Os argentinos costumam invadir as praias de Santa Catarina,
no verão, para divertimento. Os nordestinos também, para trabalhar. Eles estão
oferecendo redes, cangas, castanhas, queijo coalho. Os argentinos compram as
bugigangas e se divertem com aqueles “macaquitos hablantes” como muitos se
referem aos nordestinos. Os hoteleiros e donos de bares, alguns também
argentinos ou outros brancos europeus, não gostam dos nordestinos.
O nordestino que carrega redes e cangas trabalha para um
caminhoneiro dono da mercadoria. Os trabalhadores são explorados pelos patrões
motoristas dos caminhões – que por sua vez são explorados por donos de
fabriquetas ilegais nas capitais nordestinas. Às vezes, a mercadoria viaja em
consignação. Mas o mais explorado é o vendedor de praia. Trabalha do nascer do
sol à tarde da noite, enquanto tem gente na praia, e dorme no caminhão com as
redes ou embriagado ao relento na areia da praia.
Tem que ter uma história convincente para vender a
mercadoria um pouco além do valor cobrado pelo caminhoneiro. Esse é o seu
lucro. Geralmente, quando acaba a mercadoria, guarda o do patrão no bolso e
gasta o seu lucro com cachaça. São comuns as desavenças, principalmente quando
um pouco do dinheiro do patrão é transformado em cachaça. As brigas são
constantes. A peixeira a arma das desavenças.
Semana passada duas notícias estamparam os jornais sobre
estes trabalhadores nordestinos, detonando o preconceito explícito dos sulistas
com estes meus conterrâneos: uma notícia duvidosa e outra trágica. Mas ambas
carregadas do preconceito étnico:
A primeira falava de um surto de gastroenterite nos frequentadores
das praias de Floripa. Mesmo com as autoridades atestando o nível de poluição
da água frequentada pelos banhistas, donos de hotéis faziam uma campanha contra
a presença dos nordestinos nas “suas” praias: a culpa era do queijo coalho!
A tragédia aconteceu num domingo às duas da tarde. Um
nordestino foi esfaqueado, talvez numa briga entre eles. Morreu falando o nome
do agressor. O corpo permaneceu entre os banhistas sem estragar a diversão dos
frequentadores. Como se fosse um animal sem a menor importância.
Estes episódios talvez contribuam para a expulsão dos
nordestinos das praias de Floripa. O fascismo não quer a apuração dos fatos,
mas a anulação do outro.
Razão para Márcia
Tiburi, quando afirma:
“O fascismo é, em qualquer sentido, uma aberração política, mas cujo
fundo existencial é a profunda miséria subjetiva de nossa época. Seu cogito:
humilho, logo existo. Ele serve como prova de si para quem vive vazio
relativamente ao pensamento, aos afetos e à própria ação. O fascista deve
pensar que “é alguém” por meio da transformação do outro em “ninguém”.
Um comentário:
Bem...o carnaval chegou e eu por aí na alegria contagiante do Boitatá. Mas o Piauinauta chegou junto e eu não posso deixar de dizer da minha tristeza diante desse preconceito contra o nordestino...já me lembraram uma vez que eu não era do Nordeste,mas a alma da gente tem dessas coisas, e doeu em mim.
Lelê
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