domingo, 31 de março de 2013

Terremoto no Brasil


Edmar Oliveira
 
Um dia quando estava em Santiago do Chile vendo televisão, deitado, tive a sensação de que a cama andou um pouco no quarto. Logo depois a TV anunciava que acontecera um terremoto de 5.5 na escala Richter. Um pouco depois, conversando com chilenos, soube que 90% dos terremotos na terra acontecem lá (achava eu que era no Japão) e que eles aprenderam a conviver com os abalos quase diários. Minha curiosidade ficou sabendo que a engenharia do colonizador aprendeu com os índios mapuches a fazer prédios que não sucumbiam aos sismos. Essa tecnologia evoluiu e hoje um convênio com o Japão garante construções resistentes à maioria comum dos terremotos. E se você for construir a sua casa em seu terreno tem que obter uma certificação do governo que garante o cumprimento das normas técnicas. Por isso tive apenas a sensação de um embalo suave quando fui acometido de meu primeiro terremoto. Depois um guia turístico me dizia que o asfalto das estradas chilenas tem a garantia de vinte anos de durabilidade e a massa asfáltica recebe um tratamento que resiste a pequenos e médios terremotos sem ficar com rachaduras devido a sua composição elástica. Fiquei encantado com o aprendizado.

Retornando ao Brasil fiquei embasbacado como as construções do Programa “Minha Casa, Minha Vida”, financiado junto a prefeituras pelo governo federal, ruíam como se fossem submetidos aos piores terremotos, que não acontecem nessa terra abençoada por Deus. Recentemente o estádio do Engenhão foi interditado por ameaça de queda da sua estrutura de ferro que sustenta a cobertura. E ele tem apenas cinco anos de inaugurado. O BRT, aqui no Rio de Janeiro, corredor expresso inaugurado a toque de caixa para garantir a reeleição do moleque Dudu, esburacou-se todo, ficando intransitado, com apenas cinco meses de uso.

Absurda a obra que está sendo feita no Maracanã. A maior laje em vão livre do mundo, com sessenta anos de uso sem nenhuma trinca, foi posta abaixo para se fazer uma cobertura tipo a que ameaça desabar no Engenho de Dentro. Irresponsabilidade política, num estádio que deveria ter sido tombado, monumento que foi do futebol mundial. Devemos esta às peraltices do moleque Dudu; ao financiamento das empreiteiras à eleição do Serginho, um Cabral matador de índios; e às alianças arrancadas dos dedos da Dilmona, o irritável poste do Lulinha.

A nossa construção civil, ao contrário do Chile, foi atingida por um terremoto 20% na escala da propina. Nosso abalo moral foi causado pela ganância dos empreiteiros e pela corrupção de nossos agentes públicos de fiscalização. Só não vem abaixo a falta de vergonha na cara de pau...   

Deus, a presidente Dilma e o Papa


Geraldo Borges
 
             A dona Dilma, presidente da republica do Brasil, em sua visita ao novo Papa, Francisco, no estado do Vaticano, cometeu uma piada burlesca, disse:  - O Papa é argentino, mas Deus é brasileiro.

             Algumas pessoas riram principalmente os brasileiros. No meu modo de entender se Deus é brasileiro, não vamos precisar do Papa. Ele não precisa vir ao Rio de Janeiro converter a juventude. Podemos falar direto com o dono do trono.

            Mas pelo jeito que as coisas estão por aqui, me parece que está havendo algum mal entendido; Parece que saímos da graça do  Altíssimo. Sinceramente, sem intriga nem pessimismo,  nosso país, a Pátria do Evangelho está passando por um dos círculo do inferno. Na sua divina comédia. Podemos dar muitos exemplos, mas nem é preciso, eles estão estampados todo dia nas manchetes dos nossos periódicos. Só não ver quem não quer. È triste. Que miséria. Que Deus nos proteja.

             Parece que ele não está dando a mínima para nós. É melhor mesmo a  gente  ficar com o Papa Francisco que, embora seja argentino,  é católico, romano, universal. E abençoa  todo mundo na sua simplicidade. E é disso que estamos precisando.

