Geraldo Borges
Minha mãe ganhava presentes em seu aniversário, no Natal, e
em outras datas significativa, inventadas e consagradas pelo comércio, como por
exemplo, o dia das mães. Tinha cinco filhos mulheres sexo mais inclinado a dar
presente. Eu não me lembro, sinceramente, que tenha dado algum dia um presente
a minha mãe. As únicas coisas que lhe dei na vida foram trabalho, preocupação e
sofrimento, e isso não se embrulha em papel de seda nem e se enfeita com laço
de fitas. Comecei a me dar conta de que, os presentes que minha mãe recebia, começaram
a abarrotar a sua casa. Mais uma televisão, um jogo novo de sofá,
liquidificador, garrafa térmica, mesa. Tudo isso poderia até servir. Mas
destoavam os moveis antigos que constituíam a paisagem domestica. O certo é que
se fazendo uma vistoria nos objetos que minha mãe recebia de presente dava para
se montar uma nova casa. Eram tantos presentes que iam se acumulando pelos
cantos sem serventia, apenas enfeitavam, e precisavam ser espanados todos os
dias.
Minha mãe já nem agradecia os presentes. Começaram a lhe dar
cortes de tecidos; alguns eram aproveitados; a. maioria ficavam amontoados no seu guarda – roupa,
mofando. Minha mãe era uma mulher caseira, que sabia fazer renda em almofada de
bilros, remendar roupa e todo mais que
dignificasse uma casa antiga, Quando casou no interior, começou sua vida
morando em uma casa de palha, com uma sala, uma
camarinha e uma cozinha com duas trempes,dois potes e duas redes
Minha mãe ganhou
muitos vidros de perfumes; gostava de se perfumar depois do banho, Mesmo assim
não dava conta de esvaziar vidros de perfumes que ia se acumulando na sua velha
cômoda que nunca foi trocada. A minha mãe começou a ganhar sapatos em pencas.
Não precisava ir as lojas para experimentá-los.
Acho que não abria nem as caixas. Botava-os em cima do guarda roupa.
Tinha presentes amontoados que dava para inaugurar uma butique.
Quando minha mãe morreu, os presentes tomaram vulto, e talvez
tenham passado para as mãos dos mesmos presenteadores. Eu não estava presente no
seu passamento. Nem este presente eu lhe dei. Quando cheguei para a visita do
sétimo dia, o único e presente possível que lhe dei foram velas, flores e
orações. As velas se queimaram, as flores murcharam, e as orações o vento
levou.
Noto que está acontecendo comigo quase a mesma coisa que
aconteceu com minha mãe. Estou velho e começando a ganhar muitos presentes de
meus filhos, que, ainda bem, são apenas dois, principalmente agora quando não
preciso de quase nada. Salvo de saúde e juízo.
. Tenho não sei quantos frascos de perfume, presente dos
filhos, em cima da minha cômoda. Mas não
tenho a paixão de me perfumar. Apenas abro o fraco e sinto o cheiro. Depois veio a fase dos cinturões, cinturão de
couro, de pano, fivelas estilizadas. Mas eu deixei de usar cinturão. As minhas
calças sustentam-se muito bem na cintura, sem precisar de cinturão. Veio o
tempo dos presentes de chapéus. Estes são úteis, protegem o calor da cabeça.Gosto de chapéu. Minha filha
me trouxe três de Portugal.
Há poucos dias levei
um susto. Ao acordar vi ao pé de minha cama não sei quantos pares de calçados:
tênis, botas, havaianas, alpercatas de couro, sapatos, tive até vergonha de
contar. Mas mesmo assim fiquei feliz quando vi minha gata brincando com os
cadarços dos tênis
Eu tenho cá para mim que esta história de dar presente aos
outros é muito antiga passa pelo Velho e o Novo Testamento. O rei Salomão
recebeu presentes, o menino Jesus também, e para muitos continua presente. Mesmo
assim os presentes por mais que simbolizem um gesto diplomático de aproximação
entre os povos, entre as gentes, nem sempre evitam as guerras Principalmente
quando é um presente de grego.
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desenho: Amaral
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