(Geraldo Borges)
Cresci lendo revistas em quadrinho, produto americano. E
romance de cordel, produto nordestino. O primeiro em prosa, uma prosa mais
dialogada do que narrada, o segundo em verso, a gente lia cantando. Durante
esse período devo ter manuseado alguns livros ilustrados, adaptações de grandes
obras clássicas. Não me lembro.
Pulei do cordel e das revistas em quadrinho (minha mãe
queimou todas) para os romances volumosos, tijolos: Conde de Monte Cristo, Os
três Mosquiteiros. Ficava imaginando como seria as feições de Edmond
Dantès com a sua cara de homem
vingativo, e os semblantes dos mosquiteiros, coisa que vim conhecer muito
depois no cinema.
Um dia, na minha jornada de leitor, encontrei alguns belos
livros ilustrados, que me impressionara loucamente. O primeiro foi o Pequeno
Príncipe de Antoine De Saint-Exupéry, e
que começa com o famoso desenho, aquarela do autor, de uma serpente digerindo
um elefante, e que o leitor desavisado, apressado, jura que é um chapéu. E por
aí vai. Depois aparecem os traços do Pequeno Príncipe, o carneiro. O livro é
uma obra infantil mas conquistou os
adultos, e ninguém poderá imaginá-la sem ilustrações. Até mesmo porque os
desenhos do livro estão visceralmente conjugados as narrativas.
Depois do Pequeno Príncipe eis que chegou as minhas mãos Alice no País das Maravilhas de
Lewis Carroll. Maravilho. Um clássico dos clássicos. Uma obra para crianças que
os poetas adoram. Um sonho Lewis Carroll, além de grande escritor era
fotografo. Engraçado, o livro começa
quando Alice está ao lado da irmã que lê um livro sem figura. Aquilo a
entedia. Quando de repente passa um coelho consultando as horas. E Alice corre
atrás dele. Daí para frente começa o enredo. Tudo é surpresa agora. Vale a pena
transcrever o inicio do livro:
“Alice começou a
enfadar-se de estar sentada no barranco junto à irmã e não ter nada que fazer:
uma ou duas vezes espiara furtivamente o
livro que ela estava lendo, mas não tinha figuras nem diálogos, ‘e de que serve
um livro’ pensou Alice , ‘ sem figuras nem diálogos.’
Não demorou muito tempo
li O Engenhoso fidalgo Dom
Quixote de la Mancha, com belíssimas ilustrações de Doré. Todo leitor de
Cervantes conhece a estalagem que virou Castelo, e Dulcinéia que virou princesa,
e os moinhos de vento que viraram monstros, na imaginação delirante do Cavaleiro
de triste figura, leitor faminto dos romances de cavalaria. O romance agrada a
gregos e baianos.
Depois de Dom Quixote outro grande livro ilustrado que tive
a aventura de ler chama-se a Divina Comédia de Dante Alighieri. Desenhos de
Doré. Inferno. Purgatório. Paraíso. Uma viagem trágica nel mezzo Del cammin di
nostra vita. Repleto de figuras retorcidas e sem esperança. Nenhum leitor por
mais sensível que seja imaginaria tanta dor e desespero naqueles personagens.
Também ilustrado por Doré li Gargantua de Rabelais, onde o
leitor pode ver figuras gigantescas, descomunais, atolada nos banquetes da gula
e no sabor do vinho. O livro é uma saga
satirizando a vida dos frades da França Feudal.
Afora a leitura de livros estrangeiros, deparei-me com um
conto de Leminski- A Guerra dentro da Gente. O conto é de uma elegância
exemplar, os desenhos de uma expressividade tão nítida que o leitor sente que
os personagens estão se materializando, dando um pulo, fora da página.
Considero-o uma obra prima da literatura
brasileira.
Mas, para ser sincero, prefiro a leitura de livros sem
ilustrações. Na verdade, as letras já são uma espécie de ilustração do
pensamento. Tudo bem, uma capa, bem desenhada, sugestiva, junto com o titulo,
dá certa personalidade ao livro.
Acredito que no mundo
do espetáculo em que vivemos hoje a ilustração corre o risco de virar uma
redundância. Eu particularmente prefiro imaginar o cenário que o autor descreve
juntamente com seus personagens, sem precisar da colaboração dos ilustradores.
Mas o mercado é quem decide e dá a palavra final.
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