sexta-feira, 29 de novembro de 2013
Lançamento do CD "Sérgio Samba Sampaio"
Em SAMPA
Bar SAMBA
Rua Fidalga, 308
Vila Madalena - São Paulo - SP
Alô, Alô, Pessoal de Sampa. Vamos reunir os sampaiófilos da cidade. Programa obrigatório.
domingo, 24 de novembro de 2013
Minha irmã
(Edmar Oliveira)
Quem me ver assim mal acabado, meio torto, empenado, sempre
fracote não faz conta que fui um dos treze filhos de mãe que vingaram. Eu e
meus sete irmãos somos dos fortes. Pelo menos os mais velhos, pois os mais
novos já tiveram a ajuda da medicina da capital. Teve eu de um primeiro parto
no sertão, às beiras do Parnaíba. Depois de mim, um perdido. Meu irmão e minha
irmã mais velha, mas separada de mim por quatro anos. Depois vieram outros
quatro que vingaram, entremeados de uns tantos perdidos ou abortados antes de
serem anjos.
Mas depois de mim e o Edivaldo, minha irmã Eliane eu lembro
bem lá nos tempos de Codó, no Maranhão. Uma menina magrinha, branquela, mas com
uns cabelos alourados e cacheados que a transformavam em cópia, para os meninos
da rua, de uma estrela do cine São Luiz.
Eu e meu irmão tínhamos o dever de protegê-la e nos orgulhávamos da tarefa.
Fomos crescendo feito uma escadinha em cujos degraus ali no Maranhão chegou meu
irmão Maioba. Edinha, a única de nós genuinamente maranhense, voltou muito
pequena para Teresina, onde Moisés e Ana chegaram bem separados de nós no
tempo.
Mas de todos, eu e minha irmã éramos os mais magros, os dois
que herdaram os ossos fracos da família, mas não éramos assim tão doentes.
Tínhamos a convicção que éramos parte dos que vingaram. Minha irmã nunca se
queixou de nada. Começou a trabalhar cedo, casou e foram morar uns tempos no
litoral, na Parnaíba. Eu vim embora pro sul maravilha. O nosso contato ficou
por conta das férias e de nossos filhos que têm a mesma idade e conformação. E
passamos algumas férias juntos unidos pelos filhos.
Soube que ela teve uma
tuberculose vencida como os fortes são capazes de fazer para manter a vida no
sertão.
Depois soube da aventura que a família de minha irmã empreendeu
num fusquinha, cortando o Brasil no cumprido, vindo fixar residência numa
cidade do Rio Grande do Sul.
As notícias escassearam, ficamos meio distantes, embora eu
tenha ido uma vez lá e ela tenha vido aqui certa feita. Mas hoje eu choro por
mais contato nesta vida que é muito curta, mesmo para os fortes. E me arrependo
de não ter tido mais tempo perto da minha irmã. Quando ela ficou doente agora
fui visitá-la, encontrei-a em coma num hospital com os melhores padrões da
medicina brasileira. Sei que ela está bem cuidada, mas temi pela gravidade do
quadro. Naquele instante, na beira do seu leito de hospital, só consegui dizer –
meio com raiva – que ela estava furando a fila. Tinha dois irmãos que deveriam
morrer antes dela pela lei de chegada na terra. A minha dor foi muito grande.
Era como se tivéssemos nos desgarrando para sempre...
1 verso
BOA ESPERANÇA
Ou ÁGUAS DILACERADAS
Deram um nó nas tripas do rio
E deixaram os peixes a ver navios
Para arrancar energia desse estrangulamento
Assassinaram a vontade das águas
Vez por outra se vê crescer onde era rio
Uns matinhos recém-desafogados
Ao sentir que o fluir das águas esgarça
O verde denuncia uma ameaça
Não pesque a lua refletida nas águas
Nem as estrelas da superfície da noite
(Climério Ferreira)
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foto do site acessepiaui: o rio antes navegável após o "nó nas tripas" que o poeta chora
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foto do site acessepiaui: o rio antes navegável após o "nó nas tripas" que o poeta chora
O VAPOR DO PARNAÍBA NÃO NAVEGA MAIS NO MAR
(Edmar
Oliveira)
Saía um vapor do cais do Parnaíba, que nem trem,
puxando várias barcaças. Carregado de gêneros de primeiras necessidades. Como
se fosse uma mercearia deslizando no rio. Sabão, óleo, açúcar, sal, e umas
brevidades que a cidade anunciava estavam no balcão flutuante. A tarefa era
trocar estas mercadorias por coco babaçu e cera de carnaúba, que seriam
beneficiados na capital e eram artigos de grande valia. O comboio subia o rio
por uma margem e voltava pela outra. Escambo era a forma econômica de então.
