quinta-feira, 14 de maio de 2009

Uma crônica em lágrimas


Teresa Cristina

Solidariedade em cada lágrima que se mistura às águas das enchentes. Amor em braços que unos erguem móveis nos caminhões. Beijo de ternura nos olhares que ficam guardando as lembranças de tantos risos de horas felizes. Um aperto de mãos repleto de uma dor sentida como se fora sua. Um sorriso nas vidas que caminham juntas em canoas ou nas ruas alagadas da cidade desconhecida - Nunca se vira Piracuruca náufraga.
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E caminhões passam: um, dois, mais... Carregados de dores... Presos em olhares que veem seu suor transformar-se em uns poucos pertences lançados por sobre a madeira de caminhões na hora da aflição. Alguns param sem ação de juntar o que lhe foi tão caro. O que levar? O que deixar para trás? Há como se guardar na memória os rostos dos familiares suspensos nas paredes traçados em imagens nos quadros? Que se perdem quando as águas vêm cidade adentro nas horas caladas da noite?
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Um menino que não vai à escola- abrigam famílias! Um ancião que não conversa com as flores dos bancos das pracinhas- um mundo de águas barrentas povoa os espaços. Um homem que não atravessa a ponte do rio- os caminhos estão esquecidos por entre as águas. Uma lavandeira que não ensaboa as roupas nas águas mansas do rio Piracuruca- as pedras viajam nas pororocas... E das estradas a cidade olha...
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Não há como visitar os amigos no Guarani para um cafezinho. Os netos do outro lado do rio acenam da ponte de ferro e lançam beijos aos avôs debaixo de uma chuva fina que chora lenta sem o calor do abraço. Homens dentro de casa erguem móveis beirando o teto. Outros do calçadão do Guarani saem de casa com mochilas às costas e uma muda de roupa para os filhos. No olhar a lágrima para com medo de inundar a alma que tenta ser forte.
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Já há senhoras na Igreja Matriz rezando Ave-Marias: “Santa Maria, Mãe de Deus rogai por nós...”, e as crianças que não brincam com barquinhos de papel molham os pés nas águas que passeiam na Praça Irmãos Dantas. As flores olham sem entender. O sol as aquece, mas há não risos nos piracuruquenses. Dentro do peito as fibras choram sem a lágrima que não pode cair. As bocas não falam. Só oram. E na alma, uma torrente de vozes: “Meu Deus, que águas são essas que não matam nossa sede, nem regam nossas plantas?”
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E a cidade que não dormira abre a porta da casa e acolhe um irmão...
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Um beijo, Teresa Cristina.
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lá mais em baixo Teresa reaparece e eu falo dela...

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