domingo, 10 de agosto de 2014

O homem que se espriguiçava


(Geraldo Borges)
 
Espreguiçou-se.  O dia vinha amanhecendo  lá fora caía  um dilúvio.  Gostaria de levantar-se. E tomar um banho. O que fazia sempre quando acordava. Mas achou tão bom  se esticar que resolveu se espreguiçar  de novo. O corpo estalou e ele começou a sentir-se flutuando,

Saiu pelo telhado, e se dissolveu na chuva. De repente tinha virado um pássaro e estava voando por céus desconhecidos. Logo depois já não era mais um pássaro e sim um peixe nas profundezas do oceano. Suas lembranças não existiam, havia só o momento. Virou  tubarão. Virou uma águia circulando no alto de uma montanha E assim de transformação em transformação passou por todos os reinos da natureza. Sentiu-se  fossilizado em águas vivas, sentiu-se  uma serpente rastejando e subindo nas árvores de uma floresta primitiva, sentiu o sabor das maças. Tudo isso ao som da chuva  que batia no telhado.

De repente encontrou-se na pele de um macaco peludo pulando das arvores e virando homem, lutando com feras, bebendo sangue. E se iluminando na tocha de uma fogueira.

Espreguiçou-se de novo e deu um urra. Gritou alto. Foi quando sua mulher ao lado da cama, preocupada com os seus gritos animalescos, o acordou. Havia parado de chover. Ele se aconchegou ao lado dela e adormeceu de novo. Novamente sonhou. Mais desta vez sentiu-se uma semente como  uma minúscula raiz encravada em uma gruta úmida e esponjosa.

 

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