domingo, 15 de junho de 2014

A casa do menino





(Geraldo Borges)
 
No meu tempo de criança eu só sabia desenhar uma casa com uma porta e uma janela e uma arvore  ao lado de um cercado e  um sol de olho arregalado no alto da página. Imagino que essa era a casa onde eu havia nascido e continuava morando. Ela flutuava um pouco fora dos alicerces. Por mais que eu desejasse desenhar outra coisa, sempre que pegava o lápis, mordia a língua, e franzia a testa, e riscava o papel, não conseguia  modificar o meu desenho. Uma casa, uma janela, uma porta, um sol, um céu limpo de chuva eram os elemento que sempre apareciam no meu desenho. Às vezes eu acrescentava um passarinho num ramo da árvore. Esse desenho feito refeito,  várias versões, tornou-se a minha obra prima.
Até que um dia,  o tempo me levou, além, muito além do meu desenho.  Desenhei dois bonecos dentro da casa. Talvez fossem meu pai e minha mãe.
Passei meu período de infância, entrei pela adolescência e mocidade e esqueci o meu desenho. Mas, um dia, devaneando, para preencher o tempo, empunhei o  meu grafite e comecei a me enredar nos bastidores tentando desenhar alguma coisa.
Não é que a velha casa apareceu no papel, flutuando, fora dos alicerces, com seu cercado, com sua porta, sua janela, seu sol  arregalado no céu azul, e o seu passarinho. Paisagem que eu pensei não  estivesse mais ao alcance de minha mão
È que agora eu estou morando em um apartamento. E em nossa rua não há uma árvore sequer. Por isso mesmo resolvi colocar  o meu desenho em uma leve moldura e pendurá-lo em uma das paredes da minha sala.Pois a considero a minha obra prima.
 



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