Confesso, estou muito apreensivo quanto ao resultado das eleições, muito mesmo. Por isso resolvi marcar, a cinco dias do pleito, uma audiência com Preto Velho Benedito, aquele que já dizia, “felicidade também mora na Bahia”.
Você, caro e raro leitor, deve estar perguntando: mas como ele te recebe assim, se a agenda dele está sempre lotada?
A resposta é: tenho laços muito fortes com ele, vou contar por que:
Certa vez Preto perdeu o seu cajado de jacarandá da Bahia. Aliás, ele não perdoa o Oscar Niemeyer, nem o Sérgio Rodrigues, muito menos o Zanini pelo uso indiscriminado dessa nobre e belíssima madeira nos seus ambiciosos projetos, tendo provocado o seu completo desaparecimento.
Ora vejam só o que é o destino!... Foi suprema sorte, a minha, ter encontrado o “cajado sagrado” numa das matutinas caminhadas pela praia de Botafogo. Você vai me chamar de mentiroso, mas eu não ligo, vou contar a história até o fim, doa a quem doer, digo, ria até a barriga doer...
Os olhinhos do Velhinho brilhavam de emoção quando bati à porta de sua humilde choupana e entreguei-lhe, emocionado, o seu querido e inseparável cajado mágico, dádiva secular de seus antepassados negros escravos africanos.
Então o Velho me contou como o havia perdido. Disse-me que escolheu aquela praia para fazer o seu despacho, um ritual que não envolve, absolutamente, nenhum utensílio e alimento, normalmente oferecidos às divindades. O “despacho” de Benedito é feito sempre em noite escura de lua nova. Apoiado de joelhos no seu cajado, pede a benção divina pela paz da humanidade, voltando suas preces ao firmamento onde, segundo ele, vive o seu guia supremo O Senhor Criador de Todas as Coisas e da Natureza.
Nessa noite aconteceu que quase a ronda noturna dos meganhas pegou Ele. Esses caras, como se sabe, adoram convidar pretos e pardos para dar uma voltinha grátis nos camburões, com direito a umas porradas no pé do ouvido, para confessar alguma coisa que fizeram, não se sabe o que, mas fizeram...
Preto Velho teve que sair correndo, ou melhor, voando no redemoinho do Saci-Pererê, quem sempre o auxilia nos momentos difíceis, esquecendo o seu cajado para trás. Além de recebê-lo de volta, pelas minhas mãos, ficou muito agradecido, também, por dois artigos aqui publicados no Piauinauta, onde o Velhinho foi citado (meu raro e caro leitor deve lembrar-se deles).
Ademais, Ele já tinha ouvido falar no Dr. Edmar das Oliveiras, pelos serviços prestados em prol da saúde mental. Benedito tem conhecimento de que a maioria das internações em hospitais públicos é de negros e pardos. Pobres e desassistidos, esses coitados, além de carregar no lombo açoitado, por anos a fio, a carne viva da discriminação, ainda são considerados doidos, varridos da sociedade pela intolerância racial.
Mas, e as eleições?
Bem, isso Benedito revelou só a mim, caro leitor, o que hoje todos já sabem.
1000TON
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