Não tinha dinheiro na transação. O convencimento, a barganha, o espírito do árabe
que habita cada nordestino fazia o acontecer do toma-lá-dá-cá, das negociações.
Ia uma barca mercearia, voltava uma barcaça de matéria prima pros ingleses que
exploravam os nativos. Meu velho pai fazia o papel do representante do inglês.
Enrolando seus conterrâneos, com certeza. Só quem não conhece a leis da
economia acha correção no comportamento dos negociantes. Quem se deu bem conta
a história, quem fracassou, nem sei.
E
lá se ia o vapor e seus vagões. Barcaça seca, barcaça cheia, sempre que mais cheia
do que veio. O querosene valia muito mais que o babaçu. E quem pesava tava
quase sempre na barca, não na terra. Me lembro destas viagens, nas que
acompanhei meu pai, e do rio. O Parnaíba parecia um mar. Talvez na minha
imaginação, mas com certeza no avançar das águas que ainda não tinham sido
presas na Barragem de Boa Esperança, que acabou com a esperança do rio correr
pro mar e carregar o vapor e as barcaças.
Ainda
me lembro dos vapores de passageiros. O mais famoso deles era o vapor do
Rafael. Não sei quem era o Rafael, mas certamente ele tinha orgulho de sua
propriedade para botar seu nome no casco. Os vapores eram de aço com uma
chaminé fumarenta que apitava na chegada e na saída do porto. Um verdadeiro
navio com um convés cheio de redes, balaios com galinhas, potes de barro, malas
de couro. Mas um luxo a viagem! Nem todo mundo podia viajar de vapor. De
Palmeirais a Teresina era rápido. Voltar contra a correnteza levava mais que o
dia todo. Quando me perguntam se nunca fiz um cruzeiro conto as aventuras no
Parnaíba. Pobre ia às balsas desfraldadas, feitas com buriti e com uma casinha
de palha de coqueiro. E lá iam os balaios de galinhas, potes e outras cerâmicas
de barro, bacuri, pequi, pitomba, macaxeira e verduras, que eram
comercializados no cais de Teresina. Inclusive as balsas eram desmanchadas e
vendia-se até os paus de buriti (pra fazer cerca ou gaiola) e a cobertura de
palha, já que balsa só desce o rio e não tem viagem de volta. O retorno era no
pau-de-arara ou no lombo de burro. Eu tinha loucura pra viajar numa balsa, mas
nunca tive o desejo realizado.
Diziam
que estes pequenos e valentes navios eram fabricados na Inglaterra e vinham
navegando até o delta do Parnaíba, onde entravam sertão adentro para fazer do
rio uma estrada. E neles viajei muito. Conhecia aquelas beiras de rio, seus
povoados, pescadores e lavadeiras olhando do alto do convés do vapor ou de
dentro de uma barcaça puxada por um vapor de carga, que funcionava como
locomotiva das águas.
Lembro
destas histórias porque outro dia olhava o rio do cais de Teresina. E ele
parecia me dizer o quanto estava sofrendo. Os bancos de areia, que nós chamamos
de crôa ou coroa, pareciam sufocar o rio. O assoreamento de suas margens, o
correr vagaroso do rio, parecem sinais clínicos de falta de ar. O odor fétido
de suas outrora luminosas águas anuncia uma grave doença. Desde que prenderam
suas águas em Boa Esperança o rio vem perdendo a esperança de viver. Parece que
vai morrer. E isto dói muito em mim...
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Crônica publicada em maio de 2008 aqui no Piauinauta.
Fotos colorida do site acessepiauí: o cais do Parnaíba onde chegavam e saiam os vapores. O rio agora agoniza. Fotos antigas retiradas da página do facebook "Teresina Meu Amor".
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Crônica publicada em maio de 2008 aqui no Piauinauta.
