quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O Casamento da Raposa

Edmar Oliveira





Vez por outra, quando dava de acontecer chover com o sol no céu, se dizia ser o “casamento da raposa”. Interpretando os fatos do meu jeito, achei, a princípio, ser um fenômeno daquele nordeste seco onde nasci, que o sol não dava licença nem em dia de chuva. Se ela não fosse demorar muito, o sol nem se dava ao trabalho de sair do céu, já que é comum sua soberania nos tempos em que nem uma gota d’água se atreve a pingar. E a raposa com o caso? Cheguei a achar que a ladrona dos galinheiros aproveitava o fenômeno para roubar o banquete do seu casamento. Num dia de sol ela não se atrevia porque estávamos vigilantes, tinha que esperar a noite para enfrentar nossos cachorros. Num dia de chuva ela não saia da toca. Na chuva com sol, com os cachorros dentro de casa, a festa era feita. Se imaginava coisas assim para explicar o que eu não entendia, certamente seria um bom contador de lorotas...



Só bem mais tarde, lendo os contos do folclore brasileiro, me dei com a história muito melhor que a minha: a raposa, pretendendo casar com o lobo, ia dar uma festa e o rei leão perguntou se ela queria um dia de sol ou de chuva. A bicharada falava que o casamento de dois eternos inimigos não ia durar muito. A raposa sabia que casar num dia de chuva trazia felicidade, mas num dia de sol a festa era melhor, e assim querendo ter as duas coisas solicitou ao rei a façanha de ter chuva e sol no seu casamento. Como palavra de rei não volta atrás e ele tinha prometido o presente que a raposa quisesse, fez chuva e sol no casamento da raposa. Assim toda vez que chove com sol o povo lembra deste enlace. Mas a função da lenda é chamar a atenção para a pouca duração do fenômeno: chuva com sol dura pouco tempo, assim como se espera do casamento de uma raposa com o lobo...



Mas como toda fábula tem exceção, vamos fabular em regime de exceção. O casamento do Lobo com a Raposa no Rio e Janeiro já dura muito tempo. Fora as brigas de marido e mulher pra ver quem manda no quintal, este casamento de interesse fez ampliar os territórios nos quais o rei leão não tem mais jurisdição. Os galinheiros da cidade foram ocupados pela raposa ou pelo lobo e o rei leão não manda mais nestes domínios. A raposa assalta, trafica, mata e assusta as galinhas que nem mais cacarejam. O lobo faz o papel da milícia, extorque, mata e assusta as galinhas que nem mais esboçam reação. Os pintos já nascem assustados. As balas perdidas já mataram macacos, marrecos, capivaras e a bicharada corre, assustada, de um lado pro outro da floresta da tijuca. O lobo às vezes aparece em pele de cordeiro, mas não dá pra confiar. A raposa finge proteger o galinheiro e as galinhas acreditam por medo. O rei leão não consegue botar ordem na casa e ninguém acredita nos seus rugidos. E chove e faz sol no Rio de Janeiro faz é tempo...

Um comentário:

Unknown disse...

Muito boa a explicacao! Desde crianca ouço este termo , mas nunca tinha visto uma boa versao! Parabens !