            Resumindo. Eu acho que a dona Dilma, a nossa querida presidente, falou o nome de Deus em vão, e eu também. Falar nisso dizem que a voz do povo é a voz de Deus. Será? Pois vamos ouvir o povo. Vamos ouvir o Papa Francisco que fala em nome do rebanho.
 
 

Da Costa e Silva


 
Vendi o Sangue
pra tomar cerveja
era o último livro de poesia
 
(Paulo Tabatinga)
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essa primeira edição está anunciada no mercado livre por R$ 475,00, o que valoriza ainda mais o poema do Tabatinga
 

klöZ por 1000TON

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Amanhã foi um dia que durou 21 anos. Não foi mentira as torturas que sofremos. E não podemos esquecer de que a intolerância nos calou. Falemos dela sem medo. Fora Feliciano (Edmar)

VIDA VADIA

 
Lázaro José de Paula
 
VIDA VADIA
CORAÇÃO E VIOLÃO, TAMBEM
E ASSIM NESSA LEVADA
VOU SOB O FIO NAVALHA
EM COMPENSAÇÃO ,
QUE CONTRADIÇÃO,
NÃO DEVO NADA
A SEU NINGUEM
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magnífico desenho de Flávio Calazans, surrupiado de Antônio Amaral

Reclame

.
Bumba-meu-boi quanto vale?
Tem coisa que não tem preço
Quanto vale João do Vale?
Um simples gesto de apreço?
.
Eu anuncio que a vida
É a alegria de ser
Até chegar a partida
... Até a vida morrer
.
Eu anuncio um produto
Que não produz nenhum dano
Que não destrói viaduto
E nem propaga engano
.
Eu anuncio a poesia
A rima, o verso, a cor
A boniteza do dia
A alegria e o amor
.
(Climério Ferreira)

A banda da minha cidade


Geraldo Borges           
 
A partir do mês de setembro a banda passa quase todo santo dia, treinando, em frente da minha residência. E a banda da Prefeitura. E como pertenço a municipalidade, admito que a banda é da minha rua. Ela passa para tocar para mim. Por isso mesmo escrevendo, ou lendo, no fundo da minha casa, na varanda, que dá para o quintal, e ouço a banda tocar, não consigo ficar sentado. Desconcentro-me. Meus pés e mãos começam a se mexer. Eu me levanto. Abandono livro, caderno, lápis, e saio correndo para o terraço.

Fico olhando a banda passar. Sinto-me maneiro olhando e escutando a banda da minha cidade. Enquanto fico observando os seus componentes desfilarem, são vários: cada qual com o seu instrumento, sua postura, sua galhardia; uns conduzem instrumento de sopro, outros de percussão. Ao lado vai o maestro, dirigindo a banda, lampeiro. Mas eu tenho a impressão que é a banda que vai dirigindo ele. Todos os componentes estão concentrados em suas tarefas musicais. Não saem do tom e mantém o ritmo. O componente da banda que mais me chamou a atenção foi o homem do bombo. È grande, forte, barrigudo, sério. Ele e seu bombo me fizeram rir, embora ambos estejam em devida proporção. E o riso me fez entrar mais ainda no ritmo da banda. De modo que, quando menos espero, sou tomado de uma onda de musicalidade, e já estou marchando também, indo e vindo, no meu terraço, embalado pelo som de todos os instrumentos. Como se tivesse sido arrebatado da minha vida ordinária para um concerto de rua.

A banda não canta nada. Não há nenhum hino patriótico, cívico. Linda galera em noite de lua. Apenas toca e me toca de tal maneira que já me tirou do sério. Ou melhor, como já ficou claro, me tirou  da minha mesa de trabalho, dos meus escritos, de minha arte de escrever. Tirou ou não tirou?  Agora reconsidero. Ao contrário, a banda avivou a minha sensibilidade e introduziu-se como um componente de meu próprio exercício literário.

Quando a banda terminou de passar, houve um silencio pesado, como se todas as coisas voltassem ao seu lugar. Aí eu voltei para a minha mesa, para o fundo de minha casa. E fiquei ouvindo o canto dos passarinhos no quintal.

A manhã  a banda vai passar de novo, mais ou menos a mesma hora. Vai ser assim durante uns quinze dias. Pois os seus componentes estão treinando para o desfile da parada em homenagem a mais um aniversário da cidade. Ai a banda vai tocar para a cidade toda. Por enquanto está tocando só para mim e para quem quiser escutá-la. Pois, dificilmente, por mais atarefado que uma pessoa esteja  para não dar ouvidos à banda que vai passando, é porque não se toca.
 
