APRENDIZAGEM
Léo Almeida
Aprendi a ser formal e cortês, canta o poeta argentino. Me
ensinaram a falar baixo, a não alterar o tom de voz numa discussão, a dizer
calmamente “Senhor” ou “Senhora”. Me botaram freios. Como bom e dócil aluno que
sempre fui, aprendi a ser alguém que não me conheço, mas que pelo menos vive
muito bem nas instâncias do real, do social. Corto o cabelo uma vez por mês,
não cuspo na rua, não mijo na tampa do vaso. Como veem, eu realmente fui um ótimo aluno na
escola da cultura: aprendi a viver em sociedade. Me botaram arreios. Hoje eu me
pergunto a que custo e sei que um outro em mim anda adormecido, acorrentado,
mantido quieto como uma sujeira que se varre para debaixo do tapete. Esse outro,
que também sou eu, tornou-se uma espécie de ameaça ao mundinho baseado em
“Senhor” e “Senhora”, ao não cuspir ou arrotar, à obediência passiva. Daqui eu
o vejo, olhar cansado de tanto peso nas costas, dentes a mostra querendo roer
meus tendões. Ainda ontem senti que bicavam seu fígado, como um titã condenado
numa ilha qualquer em mim. Quem sangra um sangue invisível, mas não menos
dolorido, sou eu, este que frequentou os bancos da igreja, da escola, do
partido, do sindicato, da caserna, da vida real. Esse momento é só meu e eu
pressinto uma necessidade urgente de que tudo se exploda numa magnífica
explosão zabrieskiepointeana, arremessando entulhos para todos os lados,
tingindo de partes podres de mim os muros dessa vidazinha levada na flauta de
Pã. Mas isso também é uma forma de aprendizagem, ou não? Hoje eu sei que
aprendi a ser aquele que um dia vai libertar-se de todo aprendizado e ser
feliz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário