domingo, 18 de março de 2012

A Moça Velha, a Moça Nova e o Cabeça de Cuia

Edmar Oliveira

Teresina tem fama em todo país de ter as mulheres mais lindas e os homens mais feios. Sorte nossa que elas já estão acostumadas com nossos defeitos. Mas elas são belas e cantadas em todo canto desse imenso Brasil. E a nós fez exigentes com a beleza delas. Fogosos baixinhos esmirradinhos, se achando!  

O símbolo da beleza feminina de Teresina tem 72 anos de beleza e graça, que num por do sol é atravessada pelas cores rubras do ocaso na linha do equador, emoldurando uma pintura surreal, assombreando sua silhueta no leito manso do velho monge. A moça velha carregava a linha férrea atravessando as águas, primeira ponte entre os dois estados, ligando as margens que o rio, como uma longa coluna vertebral, faz a fronteira natural. E bela, quanto mais velha mais bela, ilumina em mim as recordações da minha terra. Não tem Teresina sem a ponte João Luis Ferreira, nome de um governador da terra que foi amigo de Lima Barreto e mereceu dele a dedicatória do Policarpo Quaresma. E o rio Parnaíba é o velho monge, na imagem poética de Da Costa e Silva, nosso simbolista de Amarante. A ponte metálica, como nós a chamávamos carinhosamente, símbolo da cidade e vistoso cartão postal todo ligado à poesia.  

Mas eis que uma moça nova se assanhou por cima do rio Poty, ligando a cidade antiga aos bairros modernos e chiques da zona leste, e vem tomando o lugar da moça velha no coração dos jovens teresinenses. A ponte estaiada, sem um pilar dentro do rio, é sustentada por estaias metálicas que se seguram numa pilastra. No cume dessa pilastra, ligada por elevadores, tem-se a vista da chapada do corisco. A moça nova nos seduz pelo alcance de sua beleza até onde a vista alcança, sem botar o pezinho n’água.  

Confesso que as curvas da moça nova tem uma graça singular da beleza de juventude. Rebola com graça e sensualidade atirando-se de um lado a outro do outro rio dessa cidade, que tem no encontro das águas a lenda trágica do Cabeça de Cuia. A lenda matricida do Cabeça de Cuia é nossa: Crispim, o pescador desesperado dos rios, por não encontrar neles os peixes desejados mata a mãe com um osso de boi servido com água na sopa rala por falta de tudo. A mãe, antes de morrer joga uma praga: ele vagaria como um monstro nas águas, com uma cabeça enorme a boiar, até devorar sete virgens de nome Maria. A moça nova nem bota o pezinho n’água, com medo do Cabeça de Cuia.  

A cidade ficou encantada com a moça nova e esqueceu da moça velha. Há muito tempo tiraram o trem dos seus trilhos. Asfaltaram seu chão de dormentes de madeira e fizeram semáforos de lado e outro da ponte, pois ela só permite um carro por vez. Li agora, entristecido, que os semáforos queimaram e nenhuma autoridade se responsabiliza pela manutenção da ponte metálica. Interrompeu-se o trafico, abandonaram a moça velha que chora pedaços metálicos enferrujados no rio Parnaíba.

Embora a moça velha esteja com os pés dentro da água, nem o Cabeça de Cuia a quer mais. Ela não é mais virgem. E eu choro pela minha moça velha, ainda tão bonita, apesar de maltratada.   




4 comentários:

PONTO DE CULTURA ÁUDIOVISUAL ABD/ANTARES disse...

Adorei!!

Simone pinturas e crochês disse...

Olá Edmar!
Por sorte encontrei seu blog, achei muito interessante! Vou voltar mais vezes, pois realmente amei!
Um beijo e tudo de bom!

Rubens de Figueiredo disse...

muito bom Taba!!!

Ribamar Rodrigues disse...

Muito bom! A mente viajou. Lá pelas tardes, eu atravessa muito a nossa bela ponte, para ir jogar bola nas croas, quando elas apareciam do lado de Timon. Lembro-me que ter visto o Cineas Santos e o Albert Piauí também jogando num determinado tempo. Deu vontade de compartilhar esse ótimo texto com meus amigos do facebook. Permite? Valeu. fui.....