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desenho: Banda de Música de Cândido Portinari

contos mínimos I

A avó enfiava um pauzinho no chão, ficava olhando, e nada. Uma semana, três, nada: o pauzinho não mudava de lugar.
Resmungava: “E ainda tem gente que acredita nessa história de que a Terra gira”. 
 
(Paulo José Cunha)
 
 
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pjcunha iniciando uma série

TERGIVERSAR. DOIS PONTOS


Luiz Horácio
 
Thamara. Eu escolhi o nome. Daqui alguns meses ela completará vinte anos. Incansável, ensina este velho pai desde seu primeiro dia.

Uma manhã, enquanto acariciava seu gato, lá se vão uns dezessete anos; me perguntou como acariciar um pássaro.

-Ora pai, nos pássaros a gente faz carinho com o olhar.

Aprendi a lição e passei a me demorar ainda mais observando os pássaros.

Os raríssimos leitores de meus livros, se não sabem, com certeza deduzem a admiração que tenho por esses  animais.

Os que cantam, os que não cantam, os coloridos e os nem tanto, os que voam alto e os que tentam.Mas um merece minha admiração especial, o urubu.

"Nojento, horroroso, todo preto", adjetivos destinados ao urubu.

"Louco,asqueroso,mórbido", os  que sobram para mim.

Luísa, a mãe escolheu o nome. Em novembro terá oito anos. Dia desses pediu que eu lesse Dom Quixote para ela. Breve resumo que ouviu atentamente. Prometi ler a história.

“Mas urubu, pai!”

Sim, urubu. A elegância do vôo me fascina.Falta-lhe apenas a coragem do quero-quero.

 

Independente do meu estado, alguém dirá  “de espírito”mas como disso nada sei, então omito, os urubus  sempre aparecem. E me melhoram. Fizeram falta em passado distante.

Quando minha mãe apagava a luz do meu quarto, o peso gelado da escuridão  sufocava minha frágil  coragem  despertando angústias adultas no menino.

Noite após dia, noite após dia, naquela hora eu pensava que iria morrer durante a escuridão, então não fechava os olhos até a janela mostrar o fim da noite. Medo, puro medo. O medo detesta os tolos. Enquanto isso a vida ia se enfeitando de mortos.

Nesses momentos de medo, eu almejava asas. Asas que me levariam à claridade, asas acelerando o tempo, asas explodindo o breu. Eu ia para a janela, mas os pássaros da noite não se deixavam ver.

Espero que minhas filhas, ao se tornarem adultas, que não sejam como a maioria, não acordem em meio ao sonho bom. Apenas os egoístas acordam em meio ao sonho bom. E eu que não posso afirmar que sonho, o que me resta?

Vivo  prestes a chorar. Na verdade, acredito ter desenvolvido uma maneira muito particular de chorar, sem lágrimas, sem soluços...Sofrer não purifica a alma, não purifica nada.

 Os urubus e os quero-queros os únicos seres que sabem sofrer. E por saber não sofrem. Eles não envelhecem.

 

Meus pais formavam a ilha de segurança e solidão onde desfilei minha vida até a adolescência. Segurança por que nunca o amor esteve ausente e solidão por que a proteção isola. Amigos, se haviam, eram poucos e apareciam de vez em quando. Não que eu sentisse falta de mais alguém, muito pelo contrário, curiosidade apenas. Hoje eu entendo e sinto falta. Proteção implica  tristeza? Seria, quem sabe, minha prematura percepção de uma tristeza intrínseca?

Olho para o céu e não percebo nenhum urubu solitário.

 

Chegam jornais, livros, revistas, é necessário ler tudo e tentar escrever algo original. Do que é lido extraio questões. Não faço julgamentos mas, apenas os amigos podem me decepcionar. Desconfiar sem dar certeza é uma arte que, confesso, gosto de praticar. Silêncio é o imperativo do meu bem estar. Só ou acompanhado.

 

Às vezes chego a temer pelos dias de minhas filhas, elas repetem minhas preocupações e meus medos. Ainda ontem Luísa perguntou o que fazer para deter o pensamento.

