(Geraldo Borges)
Minha mulher me deixou, e levou com ela o nosso filho, o meu
filho. Ele tem dezesseis anos. É um adolescente, muito influenciável. Pelo que
eu estou vendo ela quer afastar o menino
da minha companhia. Já arranjou até um amante. Os três estão passeando. Só vão
chegar daqui a uns quinze dias. Antes que eles cheguem vou ter que bolar um
plano para ter o meu filho de volta, do contrario eles vão fazer do meu filho um monstro.
Hoje, aqui em
casa, dei uma entrada no antigo quarto do meu filho e fiquei olhando os seus
brinquedos abandonados, entre eles os seus livros infantis. De repente abro um
deles, ilustrado. Nisso me deparo com a história de um menino que caía na
água e ficava gritando que estava
morrendo afogado por pura brincadeira,até ninguém acreditar mais nele.
Antes de
terminar a história entendi tudo. E tive um estalo. Estava ali a chave do meu
plano. Um simples conto para crianças me
abriria as portas para um crime perfeito. Agora era começar a agir.
Enfrentar o mundo do crime. Enquanto eles não chegassem da viagem eu executaria
a primeira parte do plano.
No outro dia
li no jornal a manchete de um crime. Tinham assassinado uma mulher. A primeira
coisa que eu fiz foi chegar na Delegacia
e declarar que eu tinha matado a dita cuja. Falei ao delegado.
- Foi eu que matei a mulher.
O delegado
olhou para mim. Estudou a minha fisionomia com um ar de náusea. E não
acreditou. Lá no fundo de sua experiência com marginais descartou a hipótese de
eu ser um criminoso. Mesmo assim mandou-me trancar por um dia em uma sela.
Claro que não encontrou ainda o criminoso. Não se encontra um criminoso da
noite para o dia. Mas tem certeza que não sou eu.
Quando me pôs
em liberdade eu fui para casa, certo de que o plano estava começando a dar
resultado. E logo me esqueci da advertência do delegado que me dissera, na
minha saída.
- Não me
apareça mais aqui.
Voltei lá mais
algumas vezes. Graças a Deus era o mesmo delegado de plantão. Eu disse as
mesmas coisas, como um menino que estava se fazendo de afogado. Tinham cometido
outro assassinato. Estava sempre havendo crimes na cidade. Fui preso de novo
pelo desaforo. Desta vez dois dias. Das outras vezes não fui mais trancafiado.
Estava me tornando uma figura folclórica na cidade: certas pessoas já
declinavam uma para as outras:
- Lá vem o
assassino.
Estava tudo
dando certo.
Foi então que
a minha mulher, seu amante e meu filho chegaram. Eu sabia muito bem em que apartamento eles estavam. Morávamos no mesmo
condomínio. Fui lá mais ou menos à meia noite. Mas precisei primeiro saber se
meu filho estava com ele na hora da minha visita. Telefonei perguntando pelo
garoto. Não estava. Tinha ido ao shopping Muito bem. O plano está quase sendo
concluindo
Antes de sair
fui ao quarto do meu filho, e reli a história infantil do menino brincando de
morrer afogado. E comecei a rir e ficar
sério ao mesmo tempo. Fechei o livro, com tanta força que matei um
pequeno inseto que atravessava as suas paginas. Peguei o meu revolver na gaveta
do criado mudo de meu quarto. Com muito cuidado o enrolei em uma flanela
vermelha. Apaguei a luz do meu quarto e me dirigir ao apartamento deles.
Subi o
elevador em direção ao sexto andar. O numero do apartamento era 666. Estremeci.
Toquei a campainha. A minha ex - mulher me olhou pelo olho mágico. E viu meu
rosto deformado. Abriu a porta. Entrei e disparei bem na sua testa, quase a queima
roupa. Enquanto ela morria nos braços de
seu amante eu aproveitei o descuido para liquidá-lo. Os dois caíram juntos.
Limpei a arma com a flanela que eu tinha trazido e deixei a arma no chão ao pé
do cadáver.
Retirei-me
silencioso e sorrateiramente.
De manhã eu
estaria na Delegacia. O delegado me passaria mais uma recriminação e me
mandaria para casa. e eu iria embora satisfeito com o plano realizado. Aí
terminaria a minha história para a minha felicidade e a de meu filho. Ele até
poderia chorar um pouco em meu ombro pela morte de sua mãe. Mas era forte e
jovem e logo esqueceria toda a tragédia.
De manhã
cheguei a delegacia e disse ao delegado;
- Foi eu que matei a minha mulher e seu amante.
O delegado
recebeu-me indiferente e disse;
- Não. Você
não os matou. Já pegamos o criminoso. Veja ele ali, está na sela. Era o meu
filho que estava detrás das grades. Sem ter o que dizer, falei de novo:
- Mas fui eu
quem os matou. Meu filho está fora disso
Vou explicar o
que aconteceu. Logo que eu saí meu filho chegou. Invadiu o local do crime.
Pegou a arma. Tudo porque fui ler um conto infantil com o espírito maligno de
um adulto.
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