Fotos colorida do site acessepiauí: o cais do Parnaíba onde chegavam e saiam os vapores. O rio agora agoniza. Fotos antigas retiradas da página do facebook "Teresina Meu Amor".
Ingressos para o teatro
(Geraldo Borges)
Durante
as férias na fazenda, quando minhas irmãs vinham da cidade, no meu tempo de
menino, brincávamos de representar
dramas, comédias: cenas burlescas, que faziam a platéia cair na gargalhada.
Armávamos o palco na varanda, que era o espaço maior da casa grande, e enfileirávamos
uma quantidade de cadeiras, tamboretes, para o auditório. Os agregados, os
parentes e os vizinhos vinham assisti a
peça.
Uma vez, eu fui escolhido por minhas irmãs
para participar do elenco. Fiquei feliz. A minha colaboração era ínfima,
duraria no máximo dois minutos. Eu pularia a janela em uma hora determinada no
meio de uma cena, e alguém, uma das minhas irmãs me interpelaria, fazendo-me
uma pergunta. No que eu responderia com a cara de abestado:
Não sei
não. Minha mãe é quem sabe.
Ao cruzar o batente da janela escorreguei e
saí tropeçando. Cai. Mordi a língua e machuquei os lábios. Mas logo me
recompôs. E desempenhei o meu papel. A minha Irmã fez de conta que o episódio da queda fazia parte da cena. Todo
mundo riu e a comédia continuou. E eu
saí do palco pela mesma janela debaixo de aplausos.
Na
cidade, tive a ocasião de participar de um novo drama; este no quintal de nossa
casa; desta vez apenas como espectador. Era uma pequena peça em um ato,
arranjada pelo Cupertino, que depois foi morar em Brasília, tinha a figura de
galalau, personagem dos doze pares de França, e era magro que só
uma lagartixa. Seus modos, sua presença já era motivo para riso; outro elemento da peça era o Gislene, baixinho e
gordo: parecia uma pipa de vinho, a dupla dava certo no palco.
A
história desenvolveu-se com o seguinte enredo. Cupertino fazia o papel de
paciente, que tinha de ser operado. O médico era o Gislene, metido em um jaleco branco. Havia também no
elenco uma enfermeira, a pessoa que lhe dava os instrumentos para a operação, e um anestesista que logo desapareceu.
Procedida
a operação, aberta a barriga do Cupertino com um golpe afiado de bisturi
entregue pela mão enluvada da enfermeira para a mão enluvada do medico, que
começou a extrair coisas estranhas do corpo do paciente que estava deitado em
uma cama coberto por um lençol branco.
O primeiro objeto que saiu de dentro do
paciente foi um apito, ai o doutor apitou e disse, deve ter engolido quando era
criança, depois deu uma gargalhada tão ostensiva que foi fazer eco no palco. Em
seguida tirou um carrinho de lata de
sardinha, trazia um cordão em uma das extremidades. O medico pegou e disse:
carência da infância, e deu um giro puxando o carinho pelo palco. O auditório riu. A enfermeira
ao lado do medico, séria,
parecia um fantasma. O paciente ia ficando mais magro. A gente notava por causa
da saliência do lençol que ia aderindo ao seu corpo O médico continuou catando o lixo
na barriga do paciente, encontrou algumas caixas de palito de fósforo encaixou uma nas outras e fez um trenzinho,
encontrou um revolver de brinquedo e
apontou para o rosto do paciente. Não reagiu. Encontrou um pião de madeira e
com bastante habilidade fê - lo girar em sua mão enluvada, um papagaio verde
amarelo com a seda rasgada e sem rabo. O palco estava se atravancando de
objetos.
A
enfermeira teve que sair um pouco para pegar um cesto de lixo. Nisso
a cortina fechou-se.
Quando abriu
de novo, não havia mais ninguém no palco. Apenas dezenas de cestos de lixos amontoados, cheios de objetos descartáveis,
tanta coisa que não é nem possível imaginar e pelo visto tudo tinha saído da
barriga do paciente Cupertino que depois
apareceu junto com o resto do elenco no palco para agradecer a platéia.
Trans
Estou grudado à pele
destes signos
que me adestram
pela noite imêmore.
Por eles me relâmpago
entre matilhas; neles
teci minhas ráfias de luz
e sombra; deles
são meus labirintos de safira.
