(Edmar Oliveira)
a TFP em Botafogo e o esgoto da intolerância |
Não esperava viver para testemunhar um novo ciclo da
história. Como sempre gostei da matéria na escola, aprendi esses ciclos nos
livros. A UDN, liberal e golpista, tentou um golpe de estado que o suicídio de
Getúlio evitou por dez anos. Mas conseguiu aplicar o golpe em Jango e entregar
o governo ao militares. E foram esses anos de chumbo que vivi. Eu só tinha
treze anos, mas, mesmo morando no nordeste, vi o céu escurecer, as liberdades
acabarem, os reacionários mandarem, a igreja aumentando os pecados e
restringindo o livre arbítrio, a TFP (Tradição, Família e Propriedade) com seus
estandartes medievais, pregando os valores conservadores da sociedade, ficaram
na minha retina como um símbolo de defesa das tradições imutáveis. Com a morte
de Edson Luís descobrimos que pagaríamos caro para sair do manto da repressão e
do horror.
Mas brigamos. Muitos morreram nos ideais da juventude. Uma
geração foi torturada e massacrada nos porões da ditadura. Outros protestaram
com seus cabelos longos, suas roupas extravagantes. Protestando como podiam fizeram
música, escreveram, fumaram maconha. Por vinte anos mergulhamos nos anos de
chumbo até o alvorecer da redemocratização e suas conquistas. E foram muitas. E
foi ver de novo o céu brilhar no azul dos ideais juvenis que amadureceram.
Mas já fazem 50 anos do golpe da intolerância. A lembrança
foi esquecida e só alguns velhos falam desse tempo. E sem saber, os gestos do
passado são repetidos, como que para dizer que o ciclo pode recomeçar. Nesses
tempos eleitorais a política do ódio impera. Não há argumentos, ou somos
vermelhos ou azuis. E o outro não tem razão, pois a razão está do nosso lado.
Me afastei dessa discussão maniqueísta e infértil. Mas alguns acontecimentos
desta semana me fizeram um medo da intolerância que vivi aos treze anos:
1). O colunista da Folha, Gregório Duvivier, escreveu em sua
coluna que voltava para casa no Leblon à pé e uma enorme SUV buzinou para
chamar sua atenção e um sujeito bota a cabeça pra fora e berra: “Vaza PT! Volta
pra Cuba”. Relata que nos postes cartazes ameaçam: “Aqui se vota Aécio”.
Duvivier escreve na grande imprensa e não é petista. A marca da intolerância na
zona sul é evidente.
2). O blog de Mauro Magalhães informa que num boteco da zona
sul foi gritado esta pérola da intolerância: “Preto tem que morrer na África.
Vem fazer o quê aqui?” – referente ao atendimento no Rio do africano suspeito
de contaminação por Ebola.
3). Fotos da TFP postadas na internet nas ruas do Rio. As
tradições imutáveis dos meus treze anos – que haviam sido derrotadas – voltaram
à luz do sol? Foram exatamente essas fotos que me fizeram o medo voltar. Eles
estão reaparecendo com os mesmos estandartes do passado que me assustaram
tanto.
Os vermelhos brigam e se dividem como sempre. Os azuis
aglutinam, mas é muito perigoso esse apoio da intolerância.
Um amigo psicanalista vaticinou: “Freud diz que a paranoia decompõe ali onde a histeria condensa. Será
que devo entender que a direita é histérica e a esquerda paranoica?”
Não sei se estou paranoico, mas acho que a intolerância está
histérica e se aproveitando da candidatura azul para tentar recomeçar um novo
ciclo da história. Batendo na madeira, três vezes...
Um comentário:
Não nos deixe por muito tempo Piauinauta. É que assusta tanto esse mundo à nossa volta... aqui temos um cantinho de almas afins, um lugar pra respirar...
Lelê
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