Afasto um pouco esse medo quando percebo que ela trata melhor suas dúvidas, bem melhor do que eu. Verbaliza, fala comigo, questiona. Eu as guardava em meu quarto, em meus pensamentos.

Thamara, criança, a caminho da praia:

"-Pai, eu não quero te perder, quando você ficar velhinho, bem velhinho e você morrer...eu vou guardar as suas fotos."

Equilibrando na fronteira entre o riso e o choro, abracei-a com o ímpeto juvenil que ainda me resta na expectativa que ela mantenha essa naturalidade.

Prainha é a praia que frequento no Recreio dos Bandeirantes, é lá que encontro Chiquinho, ele tem uma companheira mas ainda não fui apresentado, um urubu que habita o lugar. Raramente voa, costuma andar entre os frequentadores e tem por hábito roubar uma sombra, de cadeira ou barraca, pouco importa. Às vezes, quando o termômetro bate nos quarenta graus, cansa suas asas num vôo até o Parque da Prainha e se demora numa chuveirada. Volta renovado, “outra pessoa”.

Dia desses enquanto ele pegava comida em minhas mãos trocamos algumas idéias. Por que ele andava, podendo voar? E por que eu tinha que andar se tanto queria poder voar?

Ele riu, balançou seu pescoço pelado e sem dizer nada foi até a beira do mar. Ficou um tempo por lá, ele adora isso.

Ao voltar pediu que fosse buscar um coco gelado. Obedeci.

Assim que o canudo roncou avisando o fim próximo:

-Quer?

-Não, obrigado.Sei que minha memória não é lá grande coisa, mas você está me devendo uma resposta.

-Você é tão engraçado!  Mas vamos lá, acompanhe. Atenção porque o bagulho é profundo. Dois pontos. Faço questão de dizer dois pontos para o interlocutor perceber a metafísica da coisa. Agora vai. Dois pontos. você já ouviu dizer que querer é poder? Claro que já.Pois é a maior tolice, a prova viva ora me ouve. Quem falou isso a primeira vez foi um tio meu. Sou a prova viva, eu quero andar e ando. Você...você só sabe tergiversar...tergiversar. Tergiversar e falar.Tudo precisa ser dito, muito barulho, muito barulho não leva a lugar algum.Já me viu gritando, cantando? Não , claro que não. E tergiversando? Hein...hein? Tergiversando, dois pontos. Dois pontos porque tergiversar não é profundo. Me acompanha?

Você quer voar? Não queira. Bem que uma risada seria adequada nessa altura, concorda? Mas não farei isso, pelo menos neste instante.

Até amanhã.  Melhora o rango, s’il vous plaît. Beijos na Luísa e na Thamara. Fui.

   Dito isso retornou à beira do mar. Permaneceu por lá dez minutos, marquei no relógio. Voltou naquele passo elegante dos urubus, ao passar por mim lançou um olhar de desprezo misturado com ironia.Não fosse Chiquinho um urubu...ah Chiquinho...ah Chiquinho...

Logo parou, em seguida num vôo rápido e quase rasteiro alcançou a barraca da Tia que aluga cadeiras e barracas. Dali até o bolo que repousava, oferecendo-se, sobre o prato, foi um pulo.

Levou-o no bico e deliciou-se, sem alarde, sobre uma pedra. A tia viu. Sorriu.

No silêncio, a única possibilidade de não haver fingimento?

 

 

Tempo no Piauí

fonte: Jornal o Dia, 1960. Enviado por Paulo Tabatinga.

domingo, 17 de março de 2013

Ciro de Uiraúna

 

Com uma semana de atraso chamo aqui atenção para a exposição de Ciro Fernandes na Academia Brasileira de Letras, Sala Manuel Bandeira, no Centro do Rio de Janeiro, que fica até dia 28 de março. Para os que moram no Rio é um acontecimento imperdível.
 
