(Edmar Oliveira)
O Capítulo V de “Os Sertões”, parte em que ainda trata da
TERRA, já no primeiro subtítulo, Euclides da Cunha chama atenção para “uma
categoria geográfica que Hegel não citou”. Está falando dos sertões nordestinos
e de sua ocupação.
Tirante as ilhas e os habitantes do litoral, que fixam o
homem pelo que o mar pode lhe fornecer, o pensador alemão dividiu o interior do
continente como Vales Férteis, que prendem o homem à terra de onde tiram o
sustento; e as Terras Inférteis (desertos, terras inundáveis, savanas com secas
prolongadas), que produzem os nômades viajantes que não retornam – procurando sempre
a terra prometida.
Do que o alemão não falou, Euclides faz uma análise minuciosa
da terra sertaneja: nos períodos de seca aproxima-se aos desertos para expulsar
o sertanejo. Nos períodos chuvosos é um vale fértil que traz o nordestino de
volta. Os sertões, nas palavras do mestre escriba brasileiro, são “Barbaramente
estéreis. Maravilhosamente exuberante”. Muda a paisagem na seca e na cheia. O
nordestino é um retirante que volta.
Sempre fiquei impressionado com essa passagem de os Sertões,
só descoberta depois de grande, pois na escola meus professores “recomendavam”
saltar a TERRA para irmos direto à ação do HOMEM – antes de tudo um forte.
Estou falando dessa Terra, planeta que agoniza na mão do
homem, mas ao mesmo tempo mostra uma força de recuperação enorme. Estávamos a
assistir uma seca abissal, consequente a fenômenos de efeito estufa, aumento da
temperatura, degelo nas calotas polares, aumento dos oceanos. Tentaram me
explicar o El Niño, que, confesso, nunca entendi direito. Quando o planeta
reage vigorosamente.
Este foi um inverno de grandes nevascas no hemisfério norte
e uma estação das chuvas maravilhosa no hemisfério sul. Pra nós do nordeste a
estação das chuvas é inverno – que o clima não muda mesmo. Mas assistimos, de
forma gratificante pra mim, um verão no Rio melhor que o inverno passado. No
meu nordeste, o Rio São Francisco renasceu exuberante, o Benjamin Guimarães
apitou singrando as águas de Pirapora – como há muito tempo não fazia; os rios
secos do Ceará correram seus leitos há muito esquecidos; Teresina ficou muito
tempo “bonita pra chover”, Caicó lavou a alma do sertão de sol inclemente. E o
verde renasceu daquele cinza desbotado da caatinga.
Eu, cá com meus botões, imagino que os cientistas – explicadores
da meteorologia – foram apanhados com as calças na mão. Nada disso estava nas
suas previsões.
O velho Euclides da Cunha, lá no capítulo que citei acima,
reforça nos seus sérios estudos sobre a terra dos sertões a magia da crença dos
sertanejos. Para estes, se chover, como choveu agora, entre o 12 de dezembro e
o 19 de março teremos um inverno dos bons. Os cientistas podem aproximar essas
datas do solstício de verão e equinócio de outono. Euclides reforça esse
período como a certeza que se estabeleceu no sertão e que não falhou nos
levantamentos historiográficos que fez de anos anteriores aos períodos de seca
e de cheia. Mas não diz que o sertanejo se baseia é na fé entre o dia de Nossa
Senhora e o dia de São José.
E eu, não sei por que, tô com vontade de voltar!
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