quinta-feira, 30 de abril de 2009

O Piauinauta no Karnak



Num dia "bonito pra chover" o Piauinauta sobrevoa o palácio de Karnak, sede do governo do Piauí, entre carnaubais, sob nuvens carregadas, pertinho do chão... É em dias de chuva que a poesia brota...

BOTAFOGUENSE





Edmar Oliveira

Embora me ache um realista a respeito dos acontecimentos em ocorrência no planeta, meus amigos me acham pessimista. Com certeza não sou um otimista por absoluta falta de crença no que a realidade me apresenta, e acho que o que chamam de pessimista não passa de um realista com os pés no chão. Mas não vamos aprofundar essa discussão. Concordo em ser pessimista, que fica muito mais próximo da realidade que o otimista. Este voa nos enganos das notícias. Só consigo voar nas asas da poesia. Mas não é disso que aqui se trata.

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Pessimista, turrão, desconfiado, um pé sempre atrás, um antepé em falso. Não tenho a confiança que o sonho se sustenta depois de sonhado. Tem algumas coisas que só acontecem comigo. Por exemplo? Tentar trocar uma carrapeta da torneira e o vazamento ficar maior. Daí perder um tempo enorme na tentativa de um conserto e ter que chamar o bombeiro depois. Não podia ter chamado antes o profissional competente? Mas não. Primeiro me desespero em fazer o que não tenho a menor competência: serviços domésticos. Trocar uma lâmpada, pra mim, se constitui na possibilidade de queimar o circuito elétrico ou deslocar o bocal da lâmpada para fora do local ideal. Só pioro as coisas. Um incompetente doméstico, esse sou eu. E embora essas coisas não se confessem assim de público, como me atrevo a narrar, me parece que há muitos de machos incompetentes nos afazeres de homem nas tarefas domésticas. E também de serem tristes e pessimistas, como me chamam por aí. “Não conheço ninguém que tivesse levado porrada, todos os meus conhecidos tem sido campeões em tudo” nos versos de um Fernando Pessoa, já desconfiado com esse assunto...

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Mas eu me descobri assim sem ser campeão em nada e apanhado muito da vida. E, surpreendentemente, um ateu convicto, sou supersticioso de fazer dó. O destino, o azar e o Sobrenatural de Almeida são muito mais reais que Deus nos desígnios dos acontecimentos. E devem existir muitos outros de nós por aí, mesmo que não confessemos de público. Senão não haveria torcida do Botafogo...
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quando postei,nem sabia se o Botafogo ganhava ou perdia, o que não muda nada...

enquanto dure

Climério Ferreira


A eternidade é decerto
O presente em sua glória
Todo futuro é projeto
Todo passado é memória

Graça Vilhena

faça de conta
que o amor
é copo d'água
basta-lhe a sede
e não o mar

Não!

Ana Cecília Salis



Não amo a morte...
Nem a espero calada.
Grito-a de raiva
E que me venha sem poesia!
Dá-me sossego
E me cala de vez!

Ou a ela peço guarida...

Porque nela me refugio
E me escondo
De, há tanto, cansada
E tanto mais
De ser covarde na vida...

DÍSTICO

Keula Araújo


Conheço minha terra pelo arame que a cerca.
Eu mesma varro meus terreiros.

Encontro

João Carvalho



A Fernando Pessoa
e Walt Whitman

de frente um para o outro
estamos aqui
despidos de toda mentira

não há mais nada a dizer

melhor é sair por aí
de mãos dadas
dançando o universo na alma

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João é poeta de Oeiras.

Um toque de chuva


Teresa Cristina


Da vida trago esse sabor de chuva
Que escorre nas telhas de minha casa...
E chove agora! Lavando os córregos
Dos caminhos que deságuam no rio...
As folhas das palmeiras verdes bebem
As águas frias a provar a tarde...
E um menino corre tal o vento
Dizendo que é rei de sua rua...
Estendo as mãos na biqueira grossa
E degusto também como as folhas
Da água que vem na tarde que expira...

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Esse blog tem dessas coisas. Recebi um e-mail de Teresa Cristina avisando que o poeta William vinha ao Rio. No final me mandava esta pérola. Não sei quem é. Mas se é amiga do William e poeta assim é bem vinda neste espaço sideral... Ah, e ela se assina "Flor de Caju", bela flor, já viram?

ovelha negra



Geraldo Borges




Faz não sei quantos
Mil anos
Que estou tentando
Viver
E não consigo.

E se me persigo
Faço parte
De um rebanho
Que não encontra
O seu abrigo.

Pois sou
Meu próprio
Pastor
Pastoreando
Meu perigo.

Folhas de Concreto



Eduardo Borges

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Minha cidade carnaúba

- um verde claro amarelo de vegetação rasteira

.

Minha cidade Rio

- O Monge Da Costa e Silva

.

Minha cidade angústia

- Geléia Geral

.

Minha cidade coluna

- uma avenida divide o norte do sul

.

Cidade Louca

- Meduna prisão esquecida

.

Cidade pouca

- faltam saídas para os descaminhos

.

Minha Teresina, a cidade avizinha

- ainda se escuta o apito da velha usina

.

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retirado de Sussuros, Eduardo Borges

humano



Ricardo Borges é jornalista, chargista, gravurista, contista e tem um site muito legal: Risco. Vale arriscar uma visita. Esse negócio de internet tem dessas supresas. Descobri outro sobrinho meu e do Geraldo Borges. Ricardo é irmão do poeta Eduardo.

Perfume de Resedá

Paulo José Cunha



(...)naquele tempo
a cidade ria
e acolhia o delírio de seus doidos de estimação
zé honório jaime-doido paca-preto nicinha
manelavião joaninha dondon
doidos respeitados e queridos
doidos mansos
bem assentados
na sala de minha avó
comendo pão com café
e contando histórias fabulosas

(vó sazinha filosofava
que deus nosso senhor
criara duas nações de gente
uma
a dos doidos mansos
premiados com o delírio de flutuar eternamente
em odor de santidade
outra
a dos normais
condenados ao horror da sanidade
até purgarem as culpas
atingirem a purificação
e assim ganharem o direito de voar sem asas)

daí o acolhimento e o respeito
que até hoje nutro às virtudes da doidice
e insisto com tanta determinação
na certeza de que um dia
todos os homens e mulheres andarão sobre as nuvens
pois eu mesmo
com o tempo e algum esforço
adquiri a capacidade de enxergar no escuro
e acreditar no moto-perpétuo
que meu pai perseguiu
na trilha aberta
por leonardo da senhora das dores castelo branco
entre ímãs rolamentos cálculos e engenhos
nas madrugadas de febre
solitário em seu delírio
para provar que o impossível
é apenas o que ainda não se fez acontecer(...)


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Edmar,

Te envio trecho do longo poema "Perfume de resedá", em fase de revisão final do projeto gráfico, e que deve ser lançado ainda no Salip, se Deus quiser. Cineas é meu editor. Projeto gráfico é do Amaral (cá pra nós, genial). Deverá ficar com mais de 100 páginas. É uma rememoração poética da Teresina do meu/teu/nosso tempo. Uma declaração de amor à cidade sempre tão querida, apesar da distância em que vivemos dela.


Pode usar no blog, se quiser. Abraços.

PJ

Invencionice

Edmar Oliveira



Voa
Andorinha de tantos verões
Verão em mim as marcas
Do que me cerca

A cerca que me limita nas cercanias
Da minha porção de terra em torno do nada

Eu não crio nada
Eu não invento nada
Personagens, paisagens, pensamentos, palavras

Sou inventado pelo que me cerca
Inclusive por ti...

CANDANGOS DO PLANALTO, UNÍ-VOS!



