domingo, 22 de fevereiro de 2015

Uma reportagem


(Geraldo Borges)

Certa vez fiz uma viagem até a Barragem  da Boa Esperança, em face de construção, para fazer uma reportagem. Tomei o ônibus na rodoviária de Teresina. Desci em Floriano, meio dia, para comer alguma coisa. Entrei em um bar restaurante. Uma moça que vinha no mesmo ônibus, ao meu lado, desceu comigo. Quando eu me sentei ela me pediu para me fazer companhia.

- Pois não, eu disse.

A moça era bonita, loura de olhos verdes e sobrancelhas cerradas, parecendo pente fino, cabelos caindo por cima dos ombros  redondos. Quando ria fazia uma covinha graciosa na face. Eu imaginava que ao reiniciarmos  a nossa viagem poderíamos conversar bastante. E eu lhe  ofereceria  a minha janela caso ela gostasse de olhar para fora do ônibus.

Chamei o garçom e pedimos o nosso lanche. Ela pediu a mesma coisa.

Quando já estávamos comendo ela me perguntou de boca cheia, a queima roupa, se eu era engenheiro, e estava indo ajudar  na construção da barragem. Eu poderia ter dito, sim. Seu engenheiro. Não custava nada.   Era isso que ela queria que eu fosse. Andava atrás de um engenheiro. Mas, a minha musa, falou mais alto. E eu disse

- Eu não sou engenheiro, sou poeta.
  
            
Ela que estava mastigando, quando ouviu a palavra poeta, quase se engasgou, como se algo estivesse atravessado a sua garganta. Pediu licença para ir ao banheiro e foi embora.

Terminei de comer e paguei a nossa conta. Eu não sei como ela vai  me encarar quando voltarmos para o nosso assento no ônibus. Mesmo assim vou lhe oferecer a minha janela. Quem sabe não vislumbrará alguma poesia na paisagem: uma vaca ruminando no pasto com um passarinho no seu lombo, picando carrapato.

Surpresa. O lugar dela estava vazio. Havia desistido de sentar ao meu lado. Eu  a avistei no fundo do ônibus. Ri para ela. Não correspondeu o meu riso. A covinha do rosto tinha desaparecido. Era como se ela não quisesse saber de prosa. Muito menos de poesia.

Acomodei-me, sozinho, no meu banco e continuei na janela penando que já havia encontrado um tema para a minha reportagem.







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