domingo, 21 de fevereiro de 2016

BOB LESTER



(Edmar Oliveira)

A Ilustrada da FOLHA trouxe uma matéria, semana passada, assinada por Fabíola Brisolla, que desconstrói a lenda de Bob Lester, morto no final do ano passado com quase cem anos ou mais de cem (não se sabe ao certo).

São várias as reportagens com as histórias de Bob Lester, publicadas na imprensa por todo século XX e nestes quinze anos de XXI. Bob era sapateador, com o nome de Edgar (sobrenome Negrão de Lima), que dizia ter feito parte do Bando da Lua, acompanhantes de Carmem Miranda. Era apenas uma história repetida várias vezes com fotografias onde se dizia ser um dos componentes do Bando (variava o personagem que ele assumia). Virou verdade. Dizia que era gaúcho, que foi Bob Hope quem sugeriu seu nome artístico e que sapateara com ninguém menos que Frank Sinatra. Para configurar o passado dizia que quando voltou ao Brasil, morou no Copacabana Palace, por ser amigo de ninguém menos que Jorginho Guinle. Inventou ainda uma tragédia com a família (teria perdido num acidente de carro a mãe, a esposa e duas filhas). Após isso sua vida degringolou. Viveu como mendigo pelas ruas. Chegou a dar entrevista no Jô Soares e conquistou a fama de ex-sapateador famoso, que após uma tragédia perdeu tudo. História comum que a vizinhança costuma inventar para seus mendigos. Desta vez o próprio mendigo criou a lenda.

Mas até morrer, embora na miséria, Bob Lester se fez acreditar na sua história inventada. A matéria diz que nem Edgar era seu verdadeiro nome. Talvez uma primeira invenção. Ruy Castro quando fez a biografia de Carmem Miranda não encontrou registro do passado de Bob Lester, porque não tinha. Mas não o destruiu, preferiu omitir e confirma isso à reportagem. Bob teria procurado Ruy no Museu da Carmem Miranda e perguntou: “Seu Ruy, preciso comer. O que vou fazer?”, por saber que o pesquisador sabia da sua farsa. Ricardo Cravo Albin, mesmo sabendo a verdade, confessa que mentiu para proteger o simpático velhinho, que ainda conseguia cachês para exibir seu sapateado. Era um artista fingindo ser Bob. E até tinha ainda uma história de que fora goleiro de um time gaúcho e tinha enfrentado o lendário Heleno de Freitas. Mas a lenda era Bob Lester.

Impressionante a história deste homem que criou para si um passado fictício que todos acreditaram, inclusive ele próprio.

Geralmente a vizinhança inventa para seu mendigo predileto um passado de glória e riquezas, que por, quase sempre, uma paixão não correspondida, ficou “aluado” e virou mendigo. Quase sempre essas lendas são falsas, desejo de quem a inventa para justificar uma situação incompreensível. Mas o Bob Lester foi um artista inventado por ele mesmo. Teve dinheiro, era amigo de Jorginho Guinle, conheceu Frank Sinatra e Bob Hope, cantou e sapateou com Carmem Miranda, saiu do foco e acabou na sarjeta. Foi por estar na sarjeta que inventou a lenda.

Interessante a atitude dos pesquisadores que não quiseram prejudica-lo e só  revelaram seus segredos, que destruiria o personagem, após a sua morte.

Me lembrou o famoso faroeste “The Man Who Shot Liberty Valance” (O Homem que Matou o Facínora – em português), e a conclusão final do jornalista: “se a lenda é maior que o fato, publique-se a lenda”.

Eu também conheço um Bob Lester e talvez um dia conte essa história – ou a lenda!


Bob Lester em frente ao Copacabana Palace, onde costumava ganhar uns trocados contando sua "história".

A reportagem:

www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/02/1738969-bob-lester-e-sua-trajetoria-inventada.shtml


Um comentário:

Anônimo disse...

Acho que não dá para dizer nem que sim nem que não.
A vida de Bob não foi uma completa mentira. Na matéria de hoje, 21-02-16, do Jornal Extra, "O Mistério de Bob Lester", há inclusive fotos de quando ele era novo, e muito bem vestido, ao lado de Nelson Gonçalves e ao lado de Procópio Ferreira e outros artistas. E nela o pesquisador Albin não exclui totalmente a participação dele no grupo, como antes havia mostrado a reportagem da Folha.
A vida de Bob continua sendo um mistério. De que forma uma pessoa de família tão humilde,em tempos tão remotos, poderia ter aprendido a sapatear e cantar em várias línguas? Provavelmente, se tivesse ido lá para fora e, como a própria família atesta nesta reportagem do Extra, Bob Lester desapareceu por uns trinta anos.