1000TON

O homem é um animal muito especial. Difícil arrumar um jeito de colocá-lo para viver em qualquer lugar: num cercado, numa gaiola, numa selva de concreto, numa pocilga ?
A cidade moderna, pós-revolução industrial, tem, relativamente, pouco tempo de conurbação existencial - cento e cinquenta anos, se tanto? Conurbação é o nome que se dá ao nó-nas-tripas, ou seja, um estrangulamento monstruoso do ir-e-vir, quando uma cidade se esparrama descontroladamente e engole pequenas vilas, lugarejos próximos a elas, e, até mesmo, outras cidades menores.
Os grandes aglomerados urbanos, no mundo inteiro, cresceram desmesurada e elefantinamente. Apesar de algumas experiências, o homem não se deteve ainda a pensar seriamente sobre o destino das futuras gigalópolis.
Ao longo da história alguns loucos, ou poetas da estética funcional urbana, tentaram bolar alguns viveiros para a espécie humana. É o caso de Le Corbusier, pseudônimo de Charles-Edouard Jeanneret-Gris talvez o mais famoso de todos, arquiteto, urbanista e pintor franco-suíço (1887-1965).
Esse senhor influenciou uma geração enorme de discípulos. Le Corbu, como também era conhecido, projetou várias “cinecittá”, não que ele fosse do ramo cinematográfico. Na sua concepção os meios de transporte, o trabalhar, os serviços, o verde, o comércio, a moradia, aliados a uma tecnologia altamente desenvolvida, supririam todas as necessidades do usuário das grandes cidades, como numa romântica produção hollywoodiana, estrelando: o homem e seu novo habitat.
A idéia de enormes arranha-céus, em concreto e vidro, monótona e geometricamente dispostos, exigindo equipamentos sofisticados (hoje em dia ecologicamente inadequados), tais como, super-elevadores e portentosa maquinária para manter a temperatura ambiente artificialmente confortável, não foi comprada nem pelo Velho Mundo do pós-guerra. Le Corbusier engenhou um plano completo para a cidade de Paris; aliás, o modelo serviria também para outras cidades do planeta, mas a Europa preferiu reconstruir suas velhas cidades, com apenas sutis retoques modernos, preservando-as e integrando-as ao seu passado orgânico-cultural.
Quem comprou a idéia foi o terceiro mundo: esperando alcançar um progresso utópico, tentaram esconder os dramáticos desníveis sociais existentes: “Um novo porvir” ou “Vamos começar tudo de novo como se nada antes existisse”.
Em virtude da grande influência francesa na cultura brasileira, aqui, dentre outros, Corbusier fez a cabeça de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, que tentaram implantar no planalto central do país, convocados que foram pelo Juscelino Peixe Vivo, a urbe ideal para o muderno cidadão brasileiro, sem diferença de classes – Brasília.
“Sobre a cabeça os aviões / Sob os meus pés os caminhões / Aponta contra os chapadões / Meu nariz / Eu organizo o movimento / Eu oriento o carnaval / Eu inauguro o monumento / No planalto central do país / ...” (Tropicália, Caetano Veloso).
Essas cidades modernas não ficaram, nem poderiam ficar imunes aos bolsões de pobreza espalhados pela sua periferia, eis que a plebe ignara, impedida de participar do convescote, foi chegando mais perto para catar migalhas e restos de comida. Os novos belos cenários da Urban Paramount Pictures não foram construídos para os bóias-frias.
Armadilha do destino: o deslumbrante sonho de JK, muito pouco tempo depois, a apenas quatro anos da inauguração da Novacap, em 1964, serviu de palco, digo, quartel de luxo para os milicos comandarem mais de vinte anos de truculenta ditadura militar, iludindo nosso povo com o milagre brasileiro, prato jamais servido na mesa dos brasileiros.
O nosso Macunaíma, como teria interpretado Brasília, se possível fosse escrever uma segunda “Carta pras Icamiabas”? Ele hoje, possivelmente, estaria andando a pé, não teria conseguido comprar nem uma Romi-Isetta, e, certamente, estaria morando numa Ceilândia, ou naquele lugar onde “Eu, Mato Grosso e o Joca, construiu nossa maloca...”(Adoniran Barbosa)
No seu livro, editado logo depois de pronta a Novacap, Niemeyer mostrava-se bastante angustiado ao ver os candangos, que ergueram aquela cidade Planaltina com o suor e o sangue do seu trabalho, não conseguirem nela morar. Quão ingênuo foi o nosso mestre!...Talvez não tivesse tido o tempo necessário pra pensar em matéria tão polêmica: DECIFRA-ME, OU TE DEVORO !
“Tá vendo aquele edifício moço / Ajudei a levantar / Foi um tempo de aflição / Eram quatro condução / Duas pra ir, duas pra voltar / Hoje depois dele pronto / Olho pra cima e fico tonto / Mas me chega um cidadão e me diz desconfiado / Tu tá aí admirado / Ou tá querendo roubar?”
(letra e música de Lucio Barbosa).
Cidades modernas no terceiro mundo não foram capazes de, por si só, resolver o grave problema da discriminação e das abissais diferenças existentes entre as castas sociais. O contingente dos sem-teto aumenta cada vez mais.
Outra ironia do destino: muitos asseguram que a atual crise econômica teve início justamente com o mercado imobiliário dos EUA. A especulação e o capital financeiro, assim como em outros setores, não podem comandar os destinos da cidade pós-moderna. Esta deve atender, sim, ao bem estar das pessoas que nela habitam. Os cidadãos deverão ter o direito de participar dos processos de intervenção, produção e remodelagem das cidades.
É por aí.

Fritz Lang











O Piauinauta homenageia Metropolis, de Fritz Lang. Não ter visto constitui crime de lesa cultura. Corra à locadora mais próxima.


Metropolis é um filme alemão de ficção científica produzido em 1927, realizado pelo cineasta austríaco Fritz Lang. Foi, à época, a mais cara produção até então filmada na Europa, e é considerado por especialistas um dos grandes expoentes do expressionismo alemão. O roteiro, baseado em romance de Thea von Harbou, foi escrito por ela, em parceria com Lang.

Enredo
O enredo é ambientado no século XXI, numa grande cidade governada autocráticamente por um poderoso empresário. Os seus colaboradores constituem a classe privilegiada, vivendo em um jardim idílico, como Freder, único herdeiro do dirigente de Metropolis.
Os trabalhadores, ao contrário, são escravizados pelas máquinas, e condenados a viver e trabalhar em galerias no subsolo. Em meio à miséria dos operários, uma jovem, Maria, se destaca, exortando os trabalhadores a se organizarem para reivindicar seus direitos através de um escolhido que virá para os representar.
Através de cenas de forte expressão visual, com o recurso a efeitos especiais, algumas se tornaram clássicas, como a panorâmica da cidade com os seus veículos voadores e passagens suspensas. Alusões bíblicas, mistério, ação e romance, completam o leque que envolve o público e o mantém em suspense até ao final.
À época, Metropolis impressionou tanto Hitler que, quando ele chegou ao poder, solicitou ao Ministro Goebbels que abordasse Lang, convidando-o a fazer filmes para o partido nazista. Enquanto Thea Von Harbou, sua esposa à época, mergulhou no projeto, Lang evadiu-se para Paris, onde chegou a produzir filmes de conteúdo antinazista, passando-se posteriormente para os Estados Unidos, onde faleceu.
A obra demonstra uma preocupação crítica com a mecanização da vida industrial nos grandes centros urbanos, questionando a importância do sentimento humano, perdido no processo. Como pano de fundo, a valorização da cultura, expressa no filme através da tecnologia e, principalmente, da arquitectura. O ponto alto do filme e grande mote é, sem dúvida, o final - onde a metáfora O mediador entre a cabeça e as mãos deve ser o coração! se concretiza no simbólico aperto de mão mediado por Freder entre Grot (líder dos trabalhores) e Jon Fredersen - o empresário.

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texto: Wikipedia


quinta-feira, 16 de abril de 2009

Piauinauta no Amparo

No belíssimo enquadramento de Patrícia Basquiat, o Piauinauta desceu devagarinho bem perto das torres da Igreja do Amparo para rezar a missa de domingo.


