domingo, 5 de outubro de 2014

Resenha: os braços de Vênus

(Geraldo Borges)           

           A Vênus de Milo encontra-se no Louvre, sem os braços, é claro. E onde estão os braços da Venus de Milo? Vamos saber. Se bem que se encontrássemos os braços de Venus de Milo, ela deixaria de ser Venus de Milo, tamanho é o poder  dessa escultura  em nossa imaginação que já não podemos concebê-la com os braços. Mas vamos em frente atrás dos braços de Venus. Mas como Venus de Milo chegou ao Louvre? Conforme o romance Os Braços de Venus de John Appleby foi assim.

               Foi descoberta por um camponês, na ilha grega de Melo – ou, em italiano, Milo – daí o seu nome. Nessa época  Grécia estava sob domínio turco, e os turcos tinham pouco respeito por qualquer aspeto da cultura helênica (...) sendo assim uma estatua partida encontrada  num nicho de uma cidade em ruína nem era coisa a que pudessem dar importância. Mas o embaixador Francês na Turquia era um homem mais esclarecido. Comprou a estatua, apesar de partida, e embarcou-a logo para a França como presente para o seu rei, Luis XVIII. O rei, por sua vez, doou ao Louvre, onde hoje pode ser vista, e onde decerto permanecerá para todo o sempre.

               Bom. Voltemos aos braços. Eles foram encontrados na Grécia  por uma turma de arqueólogos alemães. Mas, aconteceu um imprevisto. A Guerra já estava no fim. E os Aliados estavam chegando.  Não dava tempo levar o tesouro arqueológico. Tiveram de esconde-lo na esperança de voltarem a reconquistar o terreno. E fizeram um mapa. Mas aconteceu outro imprevisto. Pior. Na hora de esconder os caixotes a tropa alemã, de elite, recusou-se a cavar  um buraco na pederneira para botar o tesouro. O arqueólogo chefe valeu-se de um bando de camponeses andrajosos  para esse serviço. E para que  não desses com a língua nos dentes, quando os aliados chegassem, fuzilou a todos. Crime de guerra.

               A guerra acabou. No romance aparece um personagem em busca dos braços de Venus. De posse de pistas,  vai para a Grécia. E perseguido justamente pelo arqueólogo alemão que matou os camponeses. Pois teme agora em tempo de paz pela sua reputação. O personagem principal vai para Atenas com uma identidade falsa. Perseguido, pega  uma pancada na cabeça e perde a memória. Mas não demora muito se recupera e enfrenta os seus inimigos. Os mesmos que já tinha enfrentado antes de perder a memória. As pistas estão bem guardadas, dentro de uma brecha de pedra no alto da Acrópole. Lá em cima seus perseguidores estão de olho nele para abocanhar os papeis. Um é morto por ele. O outro, o arqueólogo chefe, assassino, acuado, depois de rendido, pede para que ele mesmo ponha  fim  a sua vida, para que resgate com dignidade aquele momento, e, então se atira do alto da Acrópole no abismo.

            O protagonista da história  volta ao seu hotel.E depois vai a Universidade de Atenas conversar com o arqueólogo Patianos, a quem seu tio o recomendara. O arqueólogo ficou contente e acreditou na história. Agora iam encontrar os braços de Venus. Então de acordo com o mapa se dirigiram para o norte da cidade, onde o governo grego  com a ajuda dos americanos tinham terminado de construir a barragem de Maratona.

               Antes de se dirigirem para a barragem Patianos falou.

           Há um ponto que desejo discutir  em qualquer ocasião menos emocionante,  um ponto de filosofia. Como a todos nós, a ética  interessa-me, e pergunto: o indizível sofrimento que os alemães infligiram a Grécia, a dor, a fome a degradação... irá a posteridade considerar que as justifica a descoberta por ele feita em Melos, e que nós vamos trazer a luz do dia? Como grego, que tem sentimento e que não esqueceu, responderei sem hesitar: não! Mas como cidadão do mundo... Podemos concluir que, mesmo na bestialidade dos nazistas, o bem pode resultar acidentalmente.

Chegamos ao sitio onde o mapa indicava o local em que estavam escondidos os braços de Venus. O que vimos? O que o personagem principal do romance viu. O ruído de sua garganta começou como riso e acabou como soluço seco de tal maneira que Saxton saltou para a frente, receando que ele caísse. Onde fora a pederneira, brilhava a água dum lago artificial, ao fundo do qual se erguia a brancura ofuscante da barragem.

Para terminar eu me pergunto: como iríamos nos acostumar com a Venus de Milo com braços; qual das duas seria mais autêntica, mais verdadeira? Eis aí a questão.


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