Millôr |
(Edmar Oliveira)
Tenho um amigo que trabalha na Petrobras. Daqueles
funcionários antigos e em extinção, que foi admitido por concurso público em
outras eras e já perto da aposentadoria. Nós, antigos trabalhadores do serviço
público, éramos conhecidos como servidores. Que encarávamos o trabalho como uma
atividade de servir ao público e a nação. Já não se sabe mais o que é isso,
pois estamos em extinção com a flexibilização das leis trabalhistas. Daqui a
pouco vamos ter que também explicar o que é aposentadoria, já que ela vai ser
extinta por aumento da idade permitida ou pelo pagamento irrisório que não
permita as pessoas viverem de uma aposentadoria, o que ainda é um prêmio a
dedicados servidores públicos para lhes permitir viver com o salário da ativa.
Isto também vai ser tirado dos atuais trabalhadores terceirizados.
Mas voltemos ao meu amigo da Petrobras que ainda torce por
uma aposentadoria das antigas. Um representante da atual diretoria da estatal
fez uma reunião no departamento do meu amigo para entregar e discutir uma
Cartilha Anticorrupção. Todo mundo recebeu a tal cartilha e o representante da
direção tentava explicar o que era considerado corrupção. Desde receber dos
fornecedores um chaveirinho, uma garrafa de vinho no natal ou uma agenda no
começo do ano. O palestrante anticorrupção asseverava que esse pequenos agrados
poderiam fazer do funcionário um corrupto no futuro. O meu amigo imaginava os
diretores, hoje presos na Operação Lava Jato, que teriam iniciado sua carreira
de corruptos recebendo um chaveirinho e hoje tinham milhões de dólares
depositados na Suíça. Riu-se imaginando que um corrupto da Petrobras ficou
tentado a abrir conta numa offshore quando recebeu a sua primeira garrafa de
vinho. E que as agendas recebidas de presente serviram para listar os políticos
para quem o dinheiro das propinas foi destinado. Ficou a matutar como a
cartilha anticorrupção evitaria os ladrões no futuro.
Meu amigo pegou a sua cartilha e devolveu ao palestrante com
a seguinte explicação: “levei muita surra
do meu pai desde cipó de goiabeira, cinturão dobrado, e até de corda de couro
cru trançada. O senhor não deve saber o que era essa corda, que nós conhecíamos
como relho. De bater em lombo de animal. Aprendi que tirar goiaba no quintal do
vizinho era errado. Meu caráter foi moldado pela moral de um velho nordestino –
que sempre foi pobre – mas nunca pegou no alheio. Portanto eu não preciso da
sua cartilha. Vá distribuir nos gabinetes dos diretores que fazem as
licitações, embora eu não veja qualquer utilidade nessa cartilha. Os valores
éticos se aprendem com a vivência. A corrupção é uma doença de caráter e desse mal eu não padeço. Por isso mesmo não
vão me querer em altos cargos e nem os almejo. Passar bem!”
Um comentário:
ainda bem que meu avô Wilson não tinha a tal corda de coro cru.
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