conjunto arquitetônico Clube dos Diários e Cine São Luís (hoje hotel) |
(Geraldo Borges)
Estou em Teresina.
Toda vez que venho a Teresina hospedo-me no antigo cine São Luis, ou melhor, no
velho prédio onde funcionava o cinema
São Luis na década de cinqüenta. Hoje é apenas um hotel modesto próximo a Praça
Pedro Segundo, e ao lado do Clube dos Diários. Mudaram a sua arquitetura
funcional. No lugar amplo onde existia o auditório construíram quartos com suítes, onde existe também televisão.
Mexeram em tudo por dentro, Demoliram a cabine onde o filme rodava e ia se
projetar na tela para deleite dos fregueses, demoliram as bilheterias,
expulsaram os lanterninhas, os
porteiros, de caras de poucos amigos, e os fiscais que conferiam as nossas
carteiras de estudantes Só conservaram mesmo a fachada, que ainda faz relembrar
um pouco o cinema
O Cine São Luis me faz recordar o meu tempo de menino. Agora
quer estou sozinho na minha suíte pego – me a pensar nos velhos faroestes
tocadas a ferro e fogo, com cavalgadas e
diligencias, e, às vezes, índios.
Nunca pensei que um dia o Cine São Luis se tornasse um hotel. O pior é que muitos
prédios históricos foram abaixo para dar lugar a estacionamentos de carros.
Não dormi bem essa noite. Pois estava com medo de perder o
avião, embora tivesse avisado ao recepcionista que me acordasse pelo telefone.
Durante a noite tive um sonho. Sonhei que estava em um castelo,
servido por mordomos e criados. Mas a
maioria dos hospedes do castelo eram fantasmas, velhos astros e estrelas de
filmes em preto e branco da Paramount
,da Columbia, da Metro. Eles falavam inglês. E eu tentava traduzir.
Parece que estavam dizendo por que diabo o Cine São Luis ti tinha se
transformado naquele castelo mal assobrado. Tudo estava diferente de seu tampo.
As pessoas entravam no prédio sem comprar bilhete, sem fazer fila, sem comer
pipoca, o prédio não tinha mais cartazes deles nas paredes. De repente no meio
da conversa eu vi Marilyn Monroe arribar o vestido. Vi namorado de mãos dada se beijando no escuro do cinema.
No desfile desses fantasmas consegui ver em minha mente uma procissão de
estrelas e astros que povoaram a minha imaginação aí pela década de cinqüenta,
principalmente o que faziam papeis de mocinho e me fazia sair do cinema com os
ombros levantados, e caminhando altivo.
Acordei com o toque do telefone. E tentei relembrar os
detalhes do sonho. Com certeza esqueci a metade. Talvez tenha visto muitos
filmes, remendado. Levantei. Esfreguei os olhos. Pisei meu sonâmbulo no
assoalho Acendi a luz. E pense, seria
maravilhoso se eu encontrasse Marilyn Monroe inteiramente nua no meu banheiro.
Talvez eu não estivesse ainda acordado
completamente. A Água fria me traria à realidade. Mudei de roupa.
Arrumei a mala e desci. Não deu tempo de tomar café.
Pedi um taxi. Rumei para o aeroporto. Embarquei.
O avião alçou vôo. E durante a viagem num esforço de memória
e imaginação rebobinei, com direito a fitas quebradas, quase todos os filmes que eu vi no velho Cine
são Luis do tempo de minha infância. E só assim comecei a entender porque
escolho, para me hospedar, sempre que venho a minha cidade, o velho prédio onde
funcionou o Cine São Luis.
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