terça-feira, 12 de janeiro de 2010

O corpo e o crack

Carlos Augusto de Araujo Jorge



Deitado, suado, surrado, chapado.


Magrela, teimoso, ausente, banguela.


Está vivo? Está morto? Ou apenas dopado?


É um corpo, ao relento sem cobertas, sem velas.



É uma rua, é passagem com povo e não vê...


Passam carros, ambulâncias, polícia e gente.


Tem um corpo estendido, inerte e pra quê?


Ninguém vê, ninguém olha, inexiste, não sente.



Ao lado acolhem-se bichos, é digno e tem seu valor...


D’outro lado a lixeira, são dejetos, fedor.


Em sua frente uma UPA, que parece não ver...


Essa pobre criança em seu desfalecer.



Ao seu lado a cruel companheira... a pedra.


Que o alucina e conforta em busca de qualquer prazer.


Deste canto não arreda tal qual fosse a sina.


De alguém que não vê a razão do seu ser.



Tem família? Com certeza. Só não pode ir mais lá.


Tem amigos? Ignora, o da vez vai chegar.


A doença, a moléstia? Já não sabe nem viu...


Muita sede e fome com certeza sentiu.



Essa criança sou eu, é você, somos nós...


Que ingênuos, pensamos quão longe é o mal


Mas são tantos os outros cracks que nos chegam, destino atroz!


Que nos chapam e nos deixam num egoísmo fatal.



Lá na frente é a raiva, um vazio sem vida


Com certeza, bem logo a cobrança virá.


Nossos Eus destroçados, emoções descabidas


Vagarão nas vielas onde jamais pensaríamos estar.

Nenhum comentário: