(Leo Almeida)
Há alguns minutos conversam nada discretamente. Riem alto, 
falam alto. Contei, lá se foram dois cigarros bem tragados e, depois, 
jogados na calçada. Acabou de acender o terceiro. Que coisa feia! Penso 
com meus eus encalacrados. Refiro-me aos maus modos do mais alto deles, o
 fumante, um sujeito grande, corpanzil bronzeado, muitos pêlos e 
conversa esperta. O mais baixo é calvo, sunga preta, sem camisa, 
sandália de dedo. Presumo que veio da praia, tem areia nas canelas 
brancas. O outro, o fumante de maus hábitos, tem cabelos grisalhos, 
amarrados, num rabo de cavalo prateado. Usa uma pulseira de couro. A 
testa, muito vermelha, avança no território capilar, como terra 
devastada por madeireiros inescrupulosos. Me pego sorrindo com essa 
ideia estapafúrdia do desmatamento capilar do sujeito, que também usa 
uma sunga, vermelha, velhinha, pois um pouco desbotada. Juntos, presumo,
 devem somar bons 120 anos de praia. Muita história pra contar. Muita 
maresia. Enquanto trocava a bateria de meu relógio, num chaveiro na 
esquina da Paula Freitas com Nossa Senhora de Copacabana, fiquei 
observando o papo daqueles dois velhos meninos do Rio. A conversa passou
 do futebol para a política e dessa para o jogo do bicho, que o mais 
baixo deles tinha faturado. Coisa pouca, ele disse, mas dá para umas 
“cervas” no Real Chopp. O outro, que descobri chamar-se Roberto, ou 
Alberto, ou Gilberto, pois o tratavam simplesmente como Beto, tinha uma 
tatuagem no braço esquerdo e era torcedor do Fluminense, denunciava-o a 
camisa tricolor repousando no ombro. Pés descalços. Era cumprimentado 
por grande parte dos transeuntes, razão pela qual deduzi que devia morar
 ali pertinho. Parecia mesmo estar no quintal de casa, tal a 
desenvoltura exibida em plena calçada. Aparentavam ser amigos há 
séculos, mas isso não me dá certeza alguma, pois o carioca, quando 
conversa, passa a boa impressão de te conhecer há séculos. Mas eu 
preferi investir na ideia de que eram realmente amigos de antigos 
carnavais. O mais baixo, no segundo casamento, quatro filhos. O 
cabeludo, 4 casamentos e várias aventuras que lhe renderam filhos 
espalhados pela Penha, Campo Grande e Niterói, mora com a mãe e um 
cachorro viralata, batizado Lennon. Aposentou-se recentemente e 
complementa os seus parcos rendimentos com a pensão que a mãe recebe 
como viúva de militar. Combinam um vôlei no Posto 3 “qualquer hora 
dessas” e sabem que não vão mesmo jogar essa partida, em hora alguma. 
Despedem-se com um abraço meio sem jeito, cheio de areia e suor e, tenho
 toda certeza, saudade sincera dos meninos que um dia foram.

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