreditar?"

Não, não desanime, inocente leitor, afinal de contas como diz o velho poeta Norbert de Varenne a Duroy, página 136: "Ouça, chega um dia e ele chega cedo para muitos, em que não é mais tempo de rir, como costumam dizer, porque atrás de tudo o que olhamos avistamos a morte

Chico Buarque por Netto



No Picinez

domingo, 12 de setembro de 2010

O nome da ponte nova




Edmar Oliveira
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Por conta de meu trabalho tenho revisitado Teresina por períodos muito curtos. E sou testemunha da modernização galopante que a atravessa. Ela parece decidida a apagar o seu passado que habita minha memória. Tento andar nos lugares de antes, mas eles estão se transformando em moderno numa velocidade estonteante. E quando só me acompanham os colegas de meu trabalho, muito mais jovens que eu, freqüento uma Teresina estranha. Não a reconheço.

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Conheci um restaurante moderno, que se parecia estar muito mais perto do sul maravilha que do nordeste que conheci. Comida pouca, muito enfeitada, muito cara. Esse é o padrão internacional da culinária global. O prato saboreado era “filé a poivre” de uma sofistificação francesa que não combina com a galinha da Júlia da minha antiga Teresina. Bares vendendo chopp no preço de três cervejas. Refrigerantes light no lugar da cajuína.

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Os hotéis encareceram os olhos da cara para competir com os de fora. Os shoppings se espalharam matando o comercio antigo do centro da cidade. Os armazéns foram para as prateleiras dos supermercados com seu padrão igual a qualquer lugar e qualidade nas frutas e verduras que nunca deram na nossa horta. A evolução tem suas vantagens.
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Mas quando tenho um tempo vou no bar do Clube dos Diários, na mercearia do Chicão, no frango da Edinha, no bar do Cunha e arrisco até uma panelada no Riba. Caminho pelas biroscas do Mafuá atrás de pimenta de cheiro, ando na frei Serafim, passo pela Pedro II, vou ao Mercado Velho, ao Troca-Troca e ao cais do Parnaíba que de tão seco traz Timon mais pra perto. Só que até ali a modernidade já chegou: fizeram um shopping popular para tirar os camelôs da praça Rio Branco e fincaram uma estação do Metrô num concreto armado suspenso que tira a vista do rio.
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E ainda prefiro a ponte Metálica do João Luiz Ferreira à modernidade da ponte Estaiada. Nosso povo sabe rir até do progresso que nos ultrapassa. Já mudaram o nome da ponte Estaiada. De tão bonita e imponente que ela é faz o cristão botar a cara pra cima numa admiração abestada. Já foi rebatizada de ponte Abestaiada...



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ilustração de Gervásio Castro

Louvação





Lilia Diniz


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Bem que vi fogo pagou

com labacéu medonho

nas capoeiras

o canto da juriti

e o balanço das palmeiras

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Se ninguém ouviu eu quero

com esses versos rasteiros

bendizer as quebradeiras

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Louvo Marias banguelas

desdentadas e sem medo

Louvo Raimunda do brejo

cacimbada de desejo

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Louvo Rita desmilinguida

Cantadeira de encanto

Luzia, Preta, Conceição

Querubinas, Margaridas

benzedeiras de mau olhado

vento virado, agouro e quebranto

.


Lavadeiras de rios e cacimbas

dos poços e dos brejinhos

Encantadeiras de dores

parteiras de alegrias

Carpideiras orquestrando

o labacéu dos passarinhos

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Empresto meu canto ainda

que de taquara rachada

pra fazer a louvação

junto com a passarada



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foto de Paulo Tabatinga durante a passagem da poeta em Teresina, no SALIPI

o pôr do sol do Jacaré



Jurandir do Sax toca o "Bolero de Ravel", dodo o dia, as 17:10 horas, na praia fluvial do Jacaré, em João Pessoa. Quem for à Paraíba não pode perder esse espetáculo. Desculpem a filmagem fula, mas a imagem merecia ser registrada de qualquer jeito.

Não somos...



Ana Cecília Salis

Geografias
Mensurações
De tamanhos tantos...

