Geraldo Borges
Quem tem boca vai a Roma. Todos os caminhos levam a Roma. A Itália é uma bota, e assim calçado em uma bota de sete léguas la vou eu. Hoje se vai a Roma de avião, ou de cruzeiro, navios pelo Atlântico mediterrâneo.
Já estou em Roma. Tudo muito rápido. Mergulho
na poeira do tempo. E vero. Chego ao
senado romano, nos idos de março. Ao redor de Julio César se aglomeram os conspiradores com os punhais afiados dentro
de suas túnicas. Cesar não tem condição de defesa. Começam
o massacre. Cássio, Casca, Trebônio, Ligário, Decio Bruto, Metelo Cimbro Marcos
Bruto; dois Brutos. Até tu Brutos. O sangue pingando da ponta dos punhais.
Depois ouvi o discurso de Marcos Antonio, ou melhor, na verdade, de
Shakespeare. Eis um trecho.
Eu vim aqui para fazer os funerais de Cesar, e
não para louvá-lo. O mal que os homens fazem sobrevivi-lhe, mas o bem que o
praticam é sepultado com os seus próprios ossos. Assim seja com Cesar. E por ai
vai, vai longe. Quem conhece a peça sabe
até aonde ele chega.
Mas
chegando a Roma me encontrei com Virgilio, o poeta maior da
língua latina, que, perambulou, pelo círculos do Inferno na companhia de Dantee e Beatriz. E me lembrei de Enéias voltando da Guerra de
Tróia e lançando as bases da cidade de Roma, sem esquecer, todavia a lenda, a
loba lactante que amamentou os dois irmão: Rômulo e Remo.
Fiquei embasbacado em frente ao Coliseu, ouvi tinir de gládios na arena e vi o polegar de
Cesar levantado para perdoar gladiadores que tinha sido vencidos, como vi
também o polegar para baixo simbolizando morte ao perdedor.
Mediante lembranças de alguns filmes Roma se desenrolou
nítida e colorida através da minha memória. Vi os antigos filmes de Felline, de Vittorio de Sica. Nos cafés da Via Veneto me encontrei com as rivais Sophia
Loren e Gina Lollobrigida. Nos tempos em que Roma filmavam e estava no auge do neo realismo
cinematográfico. Roma Inventou o
seu espaghnetti western com Giuliano
Gemma no elenco de O dólar
furado, Uma pistola para Ringo, entre outros, e quase desbanca os americanos.
Mas vamos adiante, aqui, convido Dante para me
acompanhar, ele não se faz de rogado, e segue me mostrando.
Escultura, arquitetura, deuses mijando, fontes jorrando; pombos, no
átrio das igrejas, inundando praças com
suas asas cinzentas. Não sei por que os pombos têm tanta liberdade a ponto de proliferarem tanto, talvez mais do
que os ratos, talvez, não sei, se isto tem a ver com a tradição cristã.
Finalmente um pombo saiu da arca e anunciou
o fim do dilúvio, pombos correios foram muito importantes na guerra, e o pombo,
anunciou-se também como símbolo da divindade cristã. Ninguém pode no mundo cristão fazer guerra aos pombos.
Pomba. Eles sujam tudo, deitam e rolam na cidade.
Mas, vamos deixar os pombos em
paz. Eles fazem parte dos postais dos
turistas. Roma, cidade eterna. Eu te caminho por tuas avenidas, onde há
séculos Julio Cesar entrou com suas legiões vindo de suas conquistas, de suas guerra contra os bárbaros. Conheço a tua literatura, as tuas fabulas de Esopo o teu
latim desde o meu tempo de ginásio. De Virgilio. Conheço os cantos de Eneida: ( Ego ) cano arma que virum, eu canto as armas os varões; conheço as paginas do romance
Satiricon de Petrônio. Amo a tua última flor
do Lácio inculta e bela proveniente do latim vulgar.Amo as odes de Horacio e
outros poetas latinos.
Roma é uma cidade que muitas
pessoas gostariam de visitar. Qou vadis Dominus?
Laurence Sterne nos diz alguma coisa sobre viagens no seu livro Uma viagem
sentimental através da França e da Itália. Eis um trecho do seu livro para o
leitor viajante.
