Ascenso Ferreira 
A escola que eu freqüentava era cheia de grades como as prisões. 
E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário; 
Complicado como as Matemáticas; 
Inacessível como Os Lusíadas de Camões!
À sua porta eu estava sempre hesitante...
De um lado a vida... — A minha adorável vida de criança: 
Pinhões... Papagaios... Carreiras ao sol... 
Vôos de trapézio à sombra da mangueira!
Saltos da ingazeira pra dentro do rio... 
Jogos de castanhas... 
— O meu engenho de barro de fazer mel!
Do outro lado, aquela tortura: 
"As armas e os barões assinalados!" 
— Quantas orações? 
— Qual é o maior rio da China?
— A 2 + 2 A B = quanto? 
— Que é curvilíneo, convexo? 
— Menino, venha dar sua lição de retórica!
— "Eu começo, atenienses, invocandoa proteção dos deuses do Olimpo 
para os destinos da Grécia!" 
— Muito bem! Isto é do grande Demóstenes! 
— Agora, a de francês: 
— "Quand le christianisme avait apparu sur la terre..." 
— Basta 
— Hoje temos sabatina... 
— O argumento é a bolo! 
— Qual é a distância da Terra ao Sol? 
— ?!! 
— Não sabe? Passe a mão à palmatória! 
— Bem, amanhã quero isso de cor...
Felizmente, à boca da noite, 
eu tinha uma velha que me contava histórias... 
Lindas histórias do reino da Mãe-d'Água... 
E me ensinava a tomar a bênção à lua nova.
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Publicado no livro Catimbó (1927). 
In: FERREIRA, Ascenso. Poemas: Catimbó, Cana Caiana, Xenhenhém. Il. por 20 artistas plásticos pernambucanos. Recife: Nordestal, 1981. 
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