quinta-feira, 10 de julho de 2008

Metáforas de Papel

Geraldo Borges


O primeiro papel que eu conheci foi o papel de embrulho. Meu pai tinha uma bodega e enrolava as suas mercadorias nesse tipo de papel. Era um papel ordinário que tinha muitas serventias. Depois eu conheci o papel pautado, na cidade, na escola, era com ele que a gente fazia as provas parciais e finais. As pautas eram para que o estudante bisonho não se perdesse no vazio do papel. Depois conheci o papel de seda. Este eu vi a primeira vez em um embrulho que ganhei de presente em uma noite de Natal. Tinha dentro um pião que rodei muito tempo pela vida afora. O papel de seda também me foi apresentado nas asas dos papagaios que empinávamos durante os meses de vento no nordeste.



Depois conheci o papelão. Um papel bastante grosseiro que serve para se confeccionar caixas. Conheci também o papel de jornal. E daí para conhecer o jornal foi um passo.


Aí comecei a descobri as metáforas escritas no papel. De forma que fui conhecendo uma variedade de papeis pela vida. E também representei muitos papéis. Conheci papel de cartas. Papel é como tecido, tem muitos padrões. O papel sempre me impressionou desde o primeiro papel que eu conheci. Com papel fiz avião, navio, papagaio, chapéu. Fiz rabo de papel para botar no fundilho de pessoas importantes que não se compenetravam de seu papel. Conheci papel fino para enrolar cigarro, de fumo bruto, conheci o papel de bobo, o papel de palhaço, o papel carbono. Descobrir que os maiores destruidores de papel são os fumantes. Não podemos viver sem nossos papéis. O papel moeda principalmente. E que papelão faz um país onde boa parte de sua gente não sabe assinar no papel e é obrigado a sujar o dedo para marcar seu jamegão. Já que vivemos no país da papelocracia...


Cheguei ao fim deste texto fazendo o meu papel de escritor. E termino me lembrando do começo deste papel quando eu era menino lá na minha terra, e brincava com papel de embrulho no corredor da casa grande. A brincadeira era queimar papel. Os mais velhos, os adultos, sem imaginação, diziam que brincar com fogo fazia a gente mijar na rede. Cresci. Continuei brincando com papel e com fogo. Precisava deste brinquedo. Esta crônica pode até virar papel picado e ir para o lixo. Mas, com certeza, não é um papel de embrulho ordinário contendo uma mercadoria qualquer.

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