Um dia uma fênix
grafou meu nome
em suas asas;
desde então me encanto
para renascer
transbordante em cada mim
(Salgado Maranhão)
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poema do próximo livro do poeta, ainda inédito
Crônicas minimalistas
RECEITA CONTRA A INVEJA
A feira livre se fazia anunciar pelo cheiro. Dois urubus mansos posavam de recepcionistas. O fotógrafo parou, olhou tudo e, sob uma sombra exígua, descobriu uma senhora - idade inescrutável - vendendo sua escassa mercadoria: três molhos de maxixe, um punhado quiabos, metade de uma abóbora. Aproximou-se, perguntou se poder...ia fotografá-la. A vendedora não permitiu: "Enfraquece o espírito". Em frente à banquinha, um pé de pinhão-roxo num vaso de cerâmica e um minúsculo pé de arruda numa latinha enferrujada. Perguntou se as plantas estavam à venda. A vendedora, um tanto agastada, respondeu; "Não, moço, isso é pra espantar olho-grande". Pela firmeza da resposta, devia saber o que dizia.
(Cinéas Santos)
A feira livre se fazia anunciar pelo cheiro. Dois urubus mansos posavam de recepcionistas. O fotógrafo parou, olhou tudo e, sob uma sombra exígua, descobriu uma senhora - idade inescrutável - vendendo sua escassa mercadoria: três molhos de maxixe, um punhado quiabos, metade de uma abóbora. Aproximou-se, pergu
(Cinéas Santos)
andarilho
Saber
viajar
E sempre uma grande arte
Mas ande devagar...
Porque você já está
Em toda parte.
(Geraldo Borges)
Autoajuda: Jó e a felicidade

Caro leitor, me pediram para ser
bom, justo, decente, honesto... eu até que tento. Juro! Me obrigaram a obedecer
as leis e eu me vi coagido a ser legal. Não satisfeitos, os caras me jogaram
nos cornos 10 mandamentos, zil costumes, ordens, proibições, censuras, tabus,
regras de etiquetas e me disseram para, no fim das contas, tratar de ser feliz.
Puta que nos pariu a todos, ser feliz assim? Lembrei-me de Jó, de seu suplício
no tempo, de suas pequenas e grandes tragédias e, é claro, da sua fé
inquebrantável. No fundo, querem que sejamos como Jó. Mas se ligo o rádio ou a
TV e ouço notícias terríveis sobre peste, morte, destruição; se leio no jornal
as notícias de fome, abandono, dor; se vejo da janela a miséria que nos rodeia,
e ainda assim sou feliz, é sinal de que sou, no mínimo, uma besta egoísta. Não
adianta me sensibilizar com os que não têm nada a partir do meu agradecimento a
um Deus pelo que tenho. Ora, é simples. Qualquer sofrimento alheio é também meu
sofrimento. Ou pelo menos deveria ser.
Mas não. Seguimos todos nos iludindo com a promessa da felicidade, como
se ela estivesse na estante de um supermercado existencial qualquer e fosse,
ela, a felicidade, uma certeza absoluta. Não me engano, eu não nasci pra ser
feliz enquanto a maioria está condenada à infelicidade. Esse papo de dormir com
a consciência tranqüila por que contribuo para uma creche, porque dei moedinhas
para um flanelinha, porque não nego comida a quem bate em minha porta, é
conversa para boi dormir. Não quero dizer com isso que a culpa disso tudo seja
minha, até porque não falo de culpa, mas de responsabilidade. O mundo é minha
responsabilidade sim e é justamente por isso que grito com plenos pulmões: Não
me peçam pra ser feliz debaixo de tanto entulho moral. Tampouco esperem que eu
sorria passivamente diante de todas as censuras do mundo. Eu não vim ao mundo
para ser feliz, mas, se eu quiser, para tentar sê-lo.
