(Geraldo Borges)
Ontem em me encontrei com Oscar Wilde em uma esquina de
minha cidade. Perguntei o que ele estava fazendo por essas bandas. Reconheci
que era Oscar Wilde, por causa de seu traje típico, aquele que a gente vê dentro
das brochuras de seus livros. Ele me disse que tinha fugido da prisão de
Reading. Notei que estava com um livro debaixo do braço, Era o De Profundis e a
Balada do Cárcere de Reading.
Oscar Wilde estava pálido, e não parecia mais aquele homem
tão conversador e elegante que animava os salões literários de Londres. Não foi fácil acreditar que estava conversando com o
próprio escritor irlandês. A maioria dos
escritores da língua inglesa é de origem
irlandesa. Para me garantir que estava
conversando com Oscar Wilde lhe perguntei se ele conhecia o conto: o rouxinol e
a rosa.
Yes. Yes, fui eu que
o escrevi.
Falei-lhe, então que o rouxinol e a rosa foi um dos
primeiros contos que me deslumbrou na minha adolescência, que o seu enredo é
doloroso, deixa a gente muito triste. Aí comecei a lhe recitar o começo do conto.
Ela disse que dançaria comigo se eu lhe levasse uma rosa
vermelha, mas não há nem uma rosa vermelha no meu jardim. O rouxinol ouvindo
esta historia começou a cantar toda a
noite com um espinho cravado no coração
até que lhe surgiu do peito ensanguentado uma rosa vermelha. O estudante
levou-a para a moça, ela não quis
mais. Já tinha outro pretendente.
O estudante jogou a sua flor na lama. Uma carroça, que vinha
na mesma direção, passou por cima.
Oscar Wilde sorriu, amargurado, tirou a sua flor da lapela e
me ofereceu. Aceitei-a. Ai ele me perguntou se eu conheci o Retrato de Dorian
Gray. Disse que sim. E que o seu enredo me impressionou muito. E que considero
o seu romance uma das obras primas da literatura ocidental. Mas a sua obra que mais mexe comigo é De Profundis e a Balada do Cárcere de Reading
que me parecem completamente diferente
do plano do resto de sua obra.
Sim. Sim. Foi feito num novo período de minha vida, quando
eu mergulhei no inferno do cárcere e
conheci outras experiências, outros homens. Na verdade a minha obra anterior é
bastante cerebral, feita com inteligência e vaidade; resultado de muita
leitura, repleta de artifícios, sem o sangue da realidade, sem o sangue do
rouxinol. No Retrato de Dorian Gray eu apenas olhava para mim mesmo, era o meu
retrato.
Não precisamos entrar no bar, sentamos em cadeiras distribuídas na calçada. E começamos a beber. Foi quando
chegou Lima Barreto, maltrapilho e com a
botas sujas de lama, cigarro no bico. Pediu uma dose de parati e disse como vai Oscar Wilde.
A esta altura eu já estava bêbado e resolvi ir embora. No
meu do caminho lembrei-me que tinha
esquecido a flor da lapela do poeta em cima da
nossa mesa. Voltei para pegá-la. Chegando lá encontrei a fossilizada no asfalto junto com tampinhas de cerveja. As
portas do bar já estavam fechadas.
2 comentários:
Q viagem legal!
Eu já imaginei um encontro como o seu, também assim, de repente, numa esquina, só que com o Mario Quintana e ele me dava flores, margaridas. Imaginei tanto, que minha gêmea fez uma foto montagem desse delírio, hum...mas acho que ficaria atordoada, sem saber o que falar...ou o surpreenderia...aí já não sei, só sonhei até aí.
Adorei o seu texto!
Lelê
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