Pele em superfície
Tão próxima
Tão morna à lembrança...

Bocas
Suor
Gostos
Tão lá onde fomos...

Versos
Gestos
Tão bem delicados...
Tão mais dedicados
Ao que melhor nos merecemos

Falta
Racha
Quebradura
Estranheza
Tão aqui nesse nada que sobramos...

Fez-se memória...
Lamento...
Da crueza distância...
Do amor transbordado
Que já não somos...

A CLASSE MÉDIA VAI AO PARAÍSO, ou A BURGUESIA FEDE, MAS TEM DINHEIRO PRA COMPRAR PERFUME!



1000TON

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Não é mole não.Vem aí um imenso exército de consumidores em potencial. Segundo dados oficiais são mais de 20 milhões de pessoas que ascenderam à classe média. Não é pouca coisa, não. É gente pra dedéu!

Consumidores em potencial. Sim, porque essas pessoas não são tratadas como cidadãos pelo Imperador Mercado. Cobiçados sifrões humanos, assim são considerados aqueles beneficiados com os programas de transferência de renda, promovidos pelo atual governo.


As empresas de marketing e publicidade, na onda dos ventos globalizantes, que por aqui sopram, estão em polvorosa. Em ritmo frenético, publicitários e marqueteiros estão a sair em campo com campanhas fresquinhas, do tipo como-arrancar-dinheiro-dessa-incauta-gentalha?


Lançamentos irresistíveis esperam por vocês:

Usando o bonezinho que espirra pimenta, os garotos se sentirão mais protegidos se um pivete desses “quiser roubar o meu tênis maneirão” e as garotas poderão se defender “daqueles taradões, que ficam se sarrando na gente dentro do ônibus cheio”.


Ruídos escatológicos não incomodarão mais quem estiver do lado de fora dos sanitários. Chegou o vaso sanitário musical. Leva, inteiramente grátis, um protetor nasal, vem com diversas fragrâncias, contra flatulências alheias em lugares fechados ou lotadões.


Você precisa adquirir logo este aparelhinho que dá choques, não letais, para usar num filho da mãe que tentar avançar naquela última peça, olhando pra mim, naquela prateleira, lá do canto da loja, ainda mais no último dia da promoção.

Curtam essa promoção imperdível:

Motel Açussena (no letreiro está escrito assim mesmo)

Suites a R$ 17,99, por 40 minutos.

Sinta-se fazendo amor em plena natureza!

Aqui pra nós: aquilo não é bem uma suíte, não. Na verdade é uma “banheirite” , ou seja, um: banheiro um pouquinho maior, com uma cama retrátil, que sai da parede.O chão é revestido com um tapete de grama artificial e nos cantos estão fincadas flores de plástico. A iluminação tem cores alaranjadas e arroxeadas.


Gente, sabia que faz um sucesso danado! Também, num cenário maravilhoso desse, umas bimbadas por R$ 17,99, o que é que tu queria mais?


No rumo inverso, uma outra classe média, a tradicional, já não está consumindo tanto e consegue, mais ou menos, se manter, a duras penas. Já abandonou, faz tempo, a preferência por marcas. Ah! Vou experimentar este aqui, diz a dona de casa meio envergonhada, para justificar o interesse pelo biscoito mais caidinho e mais baratinho, tirado agora da prateleira do supermercado.

Os preços, tão atrativos para as duas classes médias, passam a criar várias situações incômodas, vividas pelos burgueses tradicionais, mas que horror!

Nas Casas Bahia a madame ia comprar o frízer, em promoção, catado no encarte do Globo dominical, quando se depara com sua antiga faxineira, admirando uma máquina de lavar, dessas poderosas de 6 litros, quase comprando. Rapidamente disfarça, sai da loja, meio trôpega, só volta quando a serviçal vai embora, e, ai meu Deus, só agora que eu vi, com uma bolsa igualzinha á minha!...

