domingo, 4 de outubro de 2015

Passageiros do século vinte


(Geraldo Borges)

           
Cheguei ao mundo em 1941 em plena Primeira Guerra Mundial. Eu tinha quatro anos, quando a guerra terminou, e, me lembro, como se fosse um sonho, que o pessoal lá de casa, juntamente, com os meus primos, simpatizante dos comunistas, comemoraram a vitoria dos Aliados. Soltaram foguetes, pintaram bandeira e saíram em passeata pelas ruas da cidade. Fiquei sabendo de muitas outras coisas que não consigo relembrar. E que depois recapturei em conversas com outras pessoas ou em leituras de livro e jornais.

 Com a democratização, depois da guerra, Dutra vai eleito  ( 1946 – 1951) Legalizam o partido comunista, que concorre às eleições para a Constituinte. Uma vizinha, lá de perto de casa, na rua Campos Sales, candidata-se pelo partido, ganha apenas um voto. A alegria foi rápida. O partido é cassado, e volta à ilegalidade.

Começada a década de 1950 Getulio volta ao Poder(1951- 1954), após o seu tempo na querência. Seus inimigos da UDN o empreitam no Palácio do Catete. Ele não tem para aonde escapar, e, por isso mesmo, dispara um tiro no peito.  E deixa uma Carta Testamento. Depois de alguns suspenses, o governo  entra na interinidade. Até as novas eleições.

 Nessa época eu era um passageiro de apenas treze anos viajando de segunda classe. Não entendia nada de nada de política, a não ser a domestica, entre meu pai, minha mãe, e meus irmãos e parentes. Eu apreciava mesmo era o cinema, filmes de caubói e seriados do Zorro, no cine Rex e no Theatro. A morte de Getulio  não me comoveu. Diziam que ele era o pai dos pobres. Eu não era pobre.

            Juscelino entrou na dança das eleições  e foi eleito(1956 -1961 ), e resolveu construir Brasília, provocando uma grande imigração, principalmente de nordestinos e funcionários federais da antiga capital do Brasil a custa de salários astronômicos. Correu muito dinheiro e deve ter havido muita corrupção. Corriam  os anos dourados, era a época das grande chanchadas, da comicidade de Oscarito.

 Apareceu para substituir Juscelino um cara chamado Jânio Quadro, (1961-1961) com um farto bigode e  casaco  à gola  Mao, e tendo como símbolo uma vassoura, para  limpar  a sujeira do nosso país. Parece que foi a primeira vez que votei. Votei nele. Seu discurso parecia sincero, mas, por trás, havia muito populismo e demagogia. Homenageou  Che Guevara com uma medalha, o que deixou os militares, com a mosca na orelha. Proibiu a luta de galos. Fez bilhetes para ministros dispensando a morosidade burocrática. De uma hora para a outra renunciou  mandando para  o alto milhões de votos que o povo lhe tinha agraciado. Doidice. Culpou as forças oculta. Foram apenas sete meses de governo.

            Seu vice era de outro partido. João Goulart (1961 – 1964). Estava na China, no momento da renuncia. Voltou e quase não assume a presidência. Tiveram  que admitir o sistema parlamentarista para  que ele tomasse posse. Já era o começo do golpe. As Forças Armadas já estavam de olho em João Gullart. Ele era, de certo modo, herdeiro de Getulio Vargas, fora seu ministro do trabalho, e amigos dos comunistas, um balaio de gatos. O tempo fechou. Muitos comícios aglomerando multidões. A luta de classe tomando vulto. Eu tinha 23 anos de viagem por esse mundo cão quando deu-se o  golpe de Estado  obrigando  políticos a se refugiarem  no exílio, ou a ficarem amontoados em prisões.

            A partir daí começamos  a  contar o tempo áspero da história do Brasil. Vinte e um ano de Ditadura. Os generais brilhavam nas paradas militares. Castello Branco morreu em um acidente aéreo. Disse que logo mais iria restaurar a democracia. Quimera. As traças comeram o meu titulo eleitoral. Apareceu Costa e Silva com o rosto escondido atrás de seus óculos escuros. Depois veio Médice, o AI 5. Geisel, Figueiredo; esse não entregou o poder ao Sarney, não oficialmente de acordo com a liturgia do poder. Pois não o esperou para lhe entregar a faixa de presidente. Saiu pelos fundos do Palácio. Figueiredo  queria mesmo era o Tancredo  que seria uma rima, mas não foi a solução. Todo esse parágrafo durou vinte e um anos.

            Depois do governo do Sarney ( 1985 -  1990)  vieram as eleições diretas. Votei no Lula, ganhou o Collor, que mão demorou muito tempo, foi impedido de governar (1990- 1992). Itamar tomou a direção do governo, (1992-1994) até chegar as próximas eleições. Lula entrou no páreo, ganhou  Cardoso. Governou oito anos. ( 1915 – 2003). Finalmente dei uma dentro. Lula ganhou; O século vinte tinha acabado. O  governo do PT começou mais ou menos. Do meio para o fim  meteu os pés pelas mãos, tentando agradar a  gregos e baianos. Esquecendo a sua origem operaria.


            Acho que, como passageiro do século vinte, extrapolei  os meus limites cronológicos.  E começo a ver coisas que não tenho coragem de dizer aqui. Mas, não é preciso mesmo dizer. A esta altura da minha viagem todo mundo está sabendo. E bem que me avisaram. Mas, eu não acreditei.






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