domingo, 24 de abril de 2011

Elogio à Preguiça


Juvenal Antunes

Bendita sejas tu, Preguiça amada,
o consentes que eu me ocupe em nada!

Mas queiras tu, Preguiça, ou tu não queiras,
ei de dizer, em versos, quatro asneiras.

Não permuto por toda a humana ciência
Esta minha honestíssima indolência.

Lá esta, na Bíblia, esta doutrina sã:
-Não te importes com o dia de amanhã.

Para mim, já é grande sacrifício
Ter de engolir o bolo alimentício.

Ó sábios , daí à luz um novo invento:
A nutrição ser feita pelo vento!

Todo trabalho humano, em que se encerra?
Em na paz, preparar a luta, a guerra!

Dos tratados, e leis, e ordenações,
Zomba a jurisprudência dos canhões!

Juristas, que queimais vossas pestanas,
Tudo que legislais dá em pantanas.

Plantas a terra, lavrador? Trabalhas
Para atiçar o fogo das batalhas...

Cresce o teu filho? É belo? É forte? É loiro?
- Mas uma rês votada ao matadouro! ...

Pois, se assim é, se os homens são chacais,
Se preferem a guerra à doce paz,

Que arda, depressa , a colossal fogueira
E morra assada, a humanidade inteira!

Não seria melhor que toda gente,
Em vez de trabalhar, fosse indolente?

Não seria melhor viver à sorte,
Se o fim de tudo é sempre o nada, a morte?

Queres riquezas, glórias e poder? ...
Para que, se amanhã tens de morrer?

Qual mais feliz? O mísero sendeiro,
Sob o chicote e as pragas do cocheiro,

Ou seus antepassados que, selvagens,
Viviam, livremente, nas pastagens?

Do Trabalho por serem tão amigas,
Não sei se são felizes as formigas!

Talvez o sejam mais, vivendo em larvas,
As preguiçosas, pálidas cigarras!

Ó Laura, tu te queixas que eu, farcista,
Ontem faltei, à hora da entrevista,

E, que ingrato, volúvel e traidor,
Troquei o teu amor - por outro amor...

Ou que, receando a fúria marital,
Não quis pular o muro do quintal.

Que me não faças mais essa injustiça! ...
Se ontem não fui te ver - foi por preguiça.

Mas, Juvenal, estás a trabalhar!
Larga a caneta e vai dormir... sonhar ...


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 Juvenal Antunes nasceu no Ceará-Mirim em 1883 e morreu em 1941, em Manaus. Foi personagem da Mini-série Global "Amazônia", de Gloria Peres.
Juvenal Antunes, o poeta de bronze do Acre. Ele foi homenageado com uma estátua de bronze (Igual à do F. Pessoa, à mesinha de bar...). Nascido no Ceará foi para o Acre ser Promotor de Justiça , mas o negócio dele era mesmo a boemia. A seu respeito consta que vivia metido num robe, feliz da vida, na porta do hotel Madrid, onde morava, em Rio Branco. Um boêmio inveterado, sempre bebendo cerveja, fazendo versos e proclamando seu amor à LAURA, uma mulher casada. E dizem as más línguas, que ele não abandonava o hotel nem pra receber o ordenado, o ordenado é que vinha à suas mãos por /exercícios findos/!
(Mas a foto acima deu origem a estátua ao lado)


Este poema que lhe trouxe a fama definitiva.
 
Enviado por e-mail ao Piauinauta por Roxane.

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