domingo, 17 de julho de 2011

Nego Itamar em Documentário


Aderval Borges

A matéria abaixo mais reduz que reluz. Pelas declarações do diretor, o documentário deve ser tal qual. Entre os parceiros do compositor não cita Arnaldo Anthunes, Naná Vasconcellos (com quem fez disco), Tom Zé e Macalé (para quem produziu/dirigiu um disco gravado cá em Sampa). Nos últimos anos, Macau foi muito próximo de Itamar e inclusive ensaiava no estúdio doméstico deste. Itamar tá entre os cabras de alto repertório da MPB. Tinham um pé na tradição (vide a releitura de Ataulfo) e outro na vanguarda, qual Macalé (vide releituras de Morangueira, Lupicínio, Geraldo Pereira, Ismael e outros). Itamar não era só focado em música. Flanava, qual nosotros, por artes plásticas, cinema e outros bichos. Fez músicas pra ballet e teatro - como Arrigo (que atualmente compõe mais pra dança). Sua formação se deu em Londrina (PR) - embora paulista de Tietê - onde estudou música em conservatório com os irmãos Barnabé (Arrigo e Paulinho), com os quais era mais afinado (Paulinho tocou bateria pra ele e pra Arrigo). Conceitualmente, sua música é muito parecida com a de Arrigo, baseada no modo de compor modal de Bártok. Seus arranjos têm leitura para cada instrumento, de modo que parecem competir uns com os outros - Arrigo tb faz isso. Outro aspecto em comum dos dois é o uso quase percussivo de todos os instrumentos - isso também vem de Bártok -, o que dá um caráter sincopado aos seus arranjos. Acho que Arrigo/Itamar é o que há de mais fino - no viés de alto repertório - da MPB pós bossa nova e tropicalismo. Mas o tropicalismo só manteve o alto repertório no início - quando Duprat tava no comando dos arranjos e quando Macalé/Lanny assumiram a batuta. Dos ex-tropicalistas o que mantém mais um pé na vanguarda é Tom Zé. Os demais debandaram pro coloquial após as gravações comandadas por Macalé/Lanny, se nivelando aos demais compositores da geração festivais.
  




Retrato à altura de Itamar
Estado de S.Paulo

O documentário Daquele Instante em Diante, que estreia hoje, tem o "caráter vulcânico" da personalidade do homenageado: Itamar Assumpção (1949-2003). Quem afirma é diretor Rogério Velloso, que teve acesso a tanto material com "grande apoio da família" (a viúva Elizena e as filhas Anelis e Serena), que daria para realizar mais do que um filme, mas uma série. "Foi uma oportunidade única para se fazer um trabalho à altura do cara", diz.
Velloso mergulhou fundo na obra e na vida pessoal do genial artista para mostrar os "vários Itamares": o compositor, o poeta, o performer, o amante das plantas (especialmente as orquídeas), o homem caseiro, o gênio incompreendido, o controlador irredutível de tudo o que envolvia sua criação, o parceiro de tantos outros talentosos contemporâneos, como Luiz Tatit, Alice Ruiz, Arrigo Barnabé, Suzana Salles, Paulo Lepetit, Alzira Espíndola, Tata Fernandes, Luiz Waack, Luiz Chagas, entre outros que dão sua visão do amigo. "Ele se mostrou de alguma forma nesses fragmentos", diz Velloso. "Você pode vê-lo no filme por um monte de prismas, porque cada um conheceu um Itamar diferente."
Isso tudo além do próprio Itamar, que aparece em número generoso de entrevistas, ensaios e shows - precioso material de arquivo, que revela ao público que não teve a oportunidade de conhecê-lo o quanto ele era maior no palco do que em gravações. "A ideia foi fazer um filme para quem não conhecia o Itamar pudesse ter acesso, então decifrar não só o jeito tão peculiar que ele desenvolvia a própria música, trabalhando com as linhas de baixo. Ao mesmo tempo em que o filme tem a linearidade, em que você vê a evolução da musicalidade e do pensamento, ele tem uma espiralidade também", diz Velloso.
Tatit observa como, apesar de quase sempre continuar relacionado ao Nego Dito/Beleléu, ao longo da carreira ele foi deixando o personagem em segundo plano e sofisticando sua música. Um dos pontos altos foi o trabalho voltado para a obra de Ataulfo Alves (1909-1969), em que expõe toda sua elegância negra, em comum com o homenageado.
O diretor evitou todos rótulos dos quais Itamar foi vítima - em nenhuma situação é usada pelos entrevistados a palavra "vanguarda", por exemplo. Como lembra Suzana, aquilo que marcou a música de São Paulo na década de 1980 "não foi um movimento, mas um momento". Sucesso Itamar fazia a seu modo, com shows lotados e longas temporadas em teatros de São Paulo.
O filme, que abre a Série Iconoclássicos, do Itaú Cultural, vai ficar um mês em cartaz em sessões com entrada franca nas salas do Unibanco Pompeia, Augusta e Frei Caneca, além de Curitiba, Fortaleza, Rio, Salvador, Santos e Porto Alegre, com sessões grátis em horário nobre.

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