Ciro de Uiraúna, como também é conhecido, nasceu naquela cidade paraibana no começo do ano de 1942. Veio para o Sul com 17 anos, foi operário em São Paulo e desenhista de bois nos açougues da zona Leste da Paulicéia. Fez uma viagem de volta ao sertão desenhando capas de cordéis na Feira de São Cristóvão. Reaprendeu a arte da xilogravura com Mestre Altino, de João Pessoa, e desembestou a produzir uma obra tão grandiosa como infinita. Das capas de cordel, que ainda trabalha intensa e prazerosamente, saltou para capas de livros, tendo feito motivos gráficos para Orígenes Lessa, Ana Maria Machado, Gilberto Freire, entre outros autores importantes da literatura nacional. Reconhecido como artista plástico fez várias exposições mundo afora, sendo esta da ABL a mais recente.


Tive o prazer de conhecer Ciro na década de 1980 na sua casa, pois éramos vizinhos. Naquela noite fui apresentado ao artista por um amigo em comum das Alagoas. Ciro estava fazendo uma série para o zodíaco e me deu uma cópia do leão, que até hoje ostento orgulhoso na minha sala. Daquela visita me impressionou a simplicidade do artista, sua calma contrastando  com as evidências de intensa atividade laborativa. Reparei que a mesa da sala, outros móveis de madeira, inclusive cadeiras. Em todos a arte da xilogravura se fazia presente na matriz dos quadros que mostrava impressos em pano e cartolina. Mudei de endereço, fui morar do outro lado da cidade e perdi o contato com Ciro.


Recentemente, quando voltei a morar perto do centro, um outro amigo comum me levou a uma nova visita na casa de Ciro. A mesma casa, mas foi novamente surpreendido. Agora o corredor comum do andar de Ciro era uma parede de galeria com a exposição dos seus quadros. Fiquei ali invejando os vizinhos do velho artista. A casa era a principal sala da galeria com a exposição dos objetos de trabalho do artista. Daquela vez ele presenteou o nosso amigo comum, compositor e cantor, com um violão. Detalhe: feito por Ciro, que agora começara a fabricar aquele instrumento, elogiado pela qualidade por vários músicos, confessou meu amigo depois. Passamos a nos ver mais amiúde e gosto da prosa de Ciro. Um dia, sabendo que eu era médico, confessou que fizera 70 anos sem nunca ter ingerido uma “piula”, como dizemos em nordestinês. Claro que eu recomendei a manutenção da receita de vida e não começar agora essa mania de velhos em conviver com remédios, feito eu.
  

Ciro sendo de Uiraúna e nascido da era de quarenta e dois foi amigo de infância do João Claudino, o dono do maior negócio de Teresina, o Armazém Paraíba. Claudino, ao contrário de Ciro, enricou tanto que seu Armazém virou um shopping na cidade. O Armazém Paraíba é para o Nordeste como as Casas Bahia para o Sudeste. Tem uma rede nos estados do Piauí, a origem, Maranhão, Ceará, Bahia e Pernambuco. Não tem na Paraíba, que santo de casa não faz milagre. Mas não desviando a história para o João Claudino, quando comemorou cinquenta anos do primeiro armazém, em 2008, convidou Dominguinhos e outros artistas para as festividades. Não se esqueceu do amigo de infância e chamou Ciro que fez uma exposição no Teresina Shopping.
 

Conhecendo um pouco o Ciro, telefonei para vários amigos, ressaltando a importância do artista. Nenhum foi ver o Ciro, para a infelicidade deles. Ciro ficou meio deslocado na companhia do amigo rico e dos frequentadores do shopping e veio embora antes do fim da exposição. Se o meu amigo Assai tivesse levado ele para a Pedro II; se o Durvalino tivesse levado Ciro ao Conciliábulo; se o meu compadre Cinéas entretece ele na Oficina da Palavra, o Ciro Fernandes teria gostado da nossa Teresina. Nada não, fica pra outra. Mas agora eles terão que vir ao Rio ver uma exposição do Ciro. E juro que vale a pena, como vocês podem ver nas imagens que ilustram essa conversa.