História do Pavão Mysterioso


Edmar Oliveira

Li num fôlego “Chão das Almas” de Moacyr de Góes (Editora da UFRN, 2005, mais de 400 páginas). O autor classifica seu livro como “Romance & História” de forma apropriada. São seis livros que começam na “Guerra de Princesa” (Paraíba / masculina / muié macho / sim sinhô), na revolução de 30, se desmancham na Intentona Comunista em Natal e chega na ocupação potiguar pelos americanos na Segunda Guerra. A narrativa vindo do sertão de Borborema, chega com as jangadas na barra do rio Potengi e faz a travessia marítima dos presos comunistas para Recife e, depois, Ilha Grande. Graciliano Ramos embarca no navio como personagem da narrativa.
Vários outros personagens reais da vida potiguar estão nas páginas do Romance, incluindo o camisa verde Câmara Cascudo e o próprio Moacyr de Góes. Pra mim esta é a forma apropriada de se contar a história, porque aqui ela já é tomada como uma versão apaixonada do autor. E Moacyr sabe contar a história do seu povo. E a história sai das páginas do romance junto com os personagens fictícios, que apenas emprestam mais argumentos à versão do autor, sem o hipócrita compromisso com a “verdade”. E o apaixonamento da alma é o melhor argumento de convencimento, superando, a meu ver, as gélidas análises sociohistoricidas – que mais assassinam os acontecimentos como se fossem frias páginas imbecis. Porque ao historiador, no futuro, o passado tem explicações claras e de fáceis compreensões (se assim tivesse acontecido)...
Por falar nisso (o historiador no futuro), os livros de “Chão das Almas” terminam no livro zero, quando o Pavão Mysterioso (clássico cordel popular) carrega em suas asas Bento e Inês para uma visão do futuro. Mostra aos comunistas a queda do muro de Berlim, o fim da União Soviéticas, a globalização e alguns problemas do século 21. Diferente do “historiador no futuro”, o Pavão Mysterioso só mostra as contradições sem conclusões historicidas.
Deliciosa narrativa que conta um momento importante no Rio Grande do Norte, “Chão das Almas” revela no fundo do oceano a história que forja o caráter do povo potiguar. As águas do Potengi tem na narrativa de Góes a revelação da alma de sua gente...
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Moacyr de Góes, no dia 27 de março último, fez sua viagem definitiva nas asas do Pavão Mysterioso e deve nos olhar lá de cima. Daqui mando um abraço apertado e carinhoso para Clara, escritora e psicanalista: menina, tenha orgulho do mestre e continue a escrever. Adoro seus textos.

Rio Poty


Geraldo Borges

O rio Parnaíba velho monge
E o Poty ninguém vai comemorar
Só o Parnaíba alonga ao longe
O rio Poty também tem seu lugar.

Lendas e mitos o rio Poty possui
É uma artéria no coração da cidade
Mesmo maltratado o rio ainda flui
O sol põe em suas águas suavidade.

No encontro das águas o rio cresce
E abraça o Parnaíba no Poty Velho
É belo este afluente ao entardecer.

O Cabeça de Cuia a noite reaparece
E a Maria que não ouvem conselho
Pode no último mergulho se perder.

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ilustração; "Cabeça de Cuia" de Cybelli Rocha, subtraído da página da Fundação Monsenhor Chaves

Etéreo


Eduardo Borges



A angústia não tem

pêlo nem olhos

ela rasteja entre nossos

pés como areia

movediça
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O menino é sobrinho meu, por um lado, e do Geraldo Borges, por outro. O Piauí é assim: todos filhos da irmã de Mandu Ladino...

Poty versos Parnaiba



Geraldo Borges


Teresina é banhada por dois rios: o Parnaíba e o Poty. Ninguém se dá conta, hoje em dia, que o rio Poty, em relação a capital tem tanta importância sócio cultural quanto o rio Parnaíba, a nível local do município talvez tenha até mais. Provavelmente porque suas duas margens estão dentro da cidade. E o dito rio carrega a lenda: O Cabeça de Cuia,.que está ligada a comunidade de pescadores, e que já faz parte da nossa literatura, de nosso cordel, da escultura, da oralidade do povo piauiense.
O Encontro das Águas dos dois rios formando uma forte represa na sua embocadura tem sido um convite maravilhoso para atrair turistas.
Outra grande referencia histórica transfigurada pela imaginação cristã que margeia o rio Poty é o episodio trágico da morte do motorista Gregório. Uma das ribanceiras do Poty ganhou justamente no local onde se deu o sinistro assassinato de Gregório um monumento com uma cruz. Ali o povo humilde e crente deposita seus ex-votos e velas. O hospital Meduna também a margem do Poty é testemunha das grandes loucuras deste mundo, uma grande obra feita pelo dom Quixote Clidenor de Freitas Santos.
Na década de 1950, o rio Poty vivia encolhido no fim da cidade, mais corrente, com suas quintas cheias de cajus, com camarões pitú abundantes nas locas,. suas piabas cor de prata, que, às vezes, saltavam dentro das canoas dos pescadores. Fartura era muita. Nesse tempo o rio servia de recreio dos moleques, que mergulhavam em suas águas tépidas.
Tinha apenas uma ponte de madeira ligando o centro de Teresina ao outro lado do rio, que nos levava a Socopo. Um pequeno lugarejo. Mais tarde a cidade cresceu, atravessou a ponte, que teve de ser feita de novo com cimento armado para poder passar, sem risco, os carros. Com a chegada de Don Avelar, o Jóquei cresceu, e o rio Poty começou a ser visto pelo lado de lá. Pontes e mais pontes foram construídas para passar o progresso. A ponte do Poty Velho, a ponte da zona norte que vai para a Universidade, a ponte que fica a altura da Ilhota, e muitas outras que estão no mapa da cidade, é só verificar.
A cidade já esteve longe do rio Poti, como se pode ver. Onde hoje é a Assembléia dos Deputados, o Centro de Convenções, Tribunal de Justiça, e outros prédios oficiais, tempos atrás, mais ou menos, na década de sessenta, tudo era mato na beira do Poty..
Quando menino eu caminhava quarteirões e mais quarteirões com outros colegas, entrava por dentro do mato até chegar ao porto do Gregório, onde íamos tomar banho. Nesse tempo ninguém falava em poluição, pelo menos em Teresina, que era permeada de paisagens rurais. E ainda não estava enlouquecida com o progresso. Não sei se ainda existem crianças, meninos, que se ariscam tomar banho no Poty. Pode até ser. Pois criança não é gente. Muita gente já não come mais as suas piabas fritas, nem muito menos cozidas, alegam que elas se nutrem dos excrementos despejados nas bocas dos esgotos. Bem. São criaturas bastante delicadas. Nunca viram cu de cotia assoviar meio dia.
O Poty, pior do que o Parnaíba, está ameaçado a virar um esgoto, pelo menos na área do município de Teresina, se não for cuidado com todo zelo pela sua comunidade e pelos políticos que com certeza banharam em suas águas quando meninos, brincando de galinha gorda e dando canga-pé. Se não cuidarem vão perder o Encontro das Águas, esta vista maravilhosa na antiga vila do Poty. Além de alguns bares atraentes que acolhem boêmios em tardes de domingo ao por do sol.
O rio Poty é mais piauiense do que o rio Parnaíba, embora ambos sejam da União. Por isso mesmo temos mais responsabilidade com ele do que com o Parnaíba que pertence também ao Maranhão. Ele corre no centro da nossa capital, ou melhor, está parando, pedindo socorro. Caso não lhe atirarmos uma tábua de salvação, nem mesmo o Cabeça de Cuia, se ainda não tiver comidos todas as Marias Virgens, vai agüentar se esconder nas suas águas poluídas.

Palavrar...

Ana Cecília Salis


Se palavro, é porque não suporto o silêncio.
Se me calo, é porque sou avessa a ruídos...

Queria me encolher nas palavras...
Queria enxugar-lhes o sentido último...
Apenas àquele que me faça diminuta,
Ou o que me explique um passarinho...

Queria entregá-las a ouvintes fiéis...
À ouvidos desprovidos de corpos
Trôpegos
Vacilantes
Corpos bêbados de desejos e de equilíbrio...

Se palavro, é porque não me suporto em silêncio
Porque não me basta olhar...
Ou porque, simplesmente, não me posso despalavrar.

Palavro, porque meus pulmões inspiram
Porque meu corpo é morno
E porque não consigo exauri-lo...

Palavro, porque busco a cilada dos motivos...
Justos...
Piedosos...
E também os impuros...

Palavro, porque sou vil...
Porque sou Santa....
Ou porque não sou nada disso...

Palavro, porque não quero falar...
Porque cansei de enfeitar-me à boca
Para tentar me explicar...

Palavro, porque me assusto...
Porque me sinto só...
Porque de mim, não me curo.

Palavro, porque teimo,
Insisto e quero...

Palavro...
Porque te procuro.