Leonardo, o bofe
A luz na noite matinal.
domingo, 10 de novembro de 2013
de seca, de grilagem e poluição
(Edmar Oliveira)
A
|
seca castiga o
interior do Piauí, apesar das poucas chuvas na capital. E, como sempre, os
políticos prometem investimentos em obras que resolverão a questão. Entra ano e
sai ano e o sertão continua ao Deus-dará. Desta vez, talvez pela globalização
dos protestos, um cidadão, em Jaicós, portava seu cartaz solitário: “Senhor governador, não precisamos de suas
visitas e falsas promessas. Queremos só a água”. Nem sem precisar imitar a
violência policial mostrada na TV, a segurança do governador foi em cima do
manifestante solitário e rasgou seu cartazinho de cartolina. No que o solitário
e politizado manifestante deu entrevista aos órgãos da capital dizendo que os
homens do governador estavam impedindo seu direito de manifestação e com o
cartaz rasgavam também a constituição. Bravo manifestante da pequena Jaicós.
Enquanto o governador promete obras, carros pipas andam até
duzentos quilômetros para levar uma quantidade de água ínfima aos habitantes do
sertão. A lavoura de subsistência foi embora e o gado morre na tragédia da
seca. A diferença dos retirantes d’agora para os descritos por Graciliano são
as motos e os celulares. As notícias das vozes da seca são de cortar o coração.
O
|
sul do Piauí
tornou-se um atrativo para o agro negócio. As plantações de soja estendem-se a
perder de vista e agora surgem denúncias de grileiros de terras, acobertados
por órgão governamentais. E vale tudo: procurações falsas, matrículas
inverídicas, posses forjadas, laudos infiéis e outras artimanhas jurídicas. O
objetivo de sempre é a expulsão do antigo posseiro, a compra de terras por
valores irrisórios e a revenda milionárias para o agronegócio em expansão. Ou
seja, o agronegócio do sul do estado despertou uma cobiça por terras ocupadas
com títulos dados pelos órgãos oficiais que agora refazem a propriedade para
terceiros com documentos forjados. Uma quadrilha está assentada no governo e as
acusações chegam a chamuscar o governador.
O Piauinauta, daqui de cima, olha os dois males que acometem
o Piauí nesse instante: no sul o agronegócio se expandindo à custa da grilagem
de terras que jogam na rua seus verdadeiros donos. No miolo do sertão a seca
inclemente que mata a economia de subsistência e o gado pé-duro dos pequenos
proprietários. E a região mais castigada está a poucos quilômetros da pujança
do São Francisco. Tem jeito?
U
|
ma vez eu estava hospedado num hotel em Teresina e chegando
suado de um dia escaldante foi informado pelo recepcionista que não havia água.
Perguntei quais as providências do hotel e o moço disse que tinha de esperar
que a culpa era da AGESPISA (Aguas e Esgotos do Piauí Ltda). Pedia uma
providência do hotel, um carro pipa que fosse. O impassível recepcionista falou
uma frase em piauiês que se agora posso ri, na hora fiquei uma arara: “se o
senhor quiser se banhar com uma bacia d’água, nóis arruma!” Lembrei das lavagens dos cabarés
da Paissandu.
Mas já que hoje estamos no propósito das denúncias, mais um
escândalo: diretores da AGESPISA foram presos por crime ambiental. Os dejetos
que chegam a estação de tratamento do esgoto sanitário estão sendo jogados no
rio sem tratamento. Falta água e os esgotos contaminam a água. Caso sério. O
rio morre a cada crime desses...
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Deu nos jornais aqui do Rio que o governador do Piauí tinha quebrado algumas costelas na queda de uma rede. O Izânio já fez a charge com os inimigos políticos fazendo um despacho.
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Deu nos jornais aqui do Rio que o governador do Piauí tinha quebrado algumas costelas na queda de uma rede. O Izânio já fez a charge com os inimigos políticos fazendo um despacho.
1 verso
A CANÇÃO DA MINHA TERRA
A minha terra habita
A sombra da tardezinha
E me encara e me grita
Dizendo não ser mais minha
De já não ser mais de lá
Sem os amigos de então
A mim só resta cantar
Esta saudosa canção
(Climério Ferreira)
A velha ponte do trem Maria Fumaça
(Geraldo Borges)
João Luiz Ferreira, engenheiro, com
certeza, deu a sua demão na construção da ponte que leva o seu nome. Antes de ser construída o trem de ferro Maria Fumaça
chegava até a estação de Timon, os passageiros que vinham para Teresina passavam
em canoas para o outro lado. Assim, também, os comerciantes, com as suas
mercadorias. A ponte precisava ser feita e assim se fez. Em nome do
desenvolvimento econômico dos estados do Maranhão e do Piauí. Mais tarde sofreu
uma adaptação para que no seu leito
passasse caminhões e automóveis.
