(Edmar Oliveira)
As religiões monoteístas sempre tentaram que seus livros
sagrados fossem o código de conduta de uma sociedade. E, enquanto se confundiu
com o Estado, era heresia não se acreditar no deus católico, que em nome de seu
profeta, o Messias, queimou judeus na inquisição. Também foi em seu nome que se
declarou que os índios não tinham alma, assim como os africanos, por não
professar a fé do colonizador, que a Igreja respaldou a matança dos nativos e a
escravidão de um povo.
Os judeus, povo que se acha eleito do deus de Abraão, foi escravizado
por séculos no Egito até que Moisés os guiou a terra santa. Mas a terra já
tinha outros donos e o povo judeu se espalhou pelo mundo unido pela fé de que o
seu deus lhe daria a pátria um dia. Na segunda guerra, vítima do nazismo, quase
foi exterminado. Depois da segunda guerra conseguiu parte da terra prometida e
a ferro e fogo expandiu suas fronteiras submetendo seus inimigos, pela fé, a
suplícios semelhantes aos que sofrera. Mas a republica sionista parlamentarista
está mantida. Para azar dos árabes expulsos da sua (deles) terra a guerra
continua submetendo uma cultura, que também tem livro sagrado, pelos
ensinamentos sagrados dos hebreus. Por sorte de quem mora longe, o povo eleito
tem uma nação única.
Em nome da civilização o Estado afastou a Igreja do seu seio
para se declarar laico. Mas olhando para trás, a Europa cristã e suas colônias
deixaram um rastro de sangue com que escreveram a história de uma dominação.
Porque no princípio era o verbo e a guerra era santa. A Andaluzia
é testemunha da cultura árabe que dominou a Europa um dia e foi expulsa pelos
reis católicos em nome de deus. Hoje os árabes voltam à Europa como refugiados
das guerras em suas terras extenuadas de riquezas que foram tomadas pelo
colonizador europeu. Vivem em guetos, oprimidos e discriminados por uma Europa
que tem medo inconsciente do seu passado.
O islamismo, a religião monoteísta mais nova, assimila todas
as outras em nome do profeta Maomé. Acham o Torá judaico e as Escrituras
cristãs livros incompletos na revelação de Deus. Descendem também de Abraão,
acham Moisés e Jesus profetas, mas que não tiveram a perfeita revelação de
Maomé. O profeta Maomé recebeu do anjo Gabriel os ensinamentos de Alá inscritos
em omoplatas e couro de carneiro. É o mesmo mito de Moiséis e de Jesus, mas o
Alcorão recebido por Maomé dita um código de conduta que não permite separar o
Estado da sociedade e da religião. E as repúblicas ou califados islâmicos
foram, são e serão sangrentos. Uns mais, outros menos. Até que o estado deles seja laico. E o livro sagrado seja metáfora.
Entretanto, por ser uma religião "nova", e desde o começo
confundida com o poder do Estado, inevitavelmente brigam pela disputa de qual
linhagem contém os herdeiros de Maomé. Os descendentes da própria filha do
profeta são a minoria xiita. E entre eles ainda há divisões. A maioria sunita
também não é homogênea e são vários ramos em conflitos. Para o ocidente é muito
difícil entender o conflito do oriente. E o ocidente alimenta este conflito
religioso pela esperteza econômica de negociar armas. Mas essas armas já se
voltam para alimentar uma guerra santa dentro da própria Europa.
Essa guerra santa em nome de deus é ridícula para os que não
têm fé. E em nome da fé que temos na humanidade, ridicularizar alguns mitos,
metaforicamente, é uma arma da civilização para que o ridículo possa desarmar a
guerra santa. Não deu certo para os cartunistas do Charlie Hebdo.
Por que martelo nessa tecla, se todo ato terrorista é incompreensível
civilizadamente? Porque aqui há algo mais. O ataque aos cartunistas foi em nome
do profeta real. A piada não foi compreendida na metáfora, sublime atividade
humana. A metáfora foi entendida como o próprio punhal que feriu o profeta. Aí
já não exerceria sua função. Assim nos desumanizamos. Quando a Metáfora e a Espada
não se diferem, acabou a civilização.
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