(Geraldo Borges)
Espreguiçou-se. O dia vinha amanhecendo lá fora caía um dilúvio.
Gostaria de levantar-se. E tomar um banho. O que fazia sempre quando
acordava. Mas achou tão bom se esticar
que resolveu se espreguiçar de novo. O
corpo estalou e ele começou a sentir-se flutuando,
Saiu pelo telhado, e se dissolveu
na chuva. De repente tinha virado um pássaro e estava voando por céus
desconhecidos. Logo depois já não era mais um pássaro e sim um peixe nas
profundezas do oceano. Suas lembranças não existiam, havia só o momento.
Virou tubarão. Virou uma águia
circulando no alto de uma montanha E assim de transformação em transformação
passou por todos os reinos da natureza. Sentiu-se fossilizado em águas vivas, sentiu-se uma serpente rastejando e subindo nas árvores
de uma floresta primitiva, sentiu o sabor das maças. Tudo isso ao som da chuva que batia no telhado.
De repente encontrou-se na pele
de um macaco peludo pulando das arvores e virando homem, lutando com feras,
bebendo sangue. E se iluminando na tocha de uma fogueira.
Espreguiçou-se de novo e deu um
urra. Gritou alto. Foi quando sua mulher ao lado da cama, preocupada com os
seus gritos animalescos, o acordou. Havia parado de chover. Ele se aconchegou
ao lado dela e adormeceu de novo. Novamente sonhou. Mais desta vez sentiu-se
uma semente como uma minúscula raiz
encravada em uma gruta úmida e esponjosa.
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