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fotos da ponte metálica de cima para baixo: Paulo Tabatinga, Dasaev dos Santos Barbosa e Raphael Senna (primeiro, segundo e terceiro lugares num concurso de fotos da ponte metálica)
A velha ponte metálica
está parcialmente corroída
pelas estações das águas e do sol,
praticamente abandonada, parece um grande paquiderme saído de uma metalúrgica fantástica. Foi construída por uma engenheiro
alemão, e muita mão de obra maranhense e piauiense, e, com certeza, cearense. O
engenheiro alemão, dizem, suicidou- se, porque os alemães adventícios estavam
sendo perseguidos durante a guerra. A ponte se não me falha a memória foi
construída na década de 30. Dizem também que o material que veio para a
construção da ponte dava para construir a do rio Parnaíba e outra sobre o rio
Poty, essa desapareceu. Em vez de uma ponte metálica apareceu uma de madeira.
Do outro
lado do rio, em terras maranhenses, existem muitas personagens anônimas que
estão ligadas sentimentalmente a velha ponte metálica. É só pesquisar, Em
Teresina existia uma figura popular que tinha a sua biografia bastante ligada a
ponte. E eu gostaria de apontá-lo. Chamava - se
Manelão, vulgo Manuel Avião, que com a sua febre de representar o
mocinho na fita de cinema pulava
escandalosamente de cima da ponte para salvar a mocinha.
Eu
também tenho a minha história relacionado da com a ponte João Luiz Ferreira. Vem do meu tempo de
menino quando a ponte era apenas uma travessia de trem. Não era revestida de
tábuas. Os seus dormentes apareciam debaixo dos trilhos, como costelas de um
grande animal antediluviano, e, de cima,
via-se lá embaixo as águas do rio barrentas, descerem caudalosas, fazendo
vórtices em torno dos seus pilares. Eu
me aventurei atravessar a ponte para a cidade de Timon, com outros colegas. Mas
quando estava no meio me arisquei a olhar
para baixo. Fiquei tonto Senti como se as águas quisessem me arrastar para o fundo do abismo. Resolvi voltar
engatinhando. Hoje pensando bem, me pergunto se estava no meio da ponte, ou,
talvez, mais perto de Timon, por que não fui em frente e realizei a minha
façanha? Isso fez com que eu admirasse mais ainda os meninos moleques que subiam cabriolando pelos elevados
arcos que rodeiam a ponte e depois declinam E assim eles atravessavam o rio dando um
espetáculo. A ponte nos atraia não só pela sua beleza arquitetônica, coisa que
não entendíamos, mas, pelo fato de ser uma travessia, de nela a gente ver o
trem passar. Somente o trem naquele tempo. E de certa maneira porque
ficava distante da cidade. E nos proporcionava um passeio excitante.
Ao longo de muitos invernos e sol
causticante a ponte metálica sofreu algumas avarias a ponto de seu uso se
interditado. Mas resiste a ferro e fogo. Abraça o rio de um lado a outro num
gesto cordial ligando dois estados que
têm muito em comum. E é por isso mesmo que ela pertence à União, de modo que
merece o zelo tanto de Teresina como de Timon.______________________________
fotos da ponte metálica de cima para baixo: Paulo Tabatinga, Dasaev dos Santos Barbosa e Raphael Senna (primeiro, segundo e terceiro lugares num concurso de fotos da ponte metálica)
CORAÇÃO VAGABA
MEU CORAÇÃO AS VEZES FAZ DAS SUAS
DESTA FEITA QUER POR VERDADEIRO
E DERRADEIRO
QUE TE AMAR
SEJA COMO ACHAR
UMA AGULHA NO PALHEIRO
(Lázaro José de Paula)
o calor de Teresina
.
O calor de Teresina não é a apenas uma metáfora
O calor da minha cidade é uma realidade atmosférica
Faz o nosso corpo ficar encharcado e suja o colarinho
Do cidadão. Faz a moça tecer sombras a seus pés com a sua
Sombrinha colorida. Faz os
moleques timbungarem
Nas águas poluídas do rio Parnaíba
Faz o transeunte
procurar uma sombra na calçada.