Como diz Aderaldo Luciano, doutor em literatura com tese sobre o Cordel:
A exposição de Ciro Fernandes na Academia Brasileira de Letras é um manancial artístico inigualável. Ciro alcançou um patamar superior na xilogravura brasileira. Telas complexas e tão detalhadas que chegam a confundir o olhar do expectador. Ciro não fere a madeira, oferece a ela a oportunidade de tirar a roupa e se revelar sudutora. Ciro risca a pele da madeira sem tatuá-la, mas dissecando-lhe o coração. Ciro é zeloso: acaricia a madeira como Jacó acariciou a pele branda de Rachel. Ciro Fernandes é de Uiraúna, na Paraíba do Norte, vive no Rio e eterniza-se na arte. A Academia Brasileira de Letras com esse evento alcançou a redenção”.
 

 

Meu candidado a Papa


Geraldo Borges
(mesmo já tendo um Papa argentino, Geraldo imagina um brasileiro. Adivinhem quem!)
 
Pensando, aqui, com os meus botões, num jogo de imaginação  tive uma idéia, e levanto  a questão. Trata-se da candidatura  à Papa de um cardeal brasileiro.

Quem seria? Tem muitos nomes importantes que a gente poderia citar. Dom Avelar, se fosse  vivo, por exemplo.  Dom Helder Câmara, este seria mais difícil, devido a sua posição política radical. Também está morto. Os vivos são muitos.

Mas continuando a mexer com mus botões vou tirar o Papa do bolso da minha cartola. Quer dizer, vou dar o meu voto, e nesse caso, o Papa não seria nem europeu, muito menos  asiático  nem da America hispânica, nem da África, nem americano, se bem  existe uma profecia que fala na eleição de um Papa negro para o Vaticano.

O Brasil nunca ganhou um premio Nobel, dificilmente teríamos um Papa. Digo assim porque acho que a literatura e a religião tem algum coisa em comum.

Falando em literatura, é daí que vem a minha proposta para um candidato a Papa. Caso  o meu candidato não tivesse se desviado de sua primeira vocação. Caso tivesse seguido a carreira eclesiástica, hoje seria Cardeal, na cidade maravilhosa do Rio de Janeiro, e como é um humanista, com certeza seria muito respeitado, tanto no morro, como no asfalto. E, além disso, sabe várias línguas. E, além do mais, é longevo, uma das necessárias características para ser ungido pontífice, tornar-se uma ponte entre o céu e a terra.

Mas em vez de se tornar padre, resolveu sair do seminário, e a igreja perdeu, quem sabe, um futuro Papa, contando com meu voto, aqui com meus botões.

Mas que seria este personagem?
Vamos com calma. Comecei a entrar em contacto com ele nos idos da década de sessenta, lendo suas crônica no jornal  carioca, se não me falha a memora, era o Folha da Manhã , e o titulo da coluna era  “da arte de falar  mal.” A esta altura se o leitor é antigo já tem uma pista de quem estou falando. Depois o acompanhei na revista Manchete lendo suas crônica ferinas. Ambos os periódicos desapareceram.  Depois o redescobrir no Jornal Folha de São Paulo E grande foi a minha alegria.

Logo depois li o seu primeiro romance. “Informação ao Crucificado.” Trava-se de um relato  descrevendo a sua experiência no seminário, o eixo de sua narrativa  corre no fulcro da memória. Seu livrinho, magro e rígido, em fôrma de diário é uma biografia espiritual que termina com esta frase.

Deus acabou.

Este homem abandonou a Igreja. Tornou-se um grande escritor brasileiro. Foi preso pela ditadura. È um imortal da academia. Não vou citar a lista de seus grandes romances. Nem também de seus trabalhos jornalísticos. Só digo uma coisa; eles são de grande importância para se entender a história cultural e política do Brasil

Todo mundo já sabe de quem estou falando. Deus acabou para Carlos Heitor Cony. Mas se não tivesse acabado e ele tivesse ficado na igreja seria hoje um respeitável  cardeal, e se o rebanho pudesse votar e ver a fumaça subir pela chaminé, com certeza ele teria o meu voto. Só que  ele preferiu desistir da  hóstia e aderiu ao  chá da cinco da Academia que também é uma grande instituição de ídolos que, as vezes, se vestem com uma roupa bizarra em solenidades especiais. Bom.

Acho que já chega me mexer em meus botões. E isso aí: Carlos Heitor  Cony seria o novo Papa que eu tiraria da cartola. Pois tornar-se Papa é um dos grandes milagres da vida contemporânea.

