domingo, 7 de fevereiro de 2016

PRECONCEITO EXPLÍCITO


(Edmar Oliveira)

Os argentinos costumam invadir as praias de Santa Catarina, no verão, para divertimento. Os nordestinos também, para trabalhar. Eles estão oferecendo redes, cangas, castanhas, queijo coalho. Os argentinos compram as bugigangas e se divertem com aqueles “macaquitos hablantes” como muitos se referem aos nordestinos. Os hoteleiros e donos de bares, alguns também argentinos ou outros brancos europeus, não gostam dos nordestinos.

O nordestino que carrega redes e cangas trabalha para um caminhoneiro dono da mercadoria. Os trabalhadores são explorados pelos patrões motoristas dos caminhões – que por sua vez são explorados por donos de fabriquetas ilegais nas capitais nordestinas. Às vezes, a mercadoria viaja em consignação. Mas o mais explorado é o vendedor de praia. Trabalha do nascer do sol à tarde da noite, enquanto tem gente na praia, e dorme no caminhão com as redes ou embriagado ao relento na areia da praia.

Tem que ter uma história convincente para vender a mercadoria um pouco além do valor cobrado pelo caminhoneiro. Esse é o seu lucro. Geralmente, quando acaba a mercadoria, guarda o do patrão no bolso e gasta o seu lucro com cachaça. São comuns as desavenças, principalmente quando um pouco do dinheiro do patrão é transformado em cachaça. As brigas são constantes. A peixeira a arma das desavenças.

Semana passada duas notícias estamparam os jornais sobre estes trabalhadores nordestinos, detonando o preconceito explícito dos sulistas com estes meus conterrâneos: uma notícia duvidosa e outra trágica. Mas ambas carregadas do preconceito étnico:

A primeira falava de um surto de gastroenterite nos frequentadores das praias de Floripa. Mesmo com as autoridades atestando o nível de poluição da água frequentada pelos banhistas, donos de hotéis faziam uma campanha contra a presença dos nordestinos nas “suas” praias: a culpa era do queijo coalho!

A tragédia aconteceu num domingo às duas da tarde. Um nordestino foi esfaqueado, talvez numa briga entre eles. Morreu falando o nome do agressor. O corpo permaneceu entre os banhistas sem estragar a diversão dos frequentadores. Como se fosse um animal sem a menor importância.
Estes episódios talvez contribuam para a expulsão dos nordestinos das praias de Floripa. O fascismo não quer a apuração dos fatos, mas a anulação do outro.

Razão para Márcia Tiburi, quando afirma:

 “O fascismo é, em qualquer sentido, uma aberração política, mas cujo fundo existencial é a profunda miséria subjetiva de nossa época. Seu cogito: humilho, logo existo. Ele serve como prova de si para quem vive vazio relativamente ao pensamento, aos afetos e à própria ação. O fascista deve pensar que “é alguém” por meio da transformação do outro em “ninguém”. 

desenho: 1000TON










Um comentário:

Anônimo disse...

Bem...o carnaval chegou e eu por aí na alegria contagiante do Boitatá. Mas o Piauinauta chegou junto e eu não posso deixar de dizer da minha tristeza diante desse preconceito contra o nordestino...já me lembraram uma vez que eu não era do Nordeste,mas a alma da gente tem dessas coisas, e doeu em mim.
Lelê