SINTO QUE O MÊS PRESENTE ME ASSASSINA
Sinto que o mês presente me assassina, 
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
sobre homens nus ao sul das luas curvas. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Corro despido atrás de um cristo preso, 
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda 
Ao beco de agonia onde me espreita 
A morte espacial que me ilumina.
Sinto que o mês presente me assassina 
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas 
De apóstolos marujos que me arrastam 
Ao longo da corrente onde blasfemas 
Gaivotas provam peixes de milagre. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora 
(Na libra escorpiões pesam-me a sina) 
Há panos de imprimir a dura face 
À força de suor, de sangue e chaga. 
Sinto que o mês presente me assassina, 
Os derradeiros astros nascem tortos 
E o tempo na verdade tem domínio 
Sobre o morto que enterra os próprios mortos. 
O tempo na verdade tem domínio,
Amen, amen vos digo, tem domínio
E ri do que desfere verbos, dardos
De falso eterno que retornam para
Assassinar-nos num mês assassino.
____________________
Mário Faustino (Theresina, 1930-Céu dos Andes, 1962). Poema de "O Homem e Sua Hora", Cia de Letras, SP, 2002.
Nenhum comentário:
Postar um comentário