quinta-feira, 17 de abril de 2008

EXILIO E LITERATURA

Geraldo Borges


Geralmente os exilados sentem-se estranhos no ninho, principalmente logo que chegam ao seu novo meio. Levam tempo para se adaptar, conhecer pessoas do seu mesmo estado, da sua mesma cidade, fazer amigos, ser considerado. O exilado não esquece a sua terra, mesmo que em certas circunstâncias ela lhe tenha negado o pão. Ninguém esquece a terra onde passou a infância porque a infância é a descoberta do mundo. A fase da vida em que descobrimos os nossos fantasmas, o nosso lobo mal e nos reconciliamos com ele.


Mas o exílio tem as suas vantagens, como toda moeda, com a sua cara e coroa. Ele nos coloca em relação com a criatividade literária. A vantagem do exílio é o distanciamento e a nova visão do que deixamos para trás. Dificilmente percebemos com intensidade o que está muito perto de nossos olhos.

Gonçalves Dias que se auto exilou a procura de saúde ficou famoso com o seu poema a Canção do Exílio. Minha terra tem palmeira onde canta o sabiá. As aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá. Seu poema é tão famosos que alguns de seus versos fazem parte do hino nacional. Poderia oferecer outros exemplos de autores brasileiros, no exílio. Mas, por enquanto, me abstenho, já que o próprio leitor ilustrado pode se lembrar de alguns, se quiser, principalmente se ele também tiver passado pela experiência do exílio.

Por falar em Gonçalves Dias, exilado por questão de saúde, me lembrei de Thomas Mann autor da Montanha Mágica, este romance é feito de personagens que se exilaram em um sanatório na Suíça para se tratar de tuberculose. O próprio autor passou muito tempo exilado. Nos EUA fugindo da perseguição nazista.

Manuel Bandeira, como Gonçalves Dias, também foi um exilado por força da saúde. Em 1913 esteve se tratando em um sanatório de Clavadel, perto de Davos Platz, Suíça. Ali ele escreveu o seu primeiro livro de poesia – Poesias Melancólicas. Onde, com certeza, expressa a saudade de sua terra. Ao deixar o sanatório esqueceu os originais. Tentou refazer o livro depois. Mas não o conseguiu integralmente. O poema Alumbramento data desta época,. O poeta diz: Eu vi o mar/ Lírios de espumas/Vinham desabrochar à flor/ Da água que o vento desapruma... Em 1914 o poeta retorna para o Brasil.

Jorge Amado, por exemplo, esteve muito tempo no leste europeu. e de lá deve ter visto melhor a Bahia e os seus personagens. Outros escritores estiveram exilados por força de seu próprio trabalho, diplomata, Murilo Mendes passou a sua vida quase toda na Itália, e também escreveu a sua Canção do Exílio. Um fragmento.

(.. Eu morro sufocado
Em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
Nossas frutas mais gostosas
Mas custam cem mil réis a dúzia.

Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
E ouvir uma sabia com certidão de idade.

Clarice Lispector, por força de seu casamento com um diplomata, viveu no exílio. Os exemplos são muitos. Mas como eu já falei. O leitor vá atrás dos exemplos para que tenha o prazer de se sentir um colaborador da crônica. O poeta Ferreira Gullart esteve exilado por motivos políticos. Entrou num Rabo de Foguete como diz em seu livro de memórias, e, no exílio, doido para voltar para casa escreveu o seu Poema Sujo. Já saiu mais alguns exemplos leitor precioso? Se não, vou dar mais um e parar por aqui.


Trata-se de Graciliano Ramos, o velho Graça, como era conhecido entre os amigos. Quando saiu do cárcere teve que ficar no Rio de Janeiro, longe de seu Nordeste, praticamente exilado, e, pior, tuberculoso. E ali na antiga capital federal escreveu o melhor de sua obra: Vidas Secas, Infância, Memórias do Cárcere. Todos esses textos fundamentados na vivência redescoberta com a sua terra natal.
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Geraldo, o Borges exilado... Igual a um psicanalista o crítico interpreta quem se atreve a escrever.

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelo artigo. "Extraterritorial", de George Steiner, fala um pouco sobre o século XX e a existência de vozes fronteiriças, advindas dos deslocamentos dentro do mundo moderno.
Abraço,
Marinho.