Histórias do Conciliábulo

Edmar Oliveira




Além dos motivos afetivos que me levam ao Piauí todos os anos, tem também o motivo de colecionar histórias piauienses. Em Teresina, a confraria conhecida como Conciliábulo - que se reúne aos sábados e domingos no bar do Chicão - é o cenário propício para se contar histórias e beber cerveja. Sempre que estou na terra vou ao Conciliábulo para rever velhos amigos e pescar algumas histórias para a minha coleção.
Desta feita, o Tadeu me mandou estas duas pérolas. A primeira, jura o Tadeu que é a mais pura verdade, conta o causo de um teresinense ilustre, modelo de virtude e nata da alta sociedade, já na velhice com todos os filhos “bem criados”. Tadeu cita, entre os filhos do ancião, um deputado conhecido, um médico e um delegado de polícia. Pois bem, o ilustre cidadão, que durante toda a vida fora modelo de virtude, na velhice deu para ir à zona quase todo dia e à tarde, que o velho dormia cedo. E aquela mudança de comportamento estava deixando toda a família em situação vexatória. A vizinhança já tava comentando nos bares da redondeza e na padaria da esquina. O filho mais velho convocou uma reunião familiar para discutir a questão e encontrar uma solução. E assim abriu a reunião com toda a família presente: dizia ele que a situação estava insustentável, que a sua mãe já estava constrangida e que o pai tinha que ser mais comedido nas incursões ao baixo meretrício. O discurso moralista corria solto como uma reprimenda ao comportamento do velho, quando esse interrompeu o nobre deputado:
- Vocês conhecem a mãe de vocês?
Silêncio no recinto. O velho continuou em tom imperativo, como costumava ser:
- Conhecem nada! A questão é que aqui em casa tá uma sovinice de priquito que é um caso sério!
Silêncio e encerrada a reunião familiar com cada membro indo procurar o que mais fazer...




***
A outra história do Tadeu veio de Oeiras, sua terra natal. Oeiras é famosa por seus músicos e seus loucos, o que, alguma das vezes, vitima o mesmo cidadão. Conta o Tadeu que numa vez chegou à cidade um paulista que toda semana faturava uma moça da alta sociedade. Todo fim de semana o estrangeiro comia uma nova moça oeirense. Pois bem, a situação era insustentável e uma comissão de senhores da terra, depois de deliberar a questão, foi ter com o delegado exigindo uma atitude em defesa da honra dos cidadãos oeirenses. O delegado disse, para a perplexidade de todos, que não podia fazer nada, que não constava que alguma moça tenha sido forçada, que parecia que elas, de bom grado, aceitavam o assédio do estrangeiro. Mas, prosseguia o delegado, ele próprio concordava que alguma coisa tinha que ser feita. Encarando todo mundo, perguntou se não tinha homem entre eles, deixando no ar a possibilidade de vingança.
- Ter tem - respondeu ligeiro um cidadão – Mas ele num quer não. Ele gosta mesmo é de mulher...

revelação

Graça Vilhena

No corpo da noite

o silêncio é cicatriz

à luz de velas

meus olhos velam tua ausência

doem com os barcos

tristíssimas velas

no horizonte do meu quarto

Casablanca

Edmar Oliveira

Meus olhos em águas de te ver partir
Enevoam tua imagem na minha lembrança
Te quero amiga sem te ver sofrer
Te quero sempre sem poder te ter
Conservo teus olhos nos olhares meus
É por ti gostar que te quero embora...
Embora chore por não ter-te amar-te amor-te morrer
Nos versos do poeta triste

MACACOS DE IMITAÇÃO

1000TON
























Da sua americana senzala o negro ouvia o branco tocando música clássica no casarão da fazenda de algodão, down mississipi vale. Escutou, elaborou , encucou e devolveu, graças ao senhor, o jazz pra o mundo. Bem longe das suas origens, adotaram Moisés nas suas lamentações, ”Let my people go”, correndo atrás da terra prometida, uma dobradinha patético-atávica, branco judeu com preto africano, derramaram-se em spirituals e gospels.
Regado a muito uísque de milho, nos velórios, os crioulos batiam palmas ao som de uma música freneticamente lamento triste. Davam as boas vindas a seus mortos, na entrada para uma boa-vida, no além, longe das chibatadas no lombo, esquecer para todo o sempre os fardos pesados de algodão, branquinhos, branquinhos, levados em jornadas de 18 horas diárias nas lanhadas costas. Lá isso depois de estafante colheita, da fazenda para o porto, depois do porto para as barcaças. Fucking good, man! É ou não é para se comemorar?
Ah! Moon Light Serenade, o bom da guerra é o Glenn Miller. Sua swing band tocava pra os soldadinhos americanos na segunda guerra, e ele deu a sorte de não morrer em combate, e, sim, num prosaico vôo entre Inglaterra e França, desapareceu em 1944. Ainda bem... Não precisou nem saber do massacre em 1945, Dresden, Alemanha, a 100 quilômetros de Praga, Tchecoslováquia. Com a guerra ganha, as facínoras forças aéreas americana e britânica destruíram, não deixaram pedra sobre pedra, aquela belíssima cidade histórica, só para mostrar para o mundo o seu gigantesco poderio bélico. Tem-se notícia de que os bombardeios mataram mais de 30.000 civis, numa cidade sem absolutamente nenhuma resistência militar organizada...
Vinte e cinco anos depois, o deus que re-re-inventou a guitarrrrrra (deu até reverberação na palavra) elétrica, Johnny Allen Hendrix, Jimi Hendrix, o cara, denunciou na sua uterina guitarra, em Woodstock, o horror show que foi a guerra do Vietnam: distorcendo o hino nacional americano com todos os recursos esporrentos de pedais e amplificadores, esse crioulo cidadão mimicou, na sua metralhadora sonora, os macabros sons das bombas assassinas derramadas pelos bombardeiros aéreos.
Budy Holly, branquelo azedo, caixa d’óculos, pediu licença para tocar com a crioulada, nos clubes onde a maioria era black, só assim pôde mandar bem o seu rock P&B calibrado.
Chuck Barry nem pediu licença nem nada, nem pros da sua cor, eruditos das jazz band, que olhavam para aquele irmão meio atravessado, se rebolando muito, muito saliente no palco, e desrespeitando a sublime sonoridade de um instrumento, que um dia, lá para mais antigamente, um cigano chamado Django Reinhardt a dedilhava com rara maestria. Parecia a guitarra fazer parte do seu corpo, feito um prolongamento anatômico do seu coração-braço-mãos.
Mas Chuck chutou o balde direto mandou o seu rock rascante-gutural, arranhando a sua rebelde guitarra e a branquelândia adorou, requebravam-se, lotavam os bailes e chôus. /Trabalha, trabalha, nego/ trabalha, trabalha, nego/ nego tá moiado de suó/ as mão do nego ta que é calo só/...de tanto tocar guitarra pros brancos. Daí o neguinho foi ficando rico e mandou construir uma puta mansão, com bosque e tudo, além de um mega estúdio de gravação, só seu, por onde passaram, dentre outros pop-stars, Keith Richard, dos Rolling Jagger Stones.
Renato Barros, do renato e seus blue caps, ouvia rock lá de fora, formou sua primeira banda no subúrbio do Rio, em Piedade, Senhor, Piedade. Só tinha um preto no conjunto, o saxofonista e voz, Cid, que sobrou do antigo conjunto, e ainda canta com os caras até hoje.
Os Beatles (eu sou neguinha?) tinham um xacundum marcante, combinação de batida perfeita de guitarra, baixo e Richard Starkey. Já o nosso Renato, ouvindo os ingleses, e não sabendo direito como eles tocavam, pegou su
a guitarra, e tirou um xenquendem, maravilhosamente brega-suburbano-tupiniquim, que passou a ser sua marca registrada e influenciou vários músicos da jovem guarda, além de sua voz, maciamente puxada para os tons mais agudos, que virou inspiração para grande parte dos iê-iê-iê cantores da época. Claro que não podemos nos esquecer do irmão baixista do conjunto, o Paulo Cesar Barros, aquele que overdosava, musicalmente falando, o baixo Hofner do Paul Mc Cartney, tornando as versões musicais dos Beatles mais sofisticadamente atraentes.
Lá em cima eu falei de um crioulo que se deu bem nos states e agora vou falar de um outro crioulo, aqui da brazuca, artista que ainda precisa dar um duro danado pra comer o seu angu de cada dia. Ele se chama J. César, guitarrista negro dos The Pops. Merece aqui destaque, porque domina o instrumento como ninguém, toca divinamente e foi o seu maior virtuose na época em que ainda conseguia gravar. Devemos lembrar também de dois outros excelente s guitarristas: Gato (branco) dos Jet Black’s e do Risonho (branco) dos Clevers, que depois virou Os Incríveis.
Passando um pouco ao largo do nosso rock, por aqui, pelos 60’ o Noite Ilustrada mandava: “/ O neguinho gostou da filha da Madame / que nós tratamos de sinhá /...” E o Black Out mandou:”
/Chora, dotô, chora / eu sei que o medo de ficar pobre lhe apavora/...”
Quando chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor, o tio Sam conheceu a nossa batucada, levou a Carmen Miranda pra lá e inventou o samba rumba, que misturava Miami com Copacabana. Don Costa, misturou chiclete com banana, e deu uma piel canela legal, tingindo de dolente Caribe as jazz bands americanas. Nosso Severino Araújo chegou junto com
sua magistral orquestra e fulminou o mundo com seu samba-gingado-jazzeado
E do bolero veio o samba canção, e veio a bossa nova dos filhinhos de papai brancos da zona sul. Maisa Matarazzo ouviu Julie London, Cry me a River, que ouviu Billy Lady Day Holiday, as três amarradas num porre só...