Um distinto Senhor toma um susto ao fazer suas compras numa loja de roupas masculinas, esconde-se atrás de uma estante e fica espionando o seu motorista, em dia de folga, ser atendido por um vendedor, na seção de ternos. Engole seco, coração palpitante, toma certa distância dali. Mais aliviado, fica admirando, distraído, umas abotoaduras tão chiques e tão baratinhas e não percebe que... Doutor! O senhor por aqui?

Um advogado interrompe um animado papo. regado a chope geladinho, na mesa de uma churrascaria rodízio. Cutuca, inconformado, um colega seu, apontando, não tão discretamente, para uma mesa próxima: Vem cá, aquele carequinha ali não era o faxineiro lá da faculdade?

Tem outra coisa muito curiosa. Com o surgimento desses “emergentes”, algumas figuras notáveis vão padecer no ostracismo. Outras, subirão no ranking dos preferidos.







Os abalos sofridos pela nova pirâmide social podem bem ser traduzidos por dois perturbadores comentários, vindos de dois extremos geográficos do Brasil.


Um representante da classe média paulistana está revoltado:

“Esse analfabeto do Lula è um despreparado, um ser desprezível, como pôde ter a petulância de ser o Presidente do Brasil?”


Uma representante da classe média nordestina, com saudade dos coronéis, declara:



“Eu já votei no Lula, sim, não nego. Eu me preocupo muito com o social. Mas desta vez eu vou votar é no Serra, viu? Com ele não vai acontecer essa mistura! Cada um saberá o seu lugar... “









Nunca o mesmo rio

Geraldo Borges


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Tenho um rio mitológico


Plantado em meu coração


Pode não ser um rio lógico


E das nuvens cai no chão.



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Tenho um rio de lavrador


Que banha a estrela da manhã


Um rio de um velho pastor


E no seu leito eu planto lã.


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Tenho também um rio delta


Que come capim e rumina


Um rio monge de um poeta


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Plural são os rios que tenho


Tenho um rio que me ensina


A navegar o meu engenho.



poemicro

EXTREMA SOLIDÃO

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Tem dia que a gente se sente tão só

Que nem reconhece a própria sombra

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(Climério Ferreira)

sertão ligadão


Paulo Tabatinga

Tantas vezes porco, reles e vil

Edmar Oliveira


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Na minha vilania


Fernando é Pessoa nobre


Não fui seu amigo


Mas levei tanta porrada na vida


Que me desgrudei da humanidade


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Queria escutar uma voz humana


Que me enxergasse na minha infâmia


Na minha cobardia


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Estou fora da possibilidade do soco


Por não ter quem me bata

Conciliábulo



Toda vez que tô na terra passoa lá. Na foto, o Piauianuta ao lado de Assai Campelo e Xico Wilson, o presidente da confraria.

Asfalto

Paulo Tabatinga



Tapete negro
para a solidão
Dos automóveis

Saudades

Juarez Montenegro


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Transcorre a vida como a caravana



que serpenteia ao longo do caminho,



deixando rastro... ou como um passarinho



que, liberta a ninhada, longe plana.



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Pairando o alado amigo, fica o ninho;



da turba em marcha, a trilha, que se empana...



Também nos resta uma saudade insana



dos mágicos momentos de carinho!



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Há saudade e saudade! Uma passa,



esvai-se, como um hausto de fumaça,



das pegadas do isento caminhante...



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outra é marca indelével, confitente!...



Esta que timbra o coração da gente



transpassa o peito do saudoso amante!




o mar


Zé Alencar



Geraldo Borges

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Zé Alencar foi embora muito cedo


Mais ou menos quase ao meio dia


Mas viveu a sua vida sem ter medo


De viver com coragem e alegria.

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Deu adeus a este mundo conturbado


Cavou a água de seu próprio poço


Escafandro da esperança e anjo alado


Fez amigos mais morreu tão moco.

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Pouco privei de sua presença amiga


Na sua casa, na do Galvão, no gela goela


Mas isto é lembrança muita antiga.

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Agora a maior lembrança é que o amigo


Virou poesia e no zodíaco é uma estrela


Que brilha muito além de seu jazigo.



Janis Joplin - Little Girl Blue (This is Tom Jones, 1969)

Garimpado por Carlinhos Nascimento do Casa Lima Barreto