 

ANJO CAÍDO

 
Lázaro José de Paula
 
NO AREAL DAS DUNAS BRANCAS
NO CIPÓAL DO GRANDE SERTÃO VEREDAS
BEBENDO O SANGUE QUENTE DAS CANÇÕES
QUE ME ILUMINAM PELA VIDA AFORA
NAS QUEBRADAS DO RIO
NESSE ALTAR DE ANJO CAÍDO
SÓ QUEM DANÇOU FUI EU
NESSA LONGA E LARGA ESTRADA
SÓ QUEM DANÇOU FUI EU
VOCE JÁ  FEZ POUCAS E BOAS COMIGO
E EU  SÓ TENHO UM CORAÇÃO
QUE SOFRE A CADA BATIDA
ALUCINADO DE DOR
ENTÃO POR ESSAS E OUTRAS
EU CANTO O VELHO BAIÃO
QUE ANTIGAMENTE EU CANTAVA
QUANDO VOCE IA EMBORA SEM RAZÃO
NA BOCA DA NOITE MAIS ESCURA
NO CLARÃO DA LUA CHEIA

" MEU AMOR NÃO VÁ EMBORA
FIQUE MAIS UM BOCADINHO
SE VOCE FOR SEU NEGO
CHORA ORA...ORA...ORA..".
_______________________________________
desenho: Amaral

Responder
Encaminhar

Sima

 
 
bola no pé:
drible curto e elegante...
chute suave e certeiro:
e a trajetória da bola
no balanço poético da rede
 
(Paulo Tabatinga)

uma canção pro Chorão e outros que se foram quão

 
teu neném
.
(Aderval Borges)
.

dama

teu neném voltou pra cama

quebrou a cara no programa

ele agora está sozinho

esta cidade é como ele

está carente de carinho

.

dama

teu neném já tá em outra

mexeu nos cachos da gueixa

teu neném quer ser papai

.

dama

teu neném já pôs nas veias

outra picada de consolo

como se diz, está feliz

você sabe, isso de cama

é como trama de melodrama

reza tanto quando dura

tange veras quando nada

.

dama

teu neném caiu de banda

excedeu nos miligramas

teu neném não volta mais
 
 

Clímax

nossos corpos

encanteiraram-se

no jardim sedento da noite

.

depois amanhecemos

homem e mulher

numa só asa abstraída

soprada pelo dia
.
(Graça Vilhena)

Horas Insuspeitas

Não sou Graça Vilhena
(quem dera... quizera... " o coração em flor

enfeitar meus cabelos" pra você)
Nem Ceumar
Não sou nordestina
Nem mineira
Não sou casada
Nem solteira
Da vida, quero o amor
Do jeito que se apresentar
É hora de desaprender o pouco que sei
Só acredito no inexplicável
A tua poesia enche o meu quarto de vagalumes
Me encantam
Os teus espantos

          
               LelêRosa vermelhaFernandes

Lo  Papa  arhentino  tambIén  es  pop!
Milton de Souza Farias

 

*(Logo após a escolha do novo papa, indagorinha mesmo, noutro espetacular furo de arapongagem explícita, apresentamos aos leitores uma conversa íntima ocorrida dentro do Vaticano)*

 

     O novo Bicho-Papão JORGE MARIO BERGOGLIO, Francisco I, estava redigindo o seu discurso a ser proferido para os crápulas operadores do Deus Mercado, quando um musculoso Cardeal, chefe da torcida do Boca Júniors, adentra esbaforido pelo Salão Papafina.

     Sua Videla-Santidade toma um baita susto e xinga o incauto:

     _ Putcha qui os páriu! Piel’ alma de Pinochet! Ahora non puedo ser interrompido, puêrra!

     _ Mas é que surgiu uma emergência lá no Brasil e...

     _ Lo que ocorrió desta bês?

     _ Aquele candidato, o Cézio, o Anízio, Anézio, não... o..., o Néscio Leves, aquele cara playboizinho que vive na night do Rio, cheirando todas as carreirinhas e comendo as garotinhas de Ipanema, o...

     _ Ês o Aêcinho Niebes, imbécil, lo que quier el?