TUDO VEM DO NEGRO
BLUES, FUNK, SOUL
TUDO VEM DO NEGRO
SAMBA, JAZZ E ROCK’ N ROLL (da autoria de Manuel Branco)

Zum zum zum zum zum zum, capoeira mata um. E mata torcedor de futebol do coração também. Inventado pelos ingleses, veio pra cá, e só era jogado por brancanas. Os brancos bacanas. O nobre esporte bretão não era para pobretão brincar, ainda mais sendo um crioulinho qualquer... Quem muito contribuiu par mudar isso foi um seu manuel ou joaquim, português dono de armazéns de secos e molhados, que não é burro nem nada, p’gou uns cr’oulinhos pra jogaire vola e Angola, sim, o jogo da bola ficou muito mais criativo, cheio de ginga e picardia. CAPOEIRA + FOOTBALL = malícia bailarina de lidar com a esférica dos domingos da guia, dos diamantes negros, dos zizinhos, dos didis, dos garrinchas e dos pelés. E BIBA O BASCO! Apesar de rubro-negro roxo, tenho o dever de reconhecer que os mesmos portugueses, nossos antepassados brancos europeus, dizimadores dos nossos pais índios, e escravizadores dos nossos pretos africanos, num laivo de justiça histórica, tardia, mas oportuna, são esses mesmos que, agora, alforriaram a negrada saliente, soltando-a num retângulo gramado de verde. É pouco, é muito pouco sim, a sociedade, o sistema deve muito, mas muito mesmo a esse povo. O Mike Tyson, que não é nenhum sociólogo metido a besta, falou o seguinte uma vez, presumo que não com essas mesmas palavras: “O que a sociedade deixa a gente fazer, a nossa gente faz, e faz muito bem, e até se supera. Já pensou se os brancos nos deixam chegar a posições mais dignas? Eles não são bobos, não... Se eles deixassem, sabem que a gente ia engolir eles todos!


TUDO VEM DO NEGRO
CAPOEIRA, FUTEBOL E BATUCADA
TUDO VEM DO NEGRO
DANÇA, MACUMBA E CONGADA

Na arte, no campo subjetivo, na música, a cor da pele não tem cor humana, é apenas pictórica, como tintas numa pintura. A cor da pele não impõe restrições, não impõe lim
itações. O ser humano, vestido e protegido por essa pele, tem corações e mentes envolvidos em doar, em criar, em se manifestar, em sofrer e regozijar, transmitir, ligar, sintonizar.
Aumente agora o volume do seu rádio e preste bem atenção, escute bem o que você está ouvindo lá fora. Ouça a crise. Não, não estou falando do noticiário, que teima em mostrar que os bacanas sacanas estão topando o desafio. Balela!...
Estou falando é do barulho de gente, de multidão, de cidadãos nas ruas, entendeu? De trabalhadores, de desempregados de jovens que precisam de uma profissão. Isso sim ! Não pode ter mais essa de querer salvar banqueiro e impor restrições aos países pobres não.
O G-20 acabou de se reunir agora. Tudo bem...O nosso Lulinha pau-de-arara-paz-e- -amor fez bonito ? Fez sim. Saiu bem no filme? Saiu sim, gostei, e me amarrei na provocação, na cutucada nos branquelos do norte azul. Agora, meu irmão, para que dessa vez não seja feita só uma maquiagem disfarçadora de uma crise seríssima, um colapso mundial, não basta esses escrotos se reunirem e vomitar: Ah! Precisamos acabar com os paraísos fiscais! Papo furado...
Essa nova guerra tem uma fronteira enorme e bem delimitada. Vamos falar sério. São os brancos do norte azedo contra os mestiços subjugados aqui do sul. Essa, a gente vai levar? É desenvolvimento humano agora ou nunca! Dessa vez não deu para disfarçar mais, a máscara se esborrachou no chão...Essa lógica neoliberal não existe, nunca existiu, o fracasso foi total. Fim. Acabou.
BRANCO é o poder que eles têm, não a cor da pele. Assim não dá mais.
O poder tem, de qualquer maneira, que ficar COLORIDO.

ZUNZUNZUM (apoteose)


Juarez Montenegro


Vi-a em plenitude e ao relento,
entre flores, no auge da beleza,
ao enfoque mordaz do sentimento,
num píncaro sem par da natureza!

O Resplendor exposto num momento
de luz, inspiração e de grandeza,
ao vôo de altaneiro pensamento,
ao salto que estonteia a correnteza.

A sós pousava, plácida quimera,
somando-se ao floral da primavera –
artístico jardim da cordilheira.

Cheia de si e de privacidade,
num clima para o amor ou pra saudade,
despida e sem a folha de parreira!


_____________

mais um "bilaquiano" de Juarez. Ilustração Paulo Moura.

