(Edmar Oliveira)
Quem me ver assim mal acabado, meio torto, empenado, sempre
fracote não faz conta que fui um dos treze filhos de mãe que vingaram. Eu e
meus sete irmãos somos dos fortes. Pelo menos os mais velhos, pois os mais
novos já tiveram a ajuda da medicina da capital. Teve eu de um primeiro parto
no sertão, às beiras do Parnaíba. Depois de mim, um perdido. Meu irmão e minha
irmã mais velha, mas separada de mim por quatro anos. Depois vieram outros
quatro que vingaram, entremeados de uns tantos perdidos ou abortados antes de
serem anjos.
Mas depois de mim e o Edivaldo, minha irmã Eliane eu lembro
bem lá nos tempos de Codó, no Maranhão. Uma menina magrinha, branquela, mas com
uns cabelos alourados e cacheados que a transformavam em cópia, para os meninos
da rua, de uma estrela do cine São Luiz.
Eu e meu irmão tínhamos o dever de protegê-la e nos orgulhávamos da tarefa.
Fomos crescendo feito uma escadinha em cujos degraus ali no Maranhão chegou meu
irmão Maioba. Edinha, a única de nós genuinamente maranhense, voltou muito
pequena para Teresina, onde Moisés e Ana chegaram bem separados de nós no
tempo.
Mas de todos, eu e minha irmã éramos os mais magros, os dois
que herdaram os ossos fracos da família, mas não éramos assim tão doentes.
Tínhamos a convicção que éramos parte dos que vingaram. Minha irmã nunca se
queixou de nada. Começou a trabalhar cedo, casou e foram morar uns tempos no
litoral, na Parnaíba. Eu vim embora pro sul maravilha. O nosso contato ficou
por conta das férias e de nossos filhos que têm a mesma idade e conformação. E
passamos algumas férias juntos unidos pelos filhos.
Soube que ela teve uma
tuberculose vencida como os fortes são capazes de fazer para manter a vida no
sertão.
Depois soube da aventura que a família de minha irmã empreendeu
num fusquinha, cortando o Brasil no cumprido, vindo fixar residência numa
cidade do Rio Grande do Sul.
As notícias escassearam, ficamos meio distantes, embora eu
tenha ido uma vez lá e ela tenha vido aqui certa feita. Mas hoje eu choro por
mais contato nesta vida que é muito curta, mesmo para os fortes. E me arrependo
de não ter tido mais tempo perto da minha irmã. Quando ela ficou doente agora
fui visitá-la, encontrei-a em coma num hospital com os melhores padrões da
medicina brasileira. Sei que ela está bem cuidada, mas temi pela gravidade do
quadro. Naquele instante, na beira do seu leito de hospital, só consegui dizer –
meio com raiva – que ela estava furando a fila. Tinha dois irmãos que deveriam
morrer antes dela pela lei de chegada na terra. A minha dor foi muito grande.
Era como se tivéssemos nos desgarrando para sempre...
Um comentário:
Que palavras!
Minha mãe tem sido a inspiração de tantos textos, mensagens e homenagens nos últimos dias. Cada vez mais, me dou conta de que foi um prazer, um privilégio e, acima de tudo, uma honra conviver com ela pelo tempo que me foi permitido.
Obrigada, meu tio.
Marina Oliveira Tabosa.
Postar um comentário