domingo, 14 de agosto de 2011

Les mêmes larmes


Aeroporto Salgado Filho, dezesseis horas do dia três de agosto de dois mil e onze. Céu nublado à espera dos aviões. Às dezessete e trinta, um deles levará minha filha

Thamara vive no Rio de Janeiro. Faz vinte dias que está aqui em casa. Não é visita, pois filho nunca visita, filho retorna.

Dia desses fomos ao cinema. O filme Les mêmes larmes. A história de Vincent, um escritor e seu processo de adaptação após o término de mais um  casamento. Pai de Sophie, dois anos e meio.

O filme é comovente, terno, triste, denso…

Uma das cenas mais impressionantes: Vincent se encontra em seu escritório, prateleiras vazias, retirara seus livros durante à noite. Fizera tudo no sentido de Sophie não perceber o que se passava.

Como de costume, naquela manhã levara a mamadeira para Sophie e fora sentar em seu escritório vazio. Olhava para as estantes  quando a menina empurrou a porta e, automaticamente, estendeu o braço para alcançar a mamadeira ao pai. Aquela manhã, no entanto, trazia algo diferente. Ela olhou ao redor e percebeu as estantes sem os livros. Sophie não diz nada, as crianças percebem as tristezas dos pais por mais que eles tentem ocultá-la.Vincent não tinha o hábito de trapacear com a filha. A garota faz o caminho de volta, Vincent olha para a mamadeira em suas mãos. Logo Sophie retorna e entrega ao pai um bichinho, algo que me pareceu uma foca, um filhote de foca. Azul.

Vincent acaricia o brinquedo e devolve à Sophie. Ela pega e logo torna a entregar  ao pai. Nessa cena, sua primeira fala: pro papai.

O avião que levará minha filha está no pátio do aeroporto. Sinto saudade, embora a tenha entre meus braços.

Nos últimos instantes antes do embarque recordamos algumas coisas que fizemos   juntos. Les mêmes larmes volta à nossa pauta. Thamara  lembra a cena que se repete até Sophie completar dez anos. Sempre que Vincent  deixa a filha com a mãe a cada final de semana, chora. Catherine, a mãe da menina, repete o discurso: "Suas lágrimas não me comovem, não venha com essa chantagem emocional. Você não cansa?"

Um dia, Sophie devia ter uns cinco anos, pergunta ao pai: "Pai, as pessoas choram sempre do mesmo jeito? Todo mundo chora igual?"

Vincent responde: "Não,minha filha, cada pessoa tem seu jeito de chorar, só as lágrimas são iguais"

Última chamada,  Thamara me abraça,nos beijamos, segue para a sala de embarque. Guardo minhas lágrimas para chorar no carro.

É de lá que vejo o avião que a levará para casa, ganhar os céus. Confiro o horário, dezessete horas e cinqüenta minutos. Choro.

Tento me confortar dizendo, em voz alta dentro do carro, que são apenas duas horas de avião, que em dezembro ela retornará, mas amor não se mede com instrumentos racionais. Amor é presença.

Tenho mais dois filhos, mas os filhos, ao contrário das lágrimas, não são iguais.

No percurso para casa retorno ao filme, Sophie, aos dez anos, decide morar com o pai. A mãe da menina, no filme um tanto estereotipada, não faz oposição. Nesse momento, Vincent está começando outro casamento. Sua mulher concorda com a presença de Sophie. Logo entra em cena o grande vilão do filme; o ciúme.

Sophie pergunta ao pai: “Lembra daquela vez que perguntei sobre o choro? Pois é, e o ciúme. todo mundo sente ciúme?”

Vincent responde: “Nem todos, tem gente que sente medo.Medo de não saber amar. Como  seu pai.”

De volta ao meu escritório percebo que minhas estantes estão sempre recebendo um livro novo. Daqui a pouco telefonarei. Não aguento mais a saudade daquele som paaaaaiii.

Av. Lajeado, bairro Petrópolis, sala Perciliana, dezenove horas, dia três de agosto de 2011...




Um comentário:

Anônimo disse...

que emoção este texto.