domingo, 19 de janeiro de 2014

Machu Picchu


(Edmar Oliveira)
setor urbano da cidadela
 
Quando os espanhóis dominaram e saquearam Cuzco, quase na metade do século XVI, inclusive pedindo e recebendo o peso do Inca Atualpa em ouro (mas mesmo assim lhe decepando a cabeça) mostraram que o conquistador era um inimigo cruel. Inclusive em todos os templos sagrados dos nativos foram erguidas igrejas católicas impondo a fé cristã ao povo dominado. Os sinais eram claros de que a cultura do dominador seria imposta a ferro e fogo. Por essa época, os remanescentes das dinastias das elites quéchuas se refugiaram numa cidade inca perdida na selva. O segredo costurou os lábios dos incas e os espanhóis amargaram a derrota de nunca encontrar a cidadela perdida, apesar de saberem de sua existência.

Já quase no outono do século XIX um cartógrafo alemão registrou as montanhas, a velha e a nova, que no dialeto quéchua se falava Machu Picchu e Wayna Picchu. Mas a cidadela perdida entre as duas montanhas só seria vista pelos remanescentes dos conquistadores no alvorecer do século XX, quando um arqueólogo americano foi apresentado as ruinas de uma cidade que nunca deixou de ser vista pelos herdeiros da cultura inca: a cidadela perdida de Machu Picchu.

As ruinas atestam a força da civilização quéchua. Transformadas em patrimônio da humanidade impressionam até hoje. A cidadela está dividida em dois setores, o agrícola e o urbano. Os dois impressionam pela organização e arquitetura.

setor agrícola com observatório em 1° plano
O setor agrícola é dividido em planos, aproveitando a geografia da montanha com locais específicos para o cultivo de espécies que brotam em solos diferentes. A irrigação se faz pela força da gravidade a partir de uma fonte no alto da montanha. A água é acumulada na parte de trás do setor agrícola e a força da gravidade faz a distribuição nos planos destinados ao cultivo de cada espécie. E na variedade desse solo o milho, por exemplo, brotava em diversas variedades de cores e sabores, inclusive no vermelho, que faz a saborosa bebida chicha morada, usada antigamente nos rituais religiosos.

O setor urbano mostra uma fortaleza inexpugnável. Uma porta principal, como a de um castelo e janelas trapezoidais nas muradas com dupla função: ter um olhar do vale da montanha muito ao longe e ao curso do rio Urubamba, caminho natural que vem de Cusco; ao mesmo tempo em que o formato trapezoidal protege a construção dos humores de frequentes terremotos. Observatórios astrológicos apontam para o equinócio solar ou as constelações celestes, mostrando ainda um pouco de como era avançada a ciência dos quéchuas. Os templos, as construções de moradia atestam a perícia daquela civilização no corte da pedra e na sua montagem, que os mais inteligentes estudiosos ainda não desvendaram como eram feitos.

Ainda um mistério: a cidadela perdida foi abandonada por seus habitantes em algum momento do século XVIII, sem que os estudiosos da civilização ocidental tenham achado um motivo justificável para o abandono. Nenhuma catástrofe, nenhuma seca, nenhuma guerra, que são as razões que a nossa compreensão é capaz de admitir. O Piauinauta ficou rindo com seus botões: e se o abandono foi apenas para evitar a conquista e premeditado para conservar aquele vestígio de civilização para quando os conquistadores ficassem mais calmos e não precisassem “ganhar” a posse do conquistado? E para quando tivessem a paz para recuperar as ruinas? Os deuses incas são mais espertos...

porta principal com Wayna Picchu ao fundo
Na década de setenta o Erich von Daniken escreveu um monte de bobagens atribuindo as construções aos “deuses astronautas” porque a arrogância do colonizador não pode permitir que a civilização conquistada possa ser superior a sua. O Piauinauta ficou admirado com a arquitetura inca e a arrogância do colonizador incapaz.

 

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Algumas notas:

(1)    A comparação do inca ao incapaz espanhol foi feita por um quéchua a nós.

(2)    O quéchua é um idioma traiçoeiro: Picchu se pronuncia ‘pit-chu’ (montanha). A pronúncia ‘pichu’ significa pênis. E aí não é mais montanha velha, mas pau velho, o que provoca um sorriso maroto nas quéchuas.

(3)    A viagem hoje se faz em um moderno trem de Cusco a Aguas Calientes. Mas os aventureiros podem fazer trilhas de 15 dias, 7, 3 ou mesmo 1 dia saindo das várias estações que o trem para.

(4)    Machu Picchu é menos alto que Cusco (chegava-se rio abaixo e no vale se subia à Montanha Velha), o que não tem problemas de adaptação para quem chegou até Cusco. Não há motivo para não ir. Do vale até a montanha se faz em confortáveis ônibus. A trilha na cidadela é fácil. Encontramos uma senhora com bengala e um banco portátil, para descanso.

(5)    Hoje chega cerca três mil visitantes por dia. Na trilha da montanha velha para a nova só é permitido 400 pessoas por dia. E a trilha é muito íngreme. Claro que não fomos. Dizem que é a melhor vista da cidadela.

(6)    Por conta dessa quantidade de turistas, foi descoberto que a cidadela vem cedendo e afundando. As autoridades pensam em proibir visitas locais brevemente e substituir por uma rede de teleféricos. Agradeço pela oportunidade de pisar no solo sagrado quéchua.
- o rio Urubamba que corre desde Cusco e é o caminho.
- a vila de Aguas Calientes lá embaixo.
- daqui se ver a vila, mas a cidadela não é vista da vila.
- Machu Picchu ficou aqui escondida por mais de três séculos.
 

Um comentário:

Anônimo disse...

Machu Picchu, é o mais imponente e importante monumento da humanidade. Por si só diz tudo, inclusive mostra com clareza, o tamanho da imbecilidade humana.
Chico Salles.