domingo, 18 de abril de 2010

Bonnie e Clyde, os de verdade


Aderval Borges
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Nosso tempinho pós-moderno é de total inclusão: nada se cria, de tudo se apropria. O MST que o diga.


Apocalípticos e integrados. Em Paris (França), o exilado Cortazar da velha esquerda que não existe mais, lavrou seuApocalípticos e integrados, aqui versado pela falta de Perspectiva. Ele próprio era do primeiro grupo, desintegrado que foi pela doença que o fez crescer indefinidamente, até que não lhe sobrou osso sobre osso.


O cinema de entretenimento da gringolândia nos legou Bonnie (Faye Dunaway) e Clyde (Warren Beatty) fashions, lindões, grandões como todos os americanos têm de ser pro integrado imaginário pós-romântico do Terceiro Mundo. Bonnie e Clyde de verdade, conforme o bom trabalho investigativo de Paul Schnider na biografia recém-lançada no Brasil pela Larousse, eram duas figurinhas magrinhas. Ela tinha menos de 1,50 m e ele em torno de 1,60 m.


A vida dos dois não teve nada de fashion. Comecemos por Clyde: depois do primeiro crime num presídio – matou um carcereiro fortão que o estuprou –, onde estava por roubos miúdos, decepou parte do próprio pé para sair da cana como inválido.


Mas daí por diante, o que fazer no Sul dos isteitis em plena recessão? De família pobre, como Bonnie, só restou a ele – como a todos os outros jovens miseráveis de sua geração – encarar a vida dos não-integrados.


Seu azar foi, durante um assalto, ter matado um auxiliar de xerife. Daí fodeu de vez. Matar um homem da lei na época, com os presídios superlotados e juízes afinados à direita das antigas, só reservava um destino: a cadeira elétrica. Aos criminosos negros – qualquer que fosse o crime –, nem isso: os carcereiros simplesmente abriam as celas pra KKK entrar e arrastar o negrão pra malhação pública.


Forçado à clandestinidade, Bonnie apenas acompanhou Clyde e se embandidou por amor, roubando bancos, lojas, postos de gasolina e quaisquer biroscas que encontrassem pela frente. Mas havia tantos bandos como o deles que em mais de uma ocasião entraram em bancos que não tinham um centavo, porque já haviam sido visitados antes deles.


Viveram uma vida de merda, fugindo pra baixo e pra cima, de estado pra estado. Estavam sempre famintos, imundos, sonolentos, doentes, feridos e com a adrenalina a mil, com medo de serem delatados e pegos de surpresa. Mesmo com toda atenção e tensão, foram crivados por balas em cerca de 10 emboscadas, às quais sobreviveram não se sabe como. Embora com montanhas de dinheiro nos carros roubados, passavam fome por não terem como ir às cidades comprar rango.


A coisa piorou quando a mídia decidiu investir na imagem dos dois, transformando-os em mito. Tudo quanto é tiroteio ou roubo era atribuído a eles. Não saíam dos noticiários. Daí virou questão de honra pra segurança pública da gringolândia: era preciso matá-los o quanto antes, pra servir de exemplo. E assim foi feito. Morreram traídos por tudo e por todos - especialmente por ex-companheiros de bando e familiares -, mediante o farto fornecimento de propinas aos delatores fornecidas pelo Estado.


Leiam a biografia. Evidente que não tem o glamour romanceado de outras biografias sobre os dois. Schneider entrevistou todos as figuras vivas que os conheceram – incluindo os remanescentes do bando –, familiares, delatores, policiais, repórteres e levantou todos os documentos possíveis sobre os dois.

A verdade é que Bonnie e Clyde foram bem mais interessantes que os personagens mitológicos. Pela estatura física, Pedrinho e Soninha dos idos anos 70, – do então Grupo Pedra, em Brasília –, ambos pequenos e magrinhos, seriam os atores ideais para interpretá-los.

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