domingo, 3 de abril de 2016

A CARTILHA DA PETROBRAS



Millôr


(Edmar Oliveira)

Tenho um amigo que trabalha na Petrobras. Daqueles funcionários antigos e em extinção, que foi admitido por concurso público em outras eras e já perto da aposentadoria. Nós, antigos trabalhadores do serviço público, éramos conhecidos como servidores. Que encarávamos o trabalho como uma atividade de servir ao público e a nação. Já não se sabe mais o que é isso, pois estamos em extinção com a flexibilização das leis trabalhistas. Daqui a pouco vamos ter que também explicar o que é aposentadoria, já que ela vai ser extinta por aumento da idade permitida ou pelo pagamento irrisório que não permita as pessoas viverem de uma aposentadoria, o que ainda é um prêmio a dedicados servidores públicos para lhes permitir viver com o salário da ativa. Isto também vai ser tirado dos atuais trabalhadores terceirizados.

Mas voltemos ao meu amigo da Petrobras que ainda torce por uma aposentadoria das antigas. Um representante da atual diretoria da estatal fez uma reunião no departamento do meu amigo para entregar e discutir uma Cartilha Anticorrupção. Todo mundo recebeu a tal cartilha e o representante da direção tentava explicar o que era considerado corrupção. Desde receber dos fornecedores um chaveirinho, uma garrafa de vinho no natal ou uma agenda no começo do ano. O palestrante anticorrupção asseverava que esse pequenos agrados poderiam fazer do funcionário um corrupto no futuro. O meu amigo imaginava os diretores, hoje presos na Operação Lava Jato, que teriam iniciado sua carreira de corruptos recebendo um chaveirinho e hoje tinham milhões de dólares depositados na Suíça. Riu-se imaginando que um corrupto da Petrobras ficou tentado a abrir conta numa offshore quando recebeu a sua primeira garrafa de vinho. E que as agendas recebidas de presente serviram para listar os políticos para quem o dinheiro das propinas foi destinado. Ficou a matutar como a cartilha anticorrupção evitaria os ladrões no futuro.

Meu amigo pegou a sua cartilha e devolveu ao palestrante com a seguinte explicação: “levei muita surra do meu pai desde cipó de goiabeira, cinturão dobrado, e até de corda de couro cru trançada. O senhor não deve saber o que era essa corda, que nós conhecíamos como relho. De bater em lombo de animal. Aprendi que tirar goiaba no quintal do vizinho era errado. Meu caráter foi moldado pela moral de um velho nordestino – que sempre foi pobre – mas nunca pegou no alheio. Portanto eu não preciso da sua cartilha. Vá distribuir nos gabinetes dos diretores que fazem as licitações, embora eu não veja qualquer utilidade nessa cartilha. Os valores éticos se aprendem com a vivência. A corrupção é uma doença de caráter e desse mal eu não padeço. Por isso mesmo não vão me querer em altos cargos e nem os almejo. Passar bem!

   

Um comentário:

Felipe Araújo disse...

ainda bem que meu avô Wilson não tinha a tal corda de coro cru.