(Edmar Oliveira)
O senso comum acredita que existem pessoas com uma boa
memória, capazes de reproduzir fielmente fatos há muito acontecidos. Eu,
garanto, não tenho o que chamam “boa memória” e não consigo gravar coisas nas
que não tenho interesse, até que tenham me acontecido ainda agora. Minha
memória é seletiva e afetiva ao extremo, confesso. Mas creio que as pessoas “de
boa memória” sejam melhores que eu no trato com as lembranças, mas não lhes dou
carta em branco. Tive até aborrecimentos por tentar separar lembranças de fatos
em quem se achava poder retratar o passado tal como tivesse acontecido. O velho
pensador alemão Karl Jaspers criou uma psicologia da memória para aprofundar o
assunto. Mas juro que vou ficar nas abobrinhas para comentar um acontecimento
de momento.
Um vídeo, que demorou ser encontrado por estar ainda rodando
no horário de verão (o que confundiu os peritos), mostrou a queda do avião em
Santos, que levava o candidato Eduardo Campos, embicando de cima pra baixo,
desgovernado e rápido, passando por trás de dois prédios para provocar, na
sequência, um clarão e uma nuvem de fumaça. Essa filmagem ocasional faz supor
um erro do piloto no processo de arremeter a aeronave: ou provocando em alta
velocidade – por retraimento dos flaps – um embicamento do avião e descontrole;
ou não alcançando uma velocidade suficiente que evitasse uma queda por estol.
Na primeira hipótese foi encontrada uma nota de pé de página no rodapé do
manual alertando que se os flats fossem recolhidos com a velocidade acima de
200 nós, a aeronave podia perder a estabilidade e embicar. Na segunda hipótese,
todos sabem que o que mantém o avião em voo é a velocidade: se for baixa, que
não compense a força de gravidade o avião cai em estolagem (neologismo para
perda de sustentação). De qualquer modo nossos pilotos estão muito bem
preparados para voos normais. Em situações complicadas o raciocínio do
treinamento é testado na velocidade do jato. Uma nota de pé de página pode ser
esquecida e/ou a inversão dos movimentos entre tentativa de pouso e arremetimento
pode ser demorada. Não os culpo, é do humano.
Pois bem, no vídeo encontrado o avião cai límpido, cortando
o céu, sem explosões, sem qualquer tentativa (de pilotagem) para evitar os
prédios. Em poucos segundos o impacto da explosão e da nuvem de fumaça. Como
explicar o depoimento de tantas testemunhas oculares que juram ter visto uma
explosão no ar e outras que supunham que o piloto desviou dos prédios para
evitar um acidente de grandes proporções?
Memória seletiva seria juntar o nosso conhecimento anterior
– de que avião explode – para ver uma bola de fogo no avião, que não existiu.
Memória afetiva seria desconfiar anteriormente de uma conspiração para ver na
bola de fogo o suposto atentado. Altruísmo seria atribuir ao piloto morto a
intenção de desviar a aeronave para evitar uma tragédia maior. Note-se aqui que
o altruísmo é muito mais atribuído aos mortos. E eu me admiro de quanto a
memória humana deforma a realidade!
Por aceitar essas experiências coletivas, candidamente não
confio na minha memória. E, vez por outra, desconfio de quem se vangloria de
afirmar peremptoriamente que a história foi assim e não de outro jeito!
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