domingo, 17 de março de 2013

Ciro de Uiraúna

 

Com uma semana de atraso chamo aqui atenção para a exposição de Ciro Fernandes na Academia Brasileira de Letras, Sala Manuel Bandeira, no Centro do Rio de Janeiro, que fica até dia 28 de março. Para os que moram no Rio é um acontecimento imperdível.
 
Ciro de Uiraúna, como também é conhecido, nasceu naquela cidade paraibana no começo do ano de 1942. Veio para o Sul com 17 anos, foi operário em São Paulo e desenhista de bois nos açougues da zona Leste da Paulicéia. Fez uma viagem de volta ao sertão desenhando capas de cordéis na Feira de São Cristóvão. Reaprendeu a arte da xilogravura com Mestre Altino, de João Pessoa, e desembestou a produzir uma obra tão grandiosa como infinita. Das capas de cordel, que ainda trabalha intensa e prazerosamente, saltou para capas de livros, tendo feito motivos gráficos para Orígenes Lessa, Ana Maria Machado, Gilberto Freire, entre outros autores importantes da literatura nacional. Reconhecido como artista plástico fez várias exposições mundo afora, sendo esta da ABL a mais recente.


Tive o prazer de conhecer Ciro na década de 1980 na sua casa, pois éramos vizinhos. Naquela noite fui apresentado ao artista por um amigo em comum das Alagoas. Ciro estava fazendo uma série para o zodíaco e me deu uma cópia do leão, que até hoje ostento orgulhoso na minha sala. Daquela visita me impressionou a simplicidade do artista, sua calma contrastando  com as evidências de intensa atividade laborativa. Reparei que a mesa da sala, outros móveis de madeira, inclusive cadeiras. Em todos a arte da xilogravura se fazia presente na matriz dos quadros que mostrava impressos em pano e cartolina. Mudei de endereço, fui morar do outro lado da cidade e perdi o contato com Ciro.


Recentemente, quando voltei a morar perto do centro, um outro amigo comum me levou a uma nova visita na casa de Ciro. A mesma casa, mas foi novamente surpreendido. Agora o corredor comum do andar de Ciro era uma parede de galeria com a exposição dos seus quadros. Fiquei ali invejando os vizinhos do velho artista. A casa era a principal sala da galeria com a exposição dos objetos de trabalho do artista. Daquela vez ele presenteou o nosso amigo comum, compositor e cantor, com um violão. Detalhe: feito por Ciro, que agora começara a fabricar aquele instrumento, elogiado pela qualidade por vários músicos, confessou meu amigo depois. Passamos a nos ver mais amiúde e gosto da prosa de Ciro. Um dia, sabendo que eu era médico, confessou que fizera 70 anos sem nunca ter ingerido uma “piula”, como dizemos em nordestinês. Claro que eu recomendei a manutenção da receita de vida e não começar agora essa mania de velhos em conviver com remédios, feito eu.
  

Ciro sendo de Uiraúna e nascido da era de quarenta e dois foi amigo de infância do João Claudino, o dono do maior negócio de Teresina, o Armazém Paraíba. Claudino, ao contrário de Ciro, enricou tanto que seu Armazém virou um shopping na cidade. O Armazém Paraíba é para o Nordeste como as Casas Bahia para o Sudeste. Tem uma rede nos estados do Piauí, a origem, Maranhão, Ceará, Bahia e Pernambuco. Não tem na Paraíba, que santo de casa não faz milagre. Mas não desviando a história para o João Claudino, quando comemorou cinquenta anos do primeiro armazém, em 2008, convidou Dominguinhos e outros artistas para as festividades. Não se esqueceu do amigo de infância e chamou Ciro que fez uma exposição no Teresina Shopping.
 

Conhecendo um pouco o Ciro, telefonei para vários amigos, ressaltando a importância do artista. Nenhum foi ver o Ciro, para a infelicidade deles. Ciro ficou meio deslocado na companhia do amigo rico e dos frequentadores do shopping e veio embora antes do fim da exposição. Se o meu amigo Assai tivesse levado ele para a Pedro II; se o Durvalino tivesse levado Ciro ao Conciliábulo; se o meu compadre Cinéas entretece ele na Oficina da Palavra, o Ciro Fernandes teria gostado da nossa Teresina. Nada não, fica pra outra. Mas agora eles terão que vir ao Rio ver uma exposição do Ciro. E juro que vale a pena, como vocês podem ver nas imagens que ilustram essa conversa.


Como diz Aderaldo Luciano, doutor em literatura com tese sobre o Cordel:
A exposição de Ciro Fernandes na Academia Brasileira de Letras é um manancial artístico inigualável. Ciro alcançou um patamar superior na xilogravura brasileira. Telas complexas e tão detalhadas que chegam a confundir o olhar do expectador. Ciro não fere a madeira, oferece a ela a oportunidade de tirar a roupa e se revelar sudutora. Ciro risca a pele da madeira sem tatuá-la, mas dissecando-lhe o coração. Ciro é zeloso: acaricia a madeira como Jacó acariciou a pele branda de Rachel. Ciro Fernandes é de Uiraúna, na Paraíba do Norte, vive no Rio e eterniza-se na arte. A Academia Brasileira de Letras com esse evento alcançou a redenção”.
 

 

3 comentários:

Anônimo disse...

Caro Edmar, você tem razão, é realmente imperdível a vista a esta exposição. A Xilogravura elaborada pelo Ciro Fernandes alcançou patamares altos da erudiçao, com singeleza agrassiva da simpliscidade.
Chico Salles.

Leonardo Almeida Filho disse...

Estarei no Rio em princípio de abril e vou conferir a exposição do conterrâneo.
Leo Almeida

Anônimo disse...

Voce foi muito feliz em seu comentario! sou fa do Ciro! Temos algumas obras dele e muito melhor a amizade da familia!
Morando for a do Brasil fico feliz em ver que seu trabalho continua sendo apreciado!
E aproveito para deixar o PARABENS! Pois Ciro aniversaria amanha!
FELICIDADES!!!!
Sonia Nascimento