Amigo(a)s,
Olhem que merda primorosa. Este poema foi publicado numa edição exclusiva para bibliófilos, fora do mercado, em tiragem numerada de 1 mil exemplares, intitulada Uns Fesceninos, organizada por Oswaldo Lamartine de Faria, com ilustrações de Poty, em 1970. O livro teve sua composição iniciada em março de 1969, mas foi interrompida por um incêndio que engoliu boa parte dele. O volume é composto do que se conseguiu recuperar. Foi proibido durante a ditadura. Por isso cuidei muito bem do meu precioso exemplar, que ganhei ainda no Piauí, antes de vir morar em Brasília.
O autor do poema é Antônio Damasceno Bezerra, nascido em Natal em 1902 e morto ali mesmo, em 1947. Boêmio, desregrado, perdeu os originais de seu (único) livro de versos "Terra Encantada". Não tinha cópia. Nem existia ainda o palavrão Back-up... Nunca chegou a publicar nada. Trabalhou no Diário de Natal, jornal católico e n'A República, em Natal. Jayme dos Guimarães Wanderley, colega de boemia, contou que, antes de morrer, Damasceno pediu à família que destruísse e ao amigos que esquecessem a coleção de poemas bocageanos que produziu ao longo da vida. Poucos escaparam, em cópias escondidas por amigos ou parentes, que desobedeceram a recomendação de sumir com tudo. Entre os quais este genial.
(Paulo José Cunha)
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TUDO É MERDA
O mundo é simplesmente merda pura
E a própria vida é merda engarrafada;
Em tudo vive a merda derramada,
Quer seja misturada ou sem mistura.
É merda o mal, o bem merda em tintura,
A glória é merda apenas e mais nada.
A honra é merda e merda bem cagada;
É merda o amor, é merda a formosura.
É merda e merda rala a inteligência!
De merda viva é feita a consciência,
É merda o coração, merda o saber.
Feita de merda é toda a humanidade,
E tanta merda a pobre terra invade
Que um soneto de merda eu quis fazer.
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