Conhecimento e aperfeiçoamento
devem ser obtidos navegando ou viajando
por terra, com esta finalidade; mas tanto o conhecimento útil quanto o
aperfeiçoamento verdadeiro, tudo isso e uma loteria – e mesmo onde o
aventureiro é bem – sucedido, c o cabedal adquirido tem de ser usado com cautela e sobriedade para
trazer algum beneficio - mas, como as
oportunidades se direcionam num outro sentido, tanto quanto à aquisição, como quanto à aplicação,
sou de opinião que um homem agiria
sabiamente se pudesse persuadir –
se a viver satisfeito. Sem um conhecimento estrangeiro ou aperfeiçoamento
estrangeiro, especialmente se vive em um país em que não há absolutamente nenhuma falta de ambos - e de fato, muitas vezes tem – me causado
muita dor no coração e me custado muito
a observar quantos passos em falso tem dado o Viajante inquisitivo para ver paisagens e observar descobertas; todas elas, como
Sancho Pança o disse a Dom Quixote, poderiam ter ido vista por eles, de pés
enxutos, em sua terra. É uma época tão cheia de luz, que mal existe um país ou
recanto da Europa cujos raios não se cruzem com e se mesclem uns com os outros -- O conhecimento em muitas de suas ramificações, e em muitos
casos, é como a música numa rua
italiana,na qual podem tomar parte aqueles que não pagam nada – Mas não existe
nação debaixo do céu – e Deus é meu testemunha
diante de cujo tribunal devo um
dia apresentar-me e prestar conta deste trabalho) - de que não estou falando arrogantemente – Mas
não existe nação abaixo do céu em que
haja abundancia de maior variedades de saber – em que as ciências seja competentemente perseguidas, ou mais firmemente
conquistadas do que aqui – onde a arte seja encorajada e, em breve, se
erga bem alto – onde as Natureza ( tomada em seu todo) tenha tão pouca
coisa pela qual se responsabilizar – e,
para encerrar tudo isso , onde haja mais engenho e variedade de caracteres para alimentar o espírito – Aonde, então meus
caros compatriotas, estão vocês indo –
O estilo do autor, muito influenciou o texto da Machado de
Assis, que nunca saiu do Rio de Janeiro,
embora alguns de seus personagens tenham
visitado a Europa, inclusive Brás Cubas.
A Europa sempre foi um pólo de atração para o intelectual brasileiro, para
estudar, passar tempo E para os turistas, que com as suas maquininhas vão capturando postais. Mas, pensando bem, o
Brasil é uma extensão da Europa, pois os emigrantes europeus lhe deram um novo
colorido cultural, só muda o cenário, arquitetônico, e nem tanto. O Rio de
Janeiro de antigamente era muito
parecido com Paris e outras capitais da Europa.Bom. Para voltarmos a Itália,
dou a palavra a Murilo Mendes, o nosso grande poeta, que continua pelas ruas de
Roma, embora tenha morrido em Portugal, na cidade de Lisboa..
Vivo em Roma porque posso aqui exercer meu trabalho de professor e
membro de uma sociedade secreta que se
propõe dinamitar o monumento da Plazza Venezia. Porque Roma, segundo um velho
soneto de Quevedo, não está mais em Roma, portanto não me sinto obrigado a
seguir o rastro dos césares. Porque seu povo é humano e simpático. Porque Roma
tem belas mulheres, praças estupendas, este ocre das suas casas me serve de
tônico. Porque aqui encontrei amigos deliciosos, que geralmente não crêem que 2 + 2 = 4, Porque em Roma existe o Museu
de Vslle Giulla, quando entro ali me transformo num etrusco. Porque raramente
se topam rinoceronte nos seus parques. Porque é a cidade que vive sob o signo
do juízo universal e da mais formidável historia em quadrinhos, exatamente o
juízo universal de Miguel Ângelo, o arrabbiato por excelência. Porque vivendo
em Roma não sinto necessidade de ir à lua: somos aqui todos lunáticos. Porque em Roma posso ver
João XXIII, isto é, a excomunhão da bomba, o progresso do ecumenismo e da paz.
Muitos são os caminhos que nos
levam a Roma e eu estou voltando por um deles.
Após ter sido acompanhando por personagens ilustre durante a minha
viagem por esta península itálica à guisa de uma bota, e que,
de tanto desbravar territórios,
lançou as bases da nossa civilização oficializando o Cristianismo. Pois todo mundo
sabe que o enredo básico da narrativa é a vigem e dela não podemos fugir, seja
simbólica ou real.
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