Quando a vi pela primeira vez, não sei por qual associação de
imagens, me lembrei da rapariga loura de Eça de Queiros, talvez por que quando ela chegou aqui em casa eu acabara de
ler o conto do autor. E, além do mais, era loira. Ela veio trabalhar em minha
casa. Eu era solteiro, e estava precisando de uma criada para cuidar das coisas
domesticas, e, também, limpar os meus livros, de vez em quando, para que não
encham de tanta poeira.
Nos primeiros dias de trabalho tudo
correu bem. Como eu vivia sozinho, na companhia de uma gata, não me importava
em colocar os objetos em lugares ordenados, ficavam a vontade. Com a presença
dela as coisas começaram a mudar. Falo isso, porque a minha bolsa vivia em cima
do criado mudo dentro de meu quarto. Eu não tinha me dado conta que a minha
personagem tinha singularidades de uma rapariga loira.
Certo
dia eu abri a minha bolsa e dei por
falta de dinheiro, a quantia não era tão grande. A minha gata não podia ser.
Não precisava. Chamei a empregada para um diálogo. Ela fez beicinho. Tentou
representar. Negou tudo. Disse até que eu poderia mandá-la embora.
Dei-lhe mais uma oportunidade. Só
que o caso aconteceu de novo. Dessa vez a quantia foi muito maior. O mais
racional é que eu devia ter tirado a bolsa de cima do criado mudo e colocado em
um lugar mais seguro, no bolso de minha calça.
Mentiu-me de novo.
Para falar a verdade eu já
estava começando a gostar dela. Não
podia mandá-la embora. Por que não fiz isso logo na primeira vez?
O caso era simples. Não adiantava chamar a
policia. Em vez disso foi ao cartório e me casei com ela. E assim, resolvi a
questão. Se ela quiser me furtar que furte, é como se tivesse furtando dela
mesma. Só que de agora em diante viverá um uma prisão domiciliar.
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