     _ Ele se meteu numa encrenca nevada, desculpe, quero dizer, lascada, lá no Brasil! Vossa Ditatorial Santidade sabe que lá vai ter eleições em 2014, não é?... B-bem, vendo que pode perder feio, ele foi falar mal do governo Dilma, esculhambou com a Petrobrás, tirou do túmulo aquela múmia do FHC, e...

     _ Y entonces, dezenbutcha luego, su mierda!...

     _ Pois é  ele deseja que Sua Santissíssima Pessoa

participe da  campanha dele, ele está desesperado mesmo... Imagina ... precisando de uns de 40 milhões de votos só para entrar na briga contra aquele analfabeto do Lula...

       _Más la presidente non és la Dilma, que bai tentar a reeleición?

       _É tudo a mesma merda... Ahan!...Desculpe Suprema Santidade!...

     _ Puêrra, éste panaca se queda metiendo-si en enrascada ! Em bez de quedar-se  quietinho  em Minas Heraes, se atcha preparado para enfrentar La Poderôssa Makina del Lulismo!...

     _ Pois é, meu Santo Guia, e-eu... eu até comentei com ele pra desistir e deixar o espantalho do Serra sair de candidato de novo, pra perder pra presidente pela 3ª vez e ... Além do mais a ex-mulher dele, do Aécio, essa tal de Andrea, fez um bafafá danado, disse que vai botar a boca no trombone, contando todos os podres desse mauricinho, porque ele se envolveu em tantas falcatruas, que a lama podre já estava sujando o nome dela...(cá pra nós Sumo Pontífice, se o Aecinho botar uma grana na mão dela, de repente a patricinha até ficaria na moita, mas nem é bom arriscar, né?)

      O Santo Papudo percebeu, então, a gravidade do problema e começou a caminhar de um lado para outro, pisando firme e lançando, de quando em vez, um muxoxo Paposo:

      _ Deha ver, deha ver... EURÊKA! Diga para Aêcio bater fuerte: hamar a Dilma de mujer incompetente, de levar el Brassil para el fundo del puesso, que en su gobierno so hay corruptos, que bai dar cierto! Tiene qui  dar cierto!

      _ Mas isso o FHC já fez, e não adiantou nada... O infeliz ainda fez a besteira de dizer, de novo, que tudo que deu certo no governo Lula e no governo Dilma foi graças ao período dele como presidente... E a gente sabe que se comparar o governo do pau-de-arara com o governo do cheiroso de Higienópolis, o paraibinha ganha de 100 a zero, caramba!...  

      Então o Sumo-Papudo, percebendo que a vaca estava indo para o brejo dos pampas, naquele momento de extrema angústia, assim como Cristo, dando um esporro colossal nos vendilhões do templo, chutou o pau da Barraca Vaticânica, e vaticanou, isto é, vaticinou:

 

      _ ENTÓN DIGA PARA ELE DISSER QUE DILMA É ATÊIA, QUE EJA FUÈ GUERRILLERA PERICULÔSSA, QUE USSA ARMAS CON GRAN DESTRESSA, QUE ES A FABOR DEL ABUERTO!

AHORA  BALE TUDO!

CONVUECA UNA GRAN PASSEATA COM A TRADIZÓN, FAMÍLIA Y PROPRIEDAD!

NON PODIEMOS PERDER ÊSTA ELEICIÓN!

Y BAI LOGO EMBUERA DE ACÁ, SU PUTO, QUI JO TENGO  MÁS O QUI HASSER!...

 

     Com alívio, depois de se livrar do fanático torcedor Cardeal, finalmente o Santo-Papa-Tudo pôde terminar o texto final de sua primeira mensagens aos fiéis, que dizia assim:

 

“Rêzem bastante, contudo non se esquézan nunca de passar la sacolija!”.

 

                                                                  1000TON

 

 

O poema


        Tiro o meu poema da cartola
        Com palavras bordadas no papel
        Com notas tocadas na viola
        Como Rodin manobra seu cinzel.

        Todo poema é esgrima singular
        Um objeto estético um livre jogo
        Uma naja que ouve o meu cantar
        Salamandra centelha em pleno fogo.

        Alice em outro país das maravilhas
        Sonho matéria em recomposição
        Palavras aranhas em suas trilhas.

        O poema cigarra em pleno cio
        Sob um sol escaldante de verão
        Reverberando acordes de assovio.
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(Geraldo Borges)