resenha: LONGE DAQUI





Luíz Horácio


Paciente leitor. Quantas vezes você já se deparou com a história de personagem que empreende determinada jornada, pouco importa o motivo, e nessa caminhada encontra uma miríade de tipos esquisitos, exóticos, estranhos, bizarros? Quantas? Tudo isso! Não, cinema não vale, fiquemos apenas com a literatura. Pois é, mesmo assim é uma fartura e tanto.
Longe daqui, livro da americana Amy Bloom, grosso modo, é isso. Ao examinarmos detidamente duvido que você, criterioso leitor, não chegue a essa mesma conclusão.
Cenário: Estados Unidos, década de 1920.
Trama:Lilian Leyb, abandona a Rússia depois de ver sua família-pai, marido e filha- massacrada. Parte em direção a América, de onde sempre lhe chegaram histórias livres de miséria, desembarca em Nova York e percebe que a realidade não tem muito a ver com o que escutara. O paraíso ainda estava um pouco além. Afora as dificuldades para conseguir emprego decente e os obstáculos da estranheza da língua, Lilian era constantemente atormentada pelas lembranças da filha Sophie. Até o dia em que recebe a visita da prima Raisele trazendo a notícia que sua filha não está morta. Fora salva por um casal vizinho e levada para a Sibéria. Lilian decidi partir ao encontro de Sophie. Reencontra a realidade de sofrimentos, com a qual já tinha considerável intimidade.
O paraíso mudara de endereço, Sibéria.
Antes de iniciar a viagem de volta Lilian passa por situações trágicas, patéticas,engraçadas, experimenta de tudo. Tais episódios são na verdade protagonizados pelos coadjuvantes que no transcorrer da trama invertem os papéis e o leitor, avesso a monotonia, aguarda a aparição dos personagens “esquisitos” que manterão o insistente Morpheu longe de sua poltrona, persistente leitor.
A cena inicial lembra o início de um sem números de filmes de faroeste onde malfeitores atacam a propriedade, o rancho, de pacato cidadão, antes de matar sua mulher e filha, abusam sexualmente de ambas, em seguida queimam tudo. Quando o homem retorna, geralmente ele está consertando uma cerca, se depara com a desgraceira. Pronto; nasce um justiceiro. Sai então à caça dos facínoras.
Pois bem, cinéfilo leitor, Longe daqui é o mais puro de já-vu, literário, cinematográfico, o que preferirem.
Trata-se de uma singela literatura popular e não há nada de nobre nisso, nós que costumamos massacrar Paulo Coelho, devíamos prestar a devida atenção ao que nos chega de além oceano.“E perdida ali, uma pena dourada numa terra muito, muito estrangeira. Sempre foi assim: os melhores grupos são constituídos por pessoas cheias de problemas.” Você acabou de ler a abertura de Longe daqui. Pena dourada!!!!!!!! Nem nosso mago mor alcançou tamanho requinte. Além de não acrescentar a mais módica pitada de consistência ao nosso panorama literário ainda impedem a edição de autores tupiniquins. É de chorar.
Mas não desanime, caro leitor, pegue seu exemplar e continue em busca de argumentos que “me derrubem.” Tentarei dar uma mão.
Voltando à trama. Lilian chega a Nova York, traz algumas frases decoradas, em inglês, que utiliza conforme a situação. “Muito bem, obrigada”, em caso de a pergunta contemplar sua saúde. Ao perceber na indagação as palavras costurar, traje ou trabalho; a resposta memorizada será “Sou costureira -meu pai era alfaiate”. Em situações onde não entenda o questionamento apelar para “Freqüento a escola à noite.”
Sem muito esforço, Lilian consegue a vaga.Passa a trabalhar como costureira num pequeno teatro. Acaba se envolvendo com o ator principal da companhia, Meyer Burstein.O rapaz, no entanto, se amarra em rapazes e costuma freqüentar ambientes pouco recomendáveis onde deixa fluir seus anseios homossexuais; “buracos” entre bancos e arbustos de parques são os cenários preferidos. Lilian também divide sua cama com o pai de Meyer, o senhor Reuben.
Mas permitam voltar à fila do emprego, antes de Lilian conseguir o trabalho de costureira.
A autora descreve o ambiente e uma gama de personagens “estranhos” que se você, detalhista leitor, antever um circo não se condene. Lilian sorri para umas crianças e ao passar pelas mulheres que as acompanham sente que “elas fedem a azar.”
A seguir, de enrubescer o nosso mago. “Lilian tem sorte.Foi o que seu pai lhe disse; disse isso a todo mundo, depois que ela caiu no Pripiat duas vezes e não se afogou nem morreu de pneumonia. Disse que ser inteligente era bom (e Lilian era inteligente, afirmou ele), que ser bonita era útil (e Lilian era bastante bonita), mas ter sorte era melhor do que as duas coisas juntas. Esperava que ela tivesse sorte a vida inteira, e ela vinha tendo, até então. Ele também disse, você cria a sua própria sorte, e Lilian pega a mão de Judith, a única moça que conhece, abre caminho bem no meio da multidão e vai até a frente.”
Não estou a defender Paulo Coelho, mas a vilania deve ser devidamente fatiada.
Pois bem, enquanto o tempo de Lílian é dividido entre máquinas de costura e a cama que a acolhe os Burstein, ora o papai, ora o filho; e alguns pesadelos com a filha Sophie.
Transcorria nessa toada a vida da “sortuda” Lilian até que um belo dia, sem avisar, sua prima Raisele aparece trazendo a noticia de que Sophie vive.
Amy Bloom carrega a mão na descrição, a mesma mão pesada preenche com tintas graves os contornos do sentimentalismo; não bastasse o fato de colocar o leitor diante de uma mãe em desesperado ir e vir, num primeiro momento a procura de um sentido para refazer sua vida e a na seqüência a partida na tentativa de reencontrar a filha.
Pai e filho não dão a mínima importância a sua decisão, apenas Yaakov Shimmelman, ator e dramaturgo que acumula a função de alfaiate lhe concede ajuda. Ela costureira, ele alfaiate, se unem, costuram, psicanalistas, o prato está cheio.
Frase de Yaakov, sua mulher e seus filhos estão mortos: “- Antes - diz ele -, quando estava vivo, eu era um idiota.Agora sou o belo cadáver.Sou o cadáver que valsa.Você sabe.”
Ajudar Lilian será a última boa ação de Yaakov. “Depois que ela parte, ele pára de cantar no Royale, pára de cantar de implicar com Reuben, pára de debochar de Meyer. O cansaço de Reuben é o seu próprio, as mentiras de Meyer são as suas próprias, os crimes e os erros de julgamento do mundo são os seus próprios também. Ele estende toalhas na beirada da banheira, para o caso de espalhar água. Empurra a poltrona pesada , imprensando-a contra a porta da frente.Entra na banheira quente, tudo arrumado no tapete ao seu lado, e desta vez não há Reuben algum para pescá-lo dali.”
Atento leitor, está lembrado que falei de certos coadjuvantes que roubavam a cena?
Desse modo, sempre com bastante espaço ao melodrama, Lilian vai de trem até Chicago, com direito ao mundo cão de Seattle até alcançar o Alasca. Percebe-se a partir desse momento resquícios de tensão psicológica nesse vaudeville travestido de drama. Mas não se entusiasme, desgraças outras virão à tona, Amy exagera, torna a viagem de Lilian um pesadelo para o leitor. Recomenda-se não ler em viagens aéreas, aqueles saquinhos plásticos não darão conta do enjôo causado.
E Sophie (que jamais saberá que foi adotada que sempre vai se lembrar de Lilian como a prima sorridente de cabelos escuros que lhe deu um cachecol de lã azul) estava lá.
Sophie é o coração da vida de Rivka Pinsky; ela é a jóia de sua mãe, escondida e imerecida.Cresce como Tatiana Bugayenko, uma atéia, uma Pioneira Vermelha.....
Paciente leitor, você tem em mãos Longe daqui uma salada russa temperada com homossexualismo, desgraça, judaísmo, ateísmo, perseverança, uma personalidade opaca, sonhos, pesadelos. Decida-se pelo tema, ande até sua estante, escolha um outro livro.
Aproveite seu tempo.





TRECHO

TODOS OS PECADOS COMEÇAM COM O MEDO, e Raisele está doente de medo; talvez tenha errado os cálculos, sua esplêndida aventura talvez termine antes mesmo de começar, talvez acabe apenas com uma fração daquilo que veio buscar. Raisele cai de joelhos, puxando para si a mão livre de Lilian.
-Sophie está viva - diz Raisele. - Ela está viva.
E depois desmaia.

Lilian põe Raisele na cama e esvazia a banheira.Não importa que Meyer ou Reuben venham esta noite, ou quando, ou qual dos dois, ou se vierem ao mesmo tempo, cara ou coroa, podem tê-la aos turnos no chão da cozinha.
Lilian se deita na cama ao lado de Raisele, que jogou a camisola no chão e dorme nua, enroscada do seu lado, os braços cruzados sobre o peito. Está quente como um forno. Lilian respira fundo para se acalmar, e sente o cheiro de sua mãe ao seu lado, suor e cebolas verdes e o odor queimado, lembrando nozes, de grãos de trigo sarraceno sendo jogado de um lado a outro da frigideira num arco marrom perfeito e indiferente. A cama subitamente se enche dos mortos de Lilian, e Raisele rola para o meio deles, e coloca as mãos nos ombros de Lilian. Diz em seu iídiche leve e ceceado, “Devo contar?” e conta, sem esperar.
Em sua maioria, as famílias fugiram para oeste, à exceção dos Pinsky. Os Pinsky cortaram caminho pelo quintal dos Krimberg, encaminhando-se para a estrada a leste (o que Raisele não diz é que deviam estar procurando por qualquer coisa que pudesse ter sido deixada para trás, procurando levar da casa de seus vizinhos quaisquer sobras que as outras pessoas não tivessem podido carregar). Encontraram um pequeno monte enlameado perto da casa de Lilian, junto aos degraus do galinheiro. O monte era Sophie, sangue e sujeira na barra da camisola, os pés salpicados de cascalho, e Mrs. Pinsky, que tinha enterrado três bebês, disse a Mr. Pinsky que os Leyb estavam todos mortos, que eles tinham que levar a criança consigo para a Sibéria e que não ia ouvir uma negativa. Kachikov, o policial, me contou tudo isso, diz Raisele.

AUTORA

Amy Boom é autora de dois romances e dois livros de contos. Foi indicada ao National Book Award e ao National Book Critic Award e teve contos publicados em diversas antologias. Colaborou com revistas como a New York Times Magazine e a Atlantic Monthly,entre outras. Vive em Connecticut e leciona na Universidade de Yale.

Desmanchando

Al Munsif Al Mizghani (poeta tunisiano)





A mulher adiciona açúcar e mexe


O desejo mexe dentro do homem


Ele se esquece do açúcar.


Ele se lembra que se desmanchou numa deliciosa mulher...

A CRÍTICA LITERÁRIA BRASILEIRA


SILAS CORRÊA LEITE

Para o Mestre Fernando Jorge

A Nova Crítica Literária Brasileira, às vezes nem é nova (pelos ranços e vitupérios arcaicos), nem é crítica (pelo exercício bocó da dialética imediatista do esculacho janota e boçal) às vezes sequer é literária, quer pelos devaneios de pseudos-jecas pops ou por algumas mesmices de trivialidades engodadas por certos cacarecos de organdi, ou, ainda, pode ser apenas e só isso: brasileirinha. E ainda, sorry, casca grossa e sem seca. Uns têm nome, outros inventam poses, há os que, rançosos, desqualificam uma estréia sazonal, e ainda há os que, por inveja (boa ou má), injetam venenos por causa de frustrações adquiridas, já quem não têm um merecido sucesso e permanecem neomalditos, independentes daqueles clubes de esquinas, de clubes de egos, de testes de sofás e até periféricas oficinas que mais rotulam e vendem peixe de fim de feira do que enobrecem o filão tão propenso a tolos de ouro e vice-versos.