Mas a sombra está vazia porque derrubaram as árvores
Para o carro passar besouros devoradores do verde.
O calor de Teresina não é apenas o calor de seja bem vindo
O calor de Teresina é real, é de sol a pino, na faixa do
Equador
Mas o calor de Teresina tem suas vantagens
Devora as carniças nos monturos da cidade
Nos esgotos aos céus abertos
Transforma-os em múmias em pergaminho
Nos anais dos
descuidos deslavados da municipalidade
Já pensou se esta cidade mal cuidada tivesse um clima frio?
Seria um inferno, uma semente para a peste
Viva o calor de Teresina onde as chananas nascem
Quebrando com toda a delicadeza o cimento das calçadas.
(Geraldo Borges)
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foto: Nayene Monteles
VERDADES E MENTIRAS NA LITERATURA
(Luíz Horácio)
Um livro
de leitor. De leitor exigente. Lado
A
Um livro
de professor. De mestre em radicalismos. Lado B
Verdades
e mentiras na literatura se justifica, graças a seu lado A. Recomenda-se
leitura de olhos bem abertos. Partículas maniqueístas pululam ao longo de Verdades
e mentiras na literatura.
É
preciso estar atento e forte, aconselhou Gilberto Gil em Divino maravilhoso. Mais adiante, o alerta: tudo é perigoso.
O autor Stephen Vizinczey é húngaro. Nasceu em 1933. Jovem escreveu peças
teatrais. Suas peças costumavam ser proibidas pelo regime comunista, o que não
impediu A
Última Palavra, sua segunda peça, de receber o prêmio
Attila József. Diz o autor que, certa vez, enquanto ensaiavam, receberam a visita da
polícia política. Esta, não satisfeita com a
"confraternização" , levou algumas lembranças: para ser exato,
carregou os cenários, os figurinos. Vizinczey não tardaria a fugir para o Ocidente.
No Canadá, sem saber falar inglês, viu-se obrigado a aprender. E
aprendeu tão bem, a luta pela sobrevivência é o melhor dos métodos, que logo a sobrevivência resultava dos argumentos
que escrevia para filmes.
Não tardaria a escrever romances, ensaios, resenhas.
Verdades e mentiras na literatura reúne textos anteriormente publicados
em jornais e revistas. Trata-se de uma coletânea que merece redobrada atenção.
Apresenta uma face bobinha, aparentemente ingênua, porém perigosa, e uma face
arrogante, pretensiosa, extremamente bem articulada, mas como diz um amigo, “as
serpentes também são muito bem articuladas.” Recomenda este aprendiz: aprecie
com moderação, não se deixe impressionar.
Comecemos pelo lado B, Os Dez Mandamentos de um Escritor, não fosse a grandiosidade do lado A estas dez bobagens arrogantes
jogaria o livro no esgoto. Vale a leitura pelo lado cômico, ingênuo, piegas,
encare como uma negação do primeiro mandamento; Não beberás, não
fumarás nem usarás drogas.
Dito desse modo, sem dar exemplos, corro o risco parecer sob efeito de duas das mais potentes drogas,
inveja e arrogância.
Enganou-se deploravelmente, impaciente leitor, caso tenha sentido falta
da mediocridade. Esta não é droga, é
componente de minha essência.
O primeiro mandamento é constrangedor, conhecemos inúmeros bons
escritores que fumam, muitos que bebem e outros que se drogam. Por vezes
ocorrem num mesmo sujeito. Não fazer uso dessas três “ferramentas” não
significa ser bom escritor.
Segundo mandamento: Não terás hábitos dispendiosos. Alguém pode explicar
onde isso tem a ver com escrever bem ou mal?
Diz Vizinczey: É preciso decidir sobre o que é mais
importante para você: viver bem ou escrever bem.
Essa afirmação é de uma estupidez constrangedora. Aproveito para dar um
aviso aos editores e editoras: desprezem todo original não oriundo de regiões
miseráveis. Dia desses fiquei sabendo que Madagascar é o lugar mais pobre do
nosso globo. Pelo visto deve estar repleto de grandes escritores.
Perdoe, caro leitor de espírito elevado, mas a irritação se aproxima, em
vista disso não tomarei seu tempo com todos os mandamentos, mas....no quarto
mandamento você encontrará Não serás vaidoso, no quinto o autor lhe recomendará, Não serás modesto.
