quinta-feira, 9 de julho de 2009

NO DIA QUE MICHAEL JACKSON MORREU EU ME IMOLEI NAS RUAS DE TERESINA



Durvalino Couto


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A morte de Michael Jackson me arrebatou de tal forma que só fui senti-la no dia seguinte.

Trabalhei feito o cão no dia seguinte à morte de Michael. Um trabalho gostoso. Desde 9 da manhã até o final da tarde saí com a equipe de externa da agência de propaganda onde trabalho e mais dois casais de modelos lindos, eles e elas. Um filme de uma ótica e de oferta de óculos esportivos. Uma das modelos era particularmente linda e fiquei me divertindo dirigindo-a no meio da rua, enquanto carros passavam e olhavam, invejosos, para o que fazíamos. Lembrei de Ezra Pound e do "ronronar das antenas sensíveis". Mas queria ficar logo à frente da tela de um computador para ver os desdobramentos da morte de Michael Jackson all over the world, coisa que só consegui fazer quando o dia já era noite.

Coisas previsíveis: salvei algumas fotos, como a do cover de Michael em Pequim, fãs colocando flores na porta da embaixada dos States em Moscou ou crianças da cidade onde ele nasceu, em Indiana, colocando singelos ursinhos de pelúcia na porta da casa onde ele passou a infeliz infância. Fui ficando comovido. Chorei ao ouvir um trecho de Music And Me, e a coisa foi pegando.

Tinha o aniversário de um velho amigo para ir. A festa ia ser na casa de minha filha e minha ex. Mas quando vi um pessoal dizendo bobagens, minha filha se aprontando para ir ao show de Ivete Sangalo logo mais, fui me sentindo estranhamente sozinho, o homem mais sozinho do mundo. Minha filha, de repente, não tem nada com isso e os interesses dela são outros, tudo bem.

Saí à francesa e vim para casa, antes passando numa revenda de cerveja para comprar umas três. Cheguei lá e o rapaz que toma conta estava chorando. Pensei que era por causa de Michael, mas ele tinha acabado de ser assaltado. Um menino que não parecia pobre desceu de um carro e botou um revólver nos peitos dele. Levou pouco mais de cem reais. O rapaz do depósito, antes de ligar para o patrão, teve a dignidade de ir à farmácia ao lado e depositou a quantia roubada na conta do chefe – daí ligou para o tal, que o reembolsou. Fiz um discurso: por que esse filho da puta não bota um segurança armado aqui e lhe deixa sozinho assim? Ele botou a mão no meu ombro, chorou mais um pouco e me agradeceu.

Aí fui para um bar-lanchonete do tipo trailler que costumo ir, tem uma garçonete que espero comer, ela é linda e espero que me perceba. Cheguei lá e estava passando o Globo Repórter Especial sobre Jackson. Aí eu já estava bêbado mesmo e comecei a vociferar. Coisas como Sarney deve estar soltando rojões, só assim a nação esquece dele. Berrei que Michael morreu porque foi a maneira mais rápida que encontrou para pagar todas as dívidas. As pessoas começaram a ficar irritadas. Insisti e berrei sou mais o Ronaldinho, filho de pobre come tudo. Um cara começou a berrar também e passou a rebater minhas loucuras. Berrei que quando Michael veio ao Brasil não foi para os Jardins em Sampa ou a Lagoa no Rio, mas para o Pelourinho na Bahia e para o Morro de Santa Marta, favelão carioca; até o tráfico parou. Percebi que o cara estava num pé e noutro para levantar de onde estava e me dar uns sopapos. Paulo, o garçom, ao trazer mais uma, segredou só pra mim, por que você não leva essa pra tomar em casa?, você está queimadão. Parece que acordei, paguei e me mandei.

Em casa percebi que lá dentro, dentro do mais profundo de nós, sabemos de todos os impulsos que levaram Michael ao fim, nós sabemos, chegamos mesmo a conhecer intimamente. Mas não somos nenhum Kubla Khan do show bizz. Um Cidadão Kane. Chaplin pelo menos gostava muito de mulher e se divertiu a balde durante toda a vida. Ele ficou puto porque não conseguiu arrastar para a cama a atriz que fez a cega em Luzes da Cidade, chegou a ensaiar várias atrizes para substituí-la.

Daí fui ouvir a música que mais gosto do disco Thriller, que é justamente a última, a baladona The Lady in My Life.

There'll Be No Darkness Tonight
Lady Our Love Will Shine
Just Put Your Trust In My Heart
And Meet Me In Paradise, Girl
You're Every Wonder In This World To Me
A Treasure Time Won't Steal Away

So Listen To My Heart
Lay Your Body Close To Mine
Let Me Fill You With My Dreams
I Can Make You Feel Alright
And Baby Through The Years
Gonna Love You More Each Day
So I Promise You Tonight
That You'll Always Be The Lady In My Life

Lay Back In My Tenderness
Let's Make This A Night We Won't Forget
Girl, I Need Your Sweet Caress
Reach Out To A Fantasy
Two Hearts In The Beat Of Ecstasy
Come To Me, Girl

And I Will Keep You Warm
Through The Shadows Of The Night
Let Me Touch You With My Love
I Can Make You Feel So Right
And Baby Through The Years


Even When We're Old And Gray
I Will Love You More Each Day
'Cause You Will Always Be The Lady In My Life
Stay With Me
I Want You To Stay With Me...

Ouvi meio que chorando até dormir. O cara era um puta músico, como um bom músico pode perceber. O cara era um músico divino e maravilhoso. Cada arranjo do Quincy Jones em Thriller é de uma precisão avassaladora, não é à-toa que é o disco mais vendido no mundo. O cara é apenas uma grande vítima do produssumo de que fala Décio Pignatari (estudem), quantidade é qualidade, etc.

Ainda assim, não teria coragem de comprar uma camiseta preta com a silhueta de Michael Jackson e a frase A LEGEND NEVER DIES. Não consola, não diz tudo. E isso é tudo.

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