A Nova Crítica Literária Brasileira, coitada, tem patetas de ocasião, cariocas postiços, gaúchos saradinhos, paulistas alocados e mais algumas mineirices de intelectualidades masturbatórias e, pajelanças Leminskianas. E ainda existem outros. Caetanear, por quê não?. A crítica literária brasileira apanha de relho alhures e fica paradoxal: gosta de dar vexame, chuleia citações, agasalha pandarecos e, no final, alardeia uma saideira para todos, até porque ninguém é de ferro, e, depois da tempestade vem a leptospirose.

A Nova Crítica Literária Brasileira cheira a sabão de cinzas. Mas os cueiros estão cheios. Pensa que pensa. Acha é o que não é. Ora, nossa crítica babaquara é bananeira que já deu goiaba, mas, ainda assim, no tear do imaginário impúbere, troça, troca, erra e faz-se singer em roca errada. Saravá, Caio Prado.

A Nova Crítica Literária Brasileira só tem um eventual (e ordinário) verniz novo, laca laica, pois todos beberam - como nosotros - em mágoas paradas; salutar seria se fosse pelo menos serena, crível, polida, e tivesse algum mimo no trato com as ordenanças do chamado rigor formol. Mas nem isso. E para ser um puta roqueiro, cara pálida, tem que se ouvir Pixinguinha primeiro.

A Nossa Crítica Literária Brasileira - perdão, leitores - cheira sovaco vencido de sauro-rex (espécie em extinção), é polêmica pela própria natureza; navalha afiada no enfoque pseudoerudito, bodoque de citações, mas depois dá bom-dia a cavalo, sobe no pau de sebo e, baba baby, atravessa canteiros & e cardumes. Pior, literalmente pisa na bola, magôa. Tudo isso, não com estilo, mas com “estalo”. Só que, sendo polenta fria/ardida, vende, ventila, aparece, faz limonada sem limões, de tão azeda; quase curtida em antro próprio.

A Nova Crítica Literária Brasileira quer ser o que não é. E quando é, aqui e ali, vá lá, vale quanto pesa. Entra na técnica, no estilo, no criar propriamente dito, não viça tecendo loas ao inusitado, ou comparando lesmas com resmas, mormente porque, o crítico não tem que gostar da obra analisada, mas gostar, claro - óbvio ululante - de ser Crítico. Simplesmente isso. Ou não tem nada a Ler. Nem a SER.

A Nova Crítica Literária Brasileira adora espaço novo, adora autor novo, adora alguém vencedor. Fermenta entre avencas. Dá o drible da vaca no texto em si, e cai na gandaia de acionar uma metralhadora cheia de lágrimas (ou purpurinas mal resolvidas), atirando em tudo quanto é alvo, piorando quanto acerta mitos, totens, raízes, pilares. Paraná? Rio Grande do Sul? Santa Catarina? Sai de baixo! Desse eixo ninguém pode ser bom, que altera ânimos, atiça bezerros desmamados de éticas e com/Vivências. Cá entre nós, companheiro, se cada vez que alguém faz sucesso, ocasional ou só mesmo por acidente de percurso de destino, o circo pegar fogo, vai ser um desmanche artístico-cultural total. Coisa que as sensatas tradições gaúchas não fazem. Valoram bem e tudo. Faz sentido. Ainda bem.

A Nova Crítica Literária Brasileira, principalmente aquela bem pamonha que se nutre da mídia (e do open doping da mídia) no saturado eixo Rio-São Paulo, ignora os brasis varonis gerais. Aliás, em terra de Paulo Coelho, todo mundo que cai no palco iluminado da sorte (de ser bancado por uma grande editora), é, de presto, rotulado de mané, merece ser crucifixado no alvo-mira dos pedantes pra consumo. Aleluia, Monteiro Lobato.

A Nova Crítica Literária Brasileira - que quer ser o Provão do Amém - não existe, é conversa fiada para gerente editorial dormir, chove no molhado, arde no ego, glosa no freudiano, bebe em becos e feudos, destila veneno e depois, no trivial, pançuda e demodê, espera as vaias, os aplausos, os coiós atrelados, os arigós com grife. Para não dizerem que não falei de flores, a luta continua. Todo autor neomaldito adora encontrar uma Dalila para cortar os cabelos da sonhadora iniciativa peluda e sensacionalista. O resto é mágoa de fugitivos de pagos e estâncias. Eu, por mim, prefiro continuar neomaldito e morrer assim, do que me servir do pote de vísceras de egos doentios. Nem todo crítico que lê luz é cobrador da ligação. Há os isentos. Raros e curtidos. Em terra de cego, quem tem olho pensa que é dono da bengala. FUI.

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Poeta Silas do Itararé para o Brasil faz seu grito de guerra. Ele se apresenta:

Poeta Prof. Silas Corrêa Leite - Educador, Jornalista e Escritor - Pós-graduado em Educação, Literatura na Comunicação e Jornalismo Cultural )CA/USP) - Autor de O Rinoceronte de Clarice - onze contos fantásticos com três finais cada (um feliz, um de tragédia e um politicamente incorreto) - no site www.itarare.com.br
Autor de Porta-Lapsos, Poemas, 2006
Site pessoal:
www.itarare.com.br/silas.htm

Brigitte Bardot








Quem viu esta beleza nas telas do cinema não esquece. E o cinema é mágico porque preserva a juventude que o tempo mastiga...


quinta-feira, 2 de abril de 2009

Desfiladeiro do Rio Poty

Você não sabe o que tá perdendo. No Piauí também tem Grand Cânion. No município de Castelo o Rio Poty abre uma garganta num desfiladeiro de pedras que nada fica a dever aos do Obama. E observe que nesta foto o rio toma a forma do mapa do Estado do Piauí. Canoas são lançadas nas corredeiras. O Mandu Ladino foi o primeiro desbravador desta garganta. O Piauinauta pousou ali em cima para apreciar o cenário magnífico...


ladino

Edmar Oliveira

Ladino, Mandu matutava no lajedo do rio
Olhando as águas em que as moças lavavam seus corpos
Águas de mandis e piaus e curimatãs em peixes piabas
Seguiam em cardumes seus pensamentos guerreiros
"arcus nimis intensus rumpitur"
na guerra, na pesca, no amor...
"Abaporu" é desespero...

Ana Cecília Salis



Minha solidão é feia

e ronca...

Não me deixa dormir.

O PORTAL DO ROMANCE

Geraldo Borges

Este pequeno ensaio fala sobre a parte mais difícil da arte de ficção, que é o primeiro parágrafo do romance, ou mesmo do conto clássico. A sua abertura. A apresentação do personagem ao leitor, juntamente com seu cenário. Depois o começo da história. Para esclarecer melhor este assunto fui buscar nas páginas da literatura de ficção, nos seus primórdios alguns exemplos de abertura, que até hoje servem de modelo. Em primeiro lugar cito Cervantes (1547- 1616 ).

“Num lugar da Mancha, de cujo nome não quero lembrar, não há muito tempo vivia um fidalgo, daqueles de lança ao cabide, adaga antiga, rocim magro e galgo corredor... Pretendia-se que tinha a alcunha de Quijada ou Quesada, pois quanto a isso existe uma certa diferença entre autores que tratam deste caso; se bem que por conjecturas verossímeis se dê a entender que se chamava Quejana. Porém, isto pouco importância tem para o nosso relato, basta que a sua narrativa não se afaste um ponto da verdade.”

O que está escrito no parágrafo acima é o começo do primeiro capitulo do Engenhoso fidalgo D. Quixote de La Mancha, a fonte de todo o romance ocidental, onde Cervantes, famoso romancista e escritor apresenta o seu personagem titular e o coloca em um lugar na Mancha, de cujo o nome não quer recordar. Não sei por que motivos. Talvez políticos. Mas para melhor compreensão de nosso ensaio que vai ter muitas citações, vamos declinar a Bíblia. Livro de importância especial para a formação da literatura Européia. Pois é mais do que sabido e consagrado que a Bíblia, principalmente o Velho Testamento influenciou a maioria dos autores europeus e adjacências, tanto quanto Homero. Para sermos mais preciso o inicio do romance D. Quixote é pura influencia da Bíblia. Vamos ilustrar.



“Havia na terra de Hus, um homem chamado Jô, integro e reto, que temia a Deus e fugia do mal. Nasceram-lhe sete filhos e três filhas. Possuía sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas de bois, quinhentas jumentas e uma grande quantidade de escravos".

O livro de Jô é considerado uma obra prima da literatura hebraica, e expressa grande profundidade sobre a alma humana pelo complexo jogo de interesse, que Deus e o Diabo possuem por ela. Jô sai humilhado, ofendido e exaltado desse jogo. O livro de Jô segundo comentário da Bíblia é uma composição literária estreitamente aparentada com o gênero dramático, cuja ação nos é apresentada numa introdução e numa conclusão em prosa que enquadra um longo poema dialogado. O autor, alias, desconhecido, situa a sua composição no quinto século AC, em lugares e situações assaz imprecisas . O personagem de Jô era para os antigos israelitas uma figura tipo de justo sofredor.
Saltando agora do Velho Testamento para os tempos modernos vamos fazer mais algumas citações de autores que, com certeza, beberam nas paginas da Bíblia ou de Cervantes. Vejamos Edgar Alan Poe (1809-1849). Trata – se de um conto que tem o nome do personagem principal.

“Que me seja permitido chamar-me William Wilson. A página em branco, que tenho diante de mim, não deve ser manchada com o meu verdadeiro nome. Este nome já tem sido demais objeto de desprezo, de horror e de ódio para a minha família .”

Trata-se de um conto clássico de terror psicológico Gótico. A própria ambigüidade do nome já deixa o leitor curioso com o enredo. O conto é fantástico, antológico.
Citemos agora Eça de Queiroz (1840-1900 ) Este escritor português exerceu grande influencia nos escritores brasileiros do romance de 30. Vejam o inicio de seu romance, - O Mandarim, Um texto fantástico e cheio de fantasia, onde o Diabo deita e rola.
Prometendo uma grande fortuna a quem matar um mandarim na China. A obra é uma alegoria.


“Eu chamo-me Teodoro – e fui amanuense do Ministério do Reino. Nesse tempo vivia eu à Travessa da Conceição numero 106, na casa de hóspede da D. Augusta, a esplendida D. Augusta, viúva do major Marques . Tinha dois companheiros: o cabrita, empregado da Administração do bairro central, esquio e amarelo como uma tocha de enterro, e o possante, o exuberante tenente Couceiro, grande tocador de viola francesa.”



Eça apresenta o seu personagem na primeira pessoa, estilo direto, juntamente como Poe. Já o texto de Dom Quixote e de Jô, aparecem na terceira pessoa, no estilo indireto, que parece nos mais solene, mas distante..
Agora vejamos Machado de Assis (1839-1908 ) em estilo indireto, no texto o qual dá inicio a seu romance Quincas Borba.

“Rubião fitava a enseada – eram oito horas da manhã. Quem o visse, com os polegares metidos no cordão do chambre, à janela de uma casa do Botafogo, cuidaria que ele admirasse aquele pedaço de água quieta. Mas, na verdade, vos digo, que parecia ver outra coisa.”

Observe o leitor. Na verdade, vos digo. Puro Evangelho. A enseada de Machado me leva ao mar. E resolvo citar Hermman Melville (1819-1891) um pouco fora da cronologia, mas dentro do mesmo século. O autor começa o seu belo romance, Moby Dick, por um imperativo suplicante. Um lindo começo que coloca o leitor a mercê do autor. A vontade que se tem e de viajar com a personagem.

“Chamai-me Ismael. Há alguns anos quando precisamente não vem ao caso -, tendo eu pouco ou nenhum dinheiro na carteira e sem nenhum interesse em terra, ocorreu-me navegar por algum tempo e ver a parte aquosa do mundo. É a minha maneira de dispersar o spleen e de regular a circulação do sangue.”

Este é o começo da história da caça da baleia branca, uma espécie de epopéia onde o homem e a natureza, com suas forças irracionais se defronta. O cenário é o mar, onde a aventura faz o spleen desaparecer. E a ação tomar corpo. Vejamos o que diz Raquel de Queiroz sobre este romance: “Se me perguntarem qual foi o livro que mais me marcou os primeiros anos de leitura, eu responderia sem hesitar que este livro foi Moby Dick, a historia da baleia branca também chamada a Fera do Mar”.



Agora para dar mais um exemplo de abertura de romances que são paradigmas do oficio de escritor, citarei dois grandes escritores que viveram a mesma época . Trata-se de Graciliano Ramos (1892 – 1953) e Ernest Hemingway (1899 – 1961). Vejam o estilo direto de Graciliano, na primeira pessoa, abrindo o portal do romance São Bernardo, depois de jogar dois capítulos fora, simbolicamente falando.

“Começo declarando que me chamo Paulo Honório, peso oitenta e nove quilos e completei cinqüenta anos pelo São Pedro.”

A partir daí o leitor vai atrás do destino do personagem, e depara com um herói problemático, que ao escrever o seu romance se dá conta dos mecanismos de sua alienação.
Já o romance, O velho e o mar, na terceira pessoa. É também a história de uma derrota, mas, pelo menos mais assimilável. O velho luta contra um peixe e consegue trazê-lo ate a praia, se não inteiro, apenas o cadáver. Mesmo assim sua luta o satisfez.

“O velho chamava-se Santiago. Todo dia saia tripulando sua canoa; ia pescar no Gulf stream. Mas nos ultimas oitenta e quatro dias não apanhou um só peixe".

Por último me rendo a tentação de citar mais um romancista brasileiro, re inventor da nossa linguagem regional autor de fino trato – Jose Candido Carvalho (1914-1989). Vejam como começa o seu maravilhoso romance de nome O Coronel e o Lobisomem. Deixados do Oficial Superior da Guarda Nacional, Ponciano de Azeredo Furtado da praça de Campos de Goitacaes.
Eis o portal de seu romance.

“A bem dizer, sou Ponciano Azeredo Furtado, coronel de patente do que tenho honra e faço alarde. Herdei do meu avô Simão terras de muitas medidas, gado do mais gordo, pasto do mais fino. Leio no corrente de vista e até uns latins arranhei em tempos verdes de infância, com uns padres mestres a dez tostões por mês . Nos currais do Sobradinho, no debaixo do capotão de meu avô, passei os anos de pequenice, que pai e mãe perdi no gosto do primeiro leite.”

Não se pode negar que o autor de Coronel e Lobisomem foi um ledor inveterado de D. Quixote e também da Bíblia. Acredito que ficou claro no fechamento desta cronologia de citações, - desde de antes de Cristo, passando pelo renascimento, chegando até o século vinte -, que a maneira de apresentar personagens e cenário, no começo do romance e contos clássicos não mudou quase nada, pois mais que se apresentem novos ingredientes na receita para o romance ocidental. Claro que nossa literatura é um vasto mundo e este pequeno ensaio não tem a pretensão de esgotar o seu tema. Pois é apenas um simples esboço que pode muito bem ser aprofundado.

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Israel acerta o filme de Georges Meliès "Le Voyage dans la lune" . Miltão tá no BRAZILCARTOON



Le Voyage dans la lune




Georges Méliès (8 de dezembro de 1861 — 21 de janeiro de 1938) foi um ilusionista francês de sucesso e um dos precursores do cinema, que usava inventivos efeitos fotográficos para criar mundos fantásticos.
Era proprietário do Théatre Robert-Houdin em Paris, que havia pertencido ao famoso ilusionista francês Jean-Eugène Robert-Houdin. Ganhou um protótipo criado pelo cinematógrafo inglês Robert W. Paul e ficou entusiasmado com isso, tanto é que saía filmando cenas do quotidiano em Paris. Um dia a sua câmara parou de repente, mas as pessoas não paravam de se mexer e quando ele voltou a filmar, a ação feita na filmagem era diferente da ação que ele estava filmando. A esta trucagem ele deu o nome de stop-action; criou várias outras como perspectiva forçada, ou filmagens a alta e baixa velocidade. Durante uma década,criando filmes fantasiosos, Méliès foi considerado o melhor cineasta do mundo.
Um de seus filmes mais conhecidos foi Le Voyage dans la lune ("Viagem à Lua") de 1902, em que usou técnicas de dupla exposição do filme para obter efeitos especiais inovadores para a época. (Wikipedia)

No Youtube tem partes do filme. Vale a pena. Entre com "Melies". É sensacional...