quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Simão, o sambista indignado


Neste início de 2010, uma sucessão de tragédias, estourou em minha cabeça.
Que alguns chamariam de alma, de espírito...Mas, para quem sempre viveu
(vive, ainda)agnosticamente, com dúvidas e perguntas, prossigo-me como
sempre. Não sei bem das coisas. Não sei bem de nada.

Aqui, os descasos com que sempre tratam a natureza, espalharam pelo país, um
profundo réquiem para os que comemoravam o ano novo e para os que jamais
conheceram uma simples rabanada. Morreram muitos. O governador chegou
depois, bem depois. Comemorava o ano novo. A 'secretária de ação social'
chegou depois, bem depois. Interrompeu, num ato de solidariedade cristã, sua
estadia num spa.

Lá longe, no Haiti, um país-favela, o mais miserável das Américas, um
deslocamente de placas tectônicas, a 10 quilômetros da superfície, ceifou a
vida de milhares de seres humanos, a maioria párias. Ou dalits, pra ficar na
moda. Eu, tosco ser humano, no minguante da fé, chorei viralatamente. Muitos
desses soluços, deixei nos escombros da igrejinha onde dona Zilda Arns se
transubstanviava em Cristo.

Há poucos dias, naquela quase obscura TV Comunitária, vi um documentáriso
sobre os tempos de chumbo.Violência gratuita, violência a soldo de
empresários, torturas grotescas, assassinatos vis. Ali identifiquei um amigo
do curso ginasial-científico, José Milton Barbosa. Era um sargento do
exército e - para mim, surpreendentemente - envolvera-se nas lutas
políticas. E me perguntei então, como um cara tão doce, fala mansa, que
ficava de porre com um copo de cerveja, que escolhera o bolo-paraquedas
(aquela coisa horrorosa envolvida por uma forminha de papel) como
tira-gosto, que pouco falava de política... Ah, meu Deus, como Zé
Milton haveria de se envolver numa dessas siglas de combate à ditadura e
morrer a tiros, ele também armado, na defesa de sua companheira de luta?

Espargi, sobre esse início de ano, mais um pouco de minha raiva, de meu
inconformismo, de meu cuspe, de minhas lágrimas...

Agora recebo de meu amigo Vô Luiz esta carta ao jornal O Globo, da filha do
Prestes, recusando essa escrotérrima bolsa-ditadura. Foi por isso que me
lembrei do meu honrado parceiro Zé Milton. Se vivo, tenho certeza, ela
recusaria essa nódoa e mandaria esses oportunistas tomarem no cu.

simão

A carta de Leocádia:

À Redação de “O Globo”
RJ, 13/01/2010





Tendo em vista matéria publicada em “O Globo” de hoje (p.4),
intitulada “Comissão aprovará novas indenizações” e na qualidade de filha de
Luiz Carlos Prestes e Olga Benario Prestes, devo esclarecer o seguinte:

Luiz Carlos Prestes sempre se opôs à sua reintegração no
Exército brasileiro, tendo duas vezes se demitido e uma vez sido expulso do
mesmo. Também nunca aceitou receber qualquer indenização governamental;
assim, recusou pensão que lhe fora concedida pelo então prefeito do Rio de
Janeiro, Sr. Saturnino Braga.

A reintegração do meu pai ao Exército no posto de coronel e a
concessão de pensão à família constitui, portanto, um desrespeito à sua
vontade e à sua memória. Por essa razão, recusei a parte de sua pensão que
me caberia.

Da mesma forma, não considerei justo receber a indenização de
cem mil reais que me foi concedida pela Comissão de Anistia, quantia que
doei publicamente ao Instituto Nacional do Câncer.

Considerando o direito, que a legislação brasileira me confere,
de defesa da memória do meu pai, espero que esta carta seja publicada com o
mesmo destaque da matéria referida.

Atenciosamente,

Anita Leocádia Prestes

CPF 059050957/87

RG 1492888 IFP/RJ

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Jorge Simão, o Curuca, é presidente da Casa Lima Barreto (visite o site lá em baixo)

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