quinta-feira, 17 de abril de 2008

OS NOVOS PECADOS

Edmar Oliveira




Desde minhas primeiras aulas de catecismo, quando catequizar era um assunto sério de primeira importância, ficava encasquetado com os pecados chamados “veniais”. Pecados veniais, derivados do termo jurídico, eram pecados dignos de vênia ou perdoáveis, mas mesmo assim um pecado, que nos diminuía aos olhos de Deus. A minha preocupação de então era a transformação de quantidade em qualidade. Alguém me disse, e estes dizeres da igreja são terríveis, que vários pecados veniais podiam virar um “mortal”. Pecado mortal, ao contrário do venial, não tem perdão. Quantos dos pequenos valiam um grande? Essa era meu tormento, mesmo porque os veniais podiam ser cometidos a todo o momento. Inveja, cobiça e preguiça, quem não tropeçava neles todo dia? Orgulho, ira e gula, vez por outra não nos aconteciam? Luxúria eu não sabia bem o que era, mas imaginava ser um pouco de sacanagem. E desejar a mulher do próximo já não era um “mortal”? Tava aí o perigo da mutação...

Com o esmaecer de minha fé os pecados veniais sumiram na poeira do tempo. E alguns dos mortais ficaram sem qualquer importância quando a pós-modernidade premia o individualismo muito acima da fé na humanidade. Eis que a igreja católica tenta uma atualização dos Pecados Capitais, agora conhecidos como Pecados Contemporâneos.

Quando conheci a nova lista lembrei dos meus temores passados no tempo do catecismo. Mas tenho certeza que ficaria muito mais tranqüilo do que fui nos meus medos da fé. Posso ter cometido uma “Poluição Ambiental” qualquer, mas não da importância de um pecado. “Manipulação Genética” parece um pecado reservado aos cientistas. “Acúmulo de Riqueza Excessiva” é um pecado permitido para muito poucos em nossa desigualdade social. “Violação de Direitos Fundamentais da Natureza Humana” está na lista de pecados dos que foram adeptos da ditadura militar de triste memória ou dos policiais e bandidos de agora. “Infligir Pobreza” e “Experimentos Moralmente Questionáveis” me parecem pecados que só podem ser cometidos pelos políticos e que acontecem mais facilmente em Brasília. Portando, agora que já não sou mais católico, acho que a Igreja acertou na culpabilização de quem de direito.


E eu sempre estou num momento errado para enfrentar a realidade. Quando tinha medo do inferno ficava preocupado com os antigos Pecados Capitais. Pena que hoje não acredito mais no inferno. Pois seria bom ver no fogo eterno os que cometem os pecados contemporâneos, os quais não ameaçam minha existência...

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ILUSTRAÇÃO: "Anjo Distraído" de Paulo Moura

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