quarta-feira, 12 de novembro de 2008

MEU TEMPO DE PELADA

Geraldo Borges


Quando cheguei em Teresina para estudar, descobri a alegria do futebol. Nós, os colegas da mesma rua, principalmente, nos reuníamos toda vez que havia oportunidade para bater uma pelada. Éramos estrompas. Uma vez por outra um saía machucado, mas valia a pena, suar e correr. No começo era com bola de meia, que a gente mesmo costurava. Não tínhamos recurso para jogar com bola de couro.



Depois conseguimos uma bola de borracha. Tivemos que nos adaptar aos seus efeitos, porque era muito leve, rápida em seus movimentos .Qualquer chute com muita força extrapolava o limite do campo e ia cair muito longe. Com o tempo fizemos uma vaquinha, e pingando um tostão aqui, outro ali, compramos uma bola de couro, que a gente enchia com bomba de bicicleta; era bastante pesada. Tivemos de nos adaptar a um novo ritmo. O contentamento foi geral.
Jogávamos descalços. Muitos dos colegas tinham apelidos. O meu era Peruzinho. Tinha o Pé de Gato, o Negrinho da Becetinha, o Dom Ratinho, o Raspadeira. Jogávamos em muitos locais. No inicio o nosso campo era na Rua Campo Sales, que ainda estava longe de ser asfaltada, e muito menos de virar avenida.



Jogávamos na rua Palmeirinha, perto do corte da linha férrea, onde hoje passa a Miguel Rosa. Na esquina morava o velho professor Chico César, professor de latim, que implicava com a gente. Pois a bola batia muito na cerca do quintal de sua casa. Chico César era um tipo singular. Fizesse frio ou calor, estava sempre envergando seu paletó xadrez, barba cerrada, charuto aceso na boca, bengala na mão. Exortava-nos, e nos mandava estudar. Para deixá-lo em paz, uma vez por outra, passávamos a jogar na Esplanada, que ficava no fundo da estação ferroviária, no caminho que vai para o rio Poti.



Lá o chão era duro. E como jogávamos descalço machucávamos bastante os pés. Terminada a partida íamos tomar banho, no porto do Meduna, perto da horta da colônia japonesa, que o doutor Clidenor tinha trazido para o Piauí a fim de melhorar a nossa lavoura.
Jogávamos também na praça do Marquês, que nesse tempo era apenas um campo de futebol; outro lugar que costumávamos jogar era na Fiação. Lá havia um campo muito bom.



Aos pouco nosso time foi melhorando. Arranjamos no comércio, como cortesia, um uniforme, de camisas quadriculadas. Só não arranjamos chuteiras. Mas cada um comprou um par de tênis. Tínhamos um craque em nosso equipe, o jovem Wallace, filho do tenente Edmundo, só o seu nome já nos impressionava. Mais tarde jogou pelo Flamengo. Tinha um célebre chute folha seca.
Uma vez fomos jogar na Ilhota. Local próximo ao rio Poti, onde meninos pobres, sem família, eram internados para se educar. Ali aprendiam artes e ofícios. Viviam num regime de muita disciplina. Sabiam jogar futebol muito bem. Perdemos o jogo.



Com o passar do tempo a nossa equipe foi ficando desfalcada. Wallace foi embora para Fortaleza. Não demorou muito alguns colegas tiveram de se mudar para longe. Quando menos esperávamos a nossa equipe ficou desfeita. Os poucos que restaram, agora, se divertiam jogando partida de time de botão. O meu time era o Fluminense. Ainda hoje me lembro de sua escalação; a defesa era: Castilho, Pindaro e Pinheiro. Tinha também: Orlando, Didi, Bigode.



Passado a adolescência, chegou meu tempo de servir a exército. Na caserna voltei a jogar bola. Participei da equipe do meu regimento. Lembro-me de uma partida que travamos com os soldados recrutas na cidade de Itaueira. Eles estavam nos esperando, descansados. Vínhamos de Vereda Grande. Chegamos meio dia, com fome. Nem ao menos descansamos. Fomos jogando no campo para disputar a partida. O pior jogamos descalço. Pobre exército brasileiro. Nem chuteira eles nos deram na hora. Nunca me esqueci desse jogo. Saímos do campo com os pés queimados, cheios de bolhas, e derrotados. Não conseguimos fazer sequer um gol. Logo que dei baixa do exército o futebol para mim ficou descartado. Eu preferi cuidar da minha cabeça, já que eu era perna de pau.

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