(Edmar Oliveira)
“Natal: haverá luzes, festas, árvores iluminadas, presépios,
(…) mas é tudo falso. O mundo continua em guerra, fazendo guerras, não
compreendeu o caminho da paz”. (Papa Francisco)
Até o papa não acredita mais no Natal. Um tempo de falsidades,
hipocrisia, presentes e fingimento de bondade. Se aquele, em que no Natal
comemora-se o nascimento, existiu de fato e morreu para salvar a humanidade,
parece que cometeu um sacrifício em vão. Ou o pai não ouviu suas preces, ou se
ouviu fez ouvido de mercador e abandonou a humanidade a sua própria sorte. Como
não creio em castigos divinos, como o dilúvio, a humanidade só será detida, na
sua incansável marcha de maldades, por um meteoro – tal qual aquele que
extinguiu os dinossauros.
O quê se pode comemorar num dezembro aqui perto de nós? O
mês nem bem tinha começado e uma chacina cometida por terroristas fardados, a
soldo do Estado, interrompeu o sonho de
cinco jovens da periferia que comemoravam o primeiro salário por um deles. Mais
de cem tiros perfuraram o carro onde estavam os cinco jovens. Um Natal de dor
para estas famílias tira o gosto das festas e os votos de felicidade. A polícia
de São Paulo espanca jovens alunos que não querem suas escolas fechadas. Não
será um Natal de paz e harmonia que estes jovens comemorarão neste dezembro. Um
mar de lama se arrasta por esse dezembro no pior desastre ambiental que se tem
notícia. Pessoas soterradas estão desaparecidas. Novecentos campos de futebol foram
devastados na flora e na fauna. Um rio foi envenenado com lama tóxica. A vida
no rio morreu. A água não serve para uso. A lama chegou ao mar e destruiu o
litoral e a vida marinha em mais de uma dezena de quilômetros. A contaminação
continua. O Natal foi envenenado. E a Saúde Mental pode ser encarcerada nos manicômios por uma insanidade do Ministro da Saúde. O Natal enlouqueceu.
Os nossos corruptos saíram das sombras e não se envergonham
dos desvios de dinheiro público. Um crime de lesa pátria porque rouba recursos
que podiam salvar vidas e desmerecer o irônico lema de “pátria educadora”. Um
pulha, cínico, mentiroso, canalha, flagrado com cinco milhões de dinheiro
público desviado em contas na Suíça preside a Câmara dos Deputados federais e
ainda teve a ousadia de pedir o impedimento de uma presidenta legitimamente
eleita. Uma presidenta que se abaixa, mostra os fundos, dá os anéis e os dedos para não enfrentar os canalhas. O que o Papai Noel reserva para Cunha e Dilma neste Natal? E ainda tem
os que vibram com o risco que corre a nossa frágil democracia. Não se pode
impedir um governo legítimo porque não se gosta, porque ela é incompetente,
porque ela é burra, porque ela não tem traquejo político. Já vivemos governos
piores e o nosso “fora presidente da vez” foi inconsequente. Contribuímos para
tirar um ladrão, corrupto, inepto, salafrário. Mas assim mesmo ele voltou
cometendo os mesmos crimes e abraçados aos poderosos de ontem, de hoje. Ganhou três
carrinhos de marca em cada Natal. Mudou o Natal ou mudei eu?
Sei que estou pessimista e amargo nessa época de
congratulações, harmonia, festas e votos de felicidades. Mas estou infeliz com
os votos que elegeram o pior Congresso que se tem notícia. As leis retroagem. A
maioridade penal cai para permitir a mortalidade de crianças por armas de fogo
da polícia. Eles propõem que a noção de família seja bíblica e que as mulheres
não decidam sobre seu corpo. Fazem da legislação para drogas a mais absurda e
descompassada neste mundo moderno. Destroem a legislação do desarmamento. O
agronegócio destrói a floresta e o cerrado. Bancadas da bala, do boi, da bíblia
dominam o Congresso e fazem um estrago no avanço das leis, envergonhando a
Constituição Cidadã de 88. A polícia militarizada serve de cão de guarda das
elites, espancando e matando os pretos e pobres da periferia. O maior desastre
ambiental do país fica sem punição, pois as mineradoras financiam a campanha política
de quem deveria fiscalizá-las.
E você aí na mesa vai comer o seu peru sem culpa neste
Natal? Pois eu, mesmo sendo ateu, ficarei com as preocupações do Papa
Francisco: “Existem hoje guerras em toda a parte e ódio. (…) E o que resta?
Ruínas, milhares de crianças sem educação, tantos mortos inocentes. E tanto
dinheiro nos bolsos dos traficantes de armas (...) Estamos perto do Natal:
haverá luzes, festas, árvores iluminadas, presépios, (…) mas é tudo falso”.
Mudou o Natal ou mudou o Papa?
Nenhum comentário:
Postar um comentário