Menos mal que são dez mandamentos, dez patéticos mandamentos. Condição
para levá-los a sério: ter no máximo dez anos de idade e ostentar analfabetismo
no mais alto grau de convicção.
Ultrapassada a arrebentação, o
leitor encontrará a erudição inquieta de Vizinczey, então se perguntará como ele foi capaz
cometer aqueles dez mandamentos imbecis.
Aproveito para fazer uma pergunta, atento leitor: por que raios
escritores gostam tanto, ou pelo menos se arvoram nesse direito, de ensinar a
escrever? Nem artistas plásticos apreciam tanto essa atividade. Com a quase
erradicação dos cursos de corte e costura, o terreno foi invadido pelos escritores/professores.
Percebe-se nitidamente sua admiração por Stendhal, admiração que permite
leve consideração a Balzac e quase esquecimento de Flaubert.
Vizinczey parece não conseguir
desapegar da pieguice, perceba, apesar da devoção por
Stendhal como ele começa o ensaio. Voilá:
Stendhal é um desses raros espítiros que nunca param de desejar estar vivos, estar apaixonados, estar livres. Estes
três desejos dominam suas obras.
Vale lembrar que a leitura de Verdades e mentiras na literatura deve ser efetuada com extremo cuidado e sempre de forma criteriosa.
Percebe-se a indisfarçável pretensão de
SV de assumir a “persona” de bússola a orientar não apenas o aspirante a
escritor, mas também ditar normas acerca de como
se deve receber a literatura. Caberá a você, criterioso leitor, aceitá-las.
Caso aceite incondicionalmente saiba que está a permitir que alguém lhe informe
o que vem a ser bom gosto em literatura.
Pelo menos na literatura européia e americana. Parte da literatura europeia e
americana. Parte escolhida pelo autor. O que enseja miríades de controvérsias.
Cabe lembrar a você leitor, que também lê no idioma de Rabelais, a
leitura de Des mystications littéraires, de Jacques Finné. Compare e depois conversaremos.
Para encerrar, Verdades e mentiras na literatura é o retrato da intransigência de Vizinczey, se desmistifica determinados
aspectos da literatura também demonstra sua agressividade, sua inteligência e
seu idealismo piegas.
Verdades e mentiras é um livro pretensioso, arrogante,
aparentemente sincero, feito este texto que você acaba de ler. Não deve ser
levado muito a sério.
AUTOR
Stephen Vizinczey nasceu na Hungria em
1933. É autor de diversos livros, entre eles In praise of older women, editado
em 21 países e ganhador, em 2004, do Prêmio Elba, na Itália.
TRECHO
A verdadeira grandeza é como o
infinito, não conseguimos medi-la. Em geral, as tentativas de avaliar as obras
de arte prejudicam até mesmo nossa capacidade de apreciá-las. Ao tratar os
êxitos criativos como se fossem panoramas sociológicos ou históricos, ou
exercícios de intenções piedosas, boa parte da erudição literária é empregada
para destruir a distinção vital entre o ordinário e o extraordinário - um tipo
de incompreensão bárbara que descreveria o olhar de uma mulher dizendo que
ela tinha visão 20/20. No
entanto,essa seriedade pedestre, que Stendhal foi o
primeiro a reconhecer como o mal da cultura moderna, domina o ensino hoje em
dia, e tem como resultado o fato de que só os leitores com sensibilidades
indestrutíveis conseguem sobreviver e formar uma cultura literária.. O ensino
de literatura é o principal instrumento para alijar os jovens da boa prosa e
particularmente dos clássicos. As aulas pedantes sobre o brilhante retrato que
esse ou aquele romancista fez de uma época passada propagam a falácia de que os
grandes autores do passado escreveram sobre coisas mortas e enterradas.
Mas a calúnia é a verdade mal
aplicada. O que confere perene credibilidade ao indevido tratamento sócio -
histórico - moralista das obras de arte literárias é a abundância de
romancistas datados que foram pouco mais do que cronistas de sua sociedade e
honrados porta-vozes da desilusão dela. Tais escritores sofreram, se não de
falta de talento, ao menos de uma overdose de sua